17 Mai 2012
A ansiedade, é claro, é bastante comum antes de qualquer casamento. Portanto, provavelmente, não é nenhuma surpresa que, enquanto Roma e a fraternidade tradicionalista São Pio X, popularmente conhecida como "os lefebvrianos", se preparam para atravessar o corredor, vozes importantes de ambos os lados estão tendo algumas dúvidas.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no sítio do jornal National Catholic Reporter, 14-05-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Correspondências vazadas mostram que três dos quatro bispos da Fraternidade se opõem fortemente a um acordo, enquanto a cúpula tradicionalista francesa denunciou a "praga" do Concílio Vaticano II. O superiores da Fraternidade admitiu abertamente que uma divisão pode estar em andamento.
Enquanto isso, em Roma, até mesmo alguns dos melhores amigos do papa estão expressando preocupações para que um acordo não sinalize um recuo com relação ao Vaticano II.
Fontes dizem que uma oferta para uma nova união poderia ser feita até o final de maio, na linha de uma "prelazia pessoal", um status de diocese não territorial possuído atualmente pelo Opus Dei. Em meados de abril, o superior da Fraternidade São Pio X, o bispo suíço Bernard Fellay, aprovou um "preâmbulo doutrinal" estabelecido pela Congregação para a Doutrina da Fé.
Embora há muito tempo oposta aos ensinamentos do Vaticano II sobre a liturgia, a liberdade religiosa, o ecumenismo e o diálogo inter-religioso, a Fraternidade não se separou de Roma até 1988, quando o falecido arcebispo francês Marcel Lefebvre ordenou quatro bispos desafiando o Papa João Paulo II.
Embora um acordo para curar essa ruptura pareça iminente, há temores no interior da Fraternidade.
Um site tradicionalista recentemente postou uma correspondência entre Fellay e outros três bispos ordenados em 1988: o francês Tissier de Mallerays, o espanhol Alfonso de Gallareta e o prelado inglês Richard Williamson. (Foram os comentários de Williamson questionando o Holocausto que causaram frisson em janeiro de 2009, quando Bento XVI revogou suas excomunhões.)
No dia 7 de abril, Mallerays, De Gallareta e Williamson escreveram a Fellay insistindo que o "acordo é impossível com Roma", porque, depois do Vaticano II, "as autoridades oficiais da Igreja separaram-se da verdade católica".
Os três prelados alertaram para os perigos de "nos colocarmos nas mãos de bispos conciliares e da Roma modernista", e disseram que Fellay está levando a Fraternidade para "um ponto sem retorno" e para uma "profunda divisão".
No dia 17 de abril, Fellay escreveu de volta, dizendo aos seus colegas prelados que eles têm uma "concepção excessivamente humana e fatalista da Igreja", vendo "perigos, complôs e dificuldades, mas não a graça do Espírito Santo". Fellay argumentou que os tradicionalistas deveriam abraçar a abertura de Bento XVI, já que o papa "sabe muito bem que teria sido mais fácil para ele e para nós deixar