10 Agosto 2012
O tão esperado encontro das 900 irmãs católicas norte-americanas que compõem a Leadership Conference of Women Religious (LCWR) iniciou na última terça-feira à noite em St. Louis, Missouri, com músicas, orações e referências grandes, pequenas e medianas à tentativa do Vaticano de se apoderar do grupo.
A reportagem é de Joshua J. McElwee, publicada no sítio do jornal National Catholic Reporter, 08-08-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
As referências à crítica do Vaticano ao grupo, que foi divulgada no dia 18 de abril em um anúncio da Congregação para a Doutrina da Fé, ocorreram logo de início, em um evento de duas horas, quando a presidente da LCWR, a irmã franciscana Pat Farrell, disse à assembleia que "nós não precisamos lembrar vocês que o nosso encontro esta semana é um momento histórico na vida desta organização".
A abertura da assembleia anual da LCWR, que representa cerca de 80% das religiosas dos EUA, também contou com as boas-vindas do arcebispo de St. Louis, Robert Carlson (foto), e detalhamentos sobre como os membros do grupo discernirão os passos a serem tomados durante o encontro, que continua até esta sexta-feira à noite.
Em sua crítica de abril, a congregação vaticana identificou uma "prevalência de certos temas feministas radicais incompatíveis com a fé católica" nos programas do grupo e uma "dissidência corporativa" na Conferência acerca dos ensinamentos sexuais da Igreja.
Em um comunicado do dia 1º de junho, o conselho nacional da LCWR criticou a medida do Vaticano, dizendo que se baseava em "acusações infundadas" e era "o resultado de um processo inválido em que faltou transparência".
De acordo com o mandato do Vaticano, a LCWR deve se colocar sob a autoridade do arcebispo de Seattle, Peter Sartain, que deve atuar como um "arcebispo delegado" para o grupo, devendo ser assistido nesse papel por Dom Leonard Blair, bispo de Toledo, Ohio, e por Dom Thomas Paprocki, bispo de Springfield, Illinois.
Durante um discurso na terça-feira à noite, Farrell delineou o processo pelo qual os membros do grupo irão discutir o mandato do Vaticano em seu encontro, dizendo que querem "reunir a sabedoria coletiva deste grupo para dar uma resposta que, esperamos, possa ser pelo bem da Igreja, pelo bem da LCWR, pelo bem da vida religiosa em todo o mundo e, enfim, pelo bem da família humana".
Começando na quarta-feira, a LCWR irá realizar diversas "sessões executivas" a portas fechadas, em que os membros irão discutir o mandato vaticano.
Essas reuniões, disse Farrell, irão envolver um processo "que será como uma espécie de 'túnica inconsútil' de discernimento".
"Cada sessão executiva individual terá um pouco de ritmo contemplativo e um pouco de discussão ao mesmo tempo", continuou Farrell. "Mas esperamos que tudo isso continue se desdobrando enquanto damos um passo e depois outro em um processo contínuo".
"O objetivo não é sair desta assembleia com um plano bem elaborado, nem mesmo talvez com uma decisão. Nossa única esperança é que, enquanto alcançamos a sabedoria coletiva que existe aqui, possamos ao menos discernir qual é o melhor próximo passo. Talvez, descubramos diversos melhores próximos passos, mas ao menos tentaremos encontrar e encontraremos juntas um próximo passo que possamos dar".
Farrell também mencionou que, após o encerramento da assembleia da LCWR no sábado, o conselho nacional do grupo também irá se reunir separadamente no domingo de manhã. Parte dessa sessão, disse, incluirá uma reunião com Dom Sartain "para a primeira conversa que ele realmente terá conosco de uma forma oficial", para que "possamos comunicar a ele algo do direcionamento que vem desse grupo".
"Eu suspeito que teremos muitas surpresas e muitos momentos ricos juntos", concluiu Farrell.
Trabalhar as diferenças
Antes do discurso de Farrell, o arcebispo de St. Louis, Robert Carlson, deu as boas-vindas ao grupo à cidade, mencionando que ele foi "muito afortunado em toda minha vida por trabalhar com toda uma grande variedade de comunidades religiosas" e que "conheci vocês como religiosas muito dedicadas, que ministram e servem todos os dias aqui na Arquidiocese de St. Louis, em todo o nosso país e além fronteiras".
Referindo-se ao mandato do Vaticano sobre a LCWR, Dom Carlson também disse esperar que o diálogo entre o grupo e o Vaticano "não seja politizado, mas que, durante este encontro, seja trabalhado na comunidade da fé".
Citando argumentos daqueles que tinham opiniões diferentes sobre as questões que estavam diante da Igreja durante o Concílio de Jerusalém, realizado por volta do ano 50, e nomeando especificamente os santos Pedro e Paulo, Dom Carlson continuou: "Eles conseguiram trabalhar essas coisas naquela época, e eu rezo para que vocês consigam trabalhar essas coisas agora".
Na terça-feira à noite, a LCWR também reconheceu individualmente alguns representantes de institutos nacionais e internacionais presentes no evento.
Dentre as pessoas reconhecidas, estavam diversos chefes de federações internacionais de ordens religiosas; um representante da CLAR, a Confederação Latino-Americana de Religiosos; o chefe do grupo que representa os religiosos norte-americanos, o presidente da Conferência dos Superiores Maiores, Ir. John Edmunds, dos Irmãos da Trindade; e um representante da Congregação para os Religiosos do Vaticano, o padre oblato Hank Lemoncelli.
Essa Congregação, conhecida oficialmente como a Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, é o grupo que ordenou uma investigação em separado do Vaticano sobre as congregações individuais das ordens femininas dos EUA, chamado de "visitação apostólica". Um relatório sobre essa investigação foi submetido a Roma em janeiro.
Falando ao NCR após a cerimônia de abertura, Lemoncelli disse que um representante dessa congregação vaticana "vem todos os anos" aos EUA.
Como parte da cerimônia de abertura, cada uma das cerca de 900 irmãs foram convidadas a escrever tanto os seus medos quanto as suas "esperanças" ao estarem na assembleia e, depois, discuti-los em seus grupos menores.
Ouvida entre as respostas estava uma irmã que disse estar com medo de ser "muito emocional" com relação à crítica do Vaticano para discuti-la atentamente. Outra religiosa expressou o temor de que, independentemente do que as irmãs disserem, "não seremos ouvidas".
Durante a cerimônia de abertura, as irmãs também reconheceram duas delas que haviam falecido no ano passado. Uma delas era a Ir. Jean Burke, das Irmãs de Notre Dame, que atuou como diretora-executiva da LCWR de 2008 a 2011.
Uma apresentadora, descrevendo o trabalho de Burke junto à LCWR, disse que ela se focou particularmente no desenvolvimento de diversas iniciativas destinadas a ajudar as suas congregações membros a discernir o futuro da vida religiosa.
A apresentadora leu uma reflexão de Burke no relatório anual da LCWR de 2011, em que a irmã perguntava: "Eu encontro dentro de mim algumas preocupações sobre a nossa abertura em dar a nós mesmas o tempo necessário para perceber o que Deus está fazendo entre nós, sobre como saberemos ao certo que descobrimos o novo, e sobre como saberemos quando é o momento certo para agir".
"Eu me pergunto se teremos a disciplina necessária para tomar o tempo necessário, o tempo de Deus, para nos libertarmos para prosseguir e deixar que o novo se levante dentro de nós".
Missões e visões
No fim do encontro de abertura da última terça-feira, as irmãs apresentaram algumas declarações de missão e de visão das diversas congregações representadas na LCWR.
Entre as congregações destacadas, seguidas por trechos de suas declarações, estavam:
Encerrando a noite com uma invocação ao Espírito Santo, as irmãs rezaram: "Abandonamo-nos às tuas mãos, ó Deus. Mantém os nossos corações suaves e as nossas mentes abertas, enquanto esperamos que a verdade deste momento se revele".
Na quarta-feira de manhã, o encontro da LCWR teve uma palestra de Barbara Marx Hubbard, uma renomada autora conhecida pela sua proposta de uma visão de mundo chamada "evolução consciente".
Também se encontram na agenda da assembleia da LCWR o editor do NCR, Tom Fox, e a colunista do NCR, Jamie Manson, que compartilharam um painel de discussão na quinta-feira com a Ir. Jennifer Gordon, membro das Irmãs da Caridade de Leavenworth, Kansas, para discutir "Vida Religiosa no Futuro: Como será?".
Durante a assembleia, a LCWR também irá realizar a sua transição anual das principais lideranças do grupo – a sua presidente eleita, a presidente e a ex-presidente – que governam a LCWR colaborativamente com a secretária do grupo, a tesoureira e a diretora-executiva.
Durante uma cerimônia formal marcada para a tarde de sexta-feira, a atual chefe do grupo, a irmã franciscana Pat Farrell, irá passar para a posição de ex-presidente, enquanto a irmã franciscana Florence Deacon, atualmente presidente eleita da LCWR, irá se tornar sua presidente.
Deacon, que também é o líder da congregação das Irmãs de São Francisco de Assis, com sede em St. Francis, Wisconsin, atuou anteriormente nas Nações Unidas como diretora do escritório de Nova York da Franciscans International, organização não-governamental que luta em prol de questões de justiça.
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Religiosas dos EUA usam sabedoria coletiva para discernir próximos passos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU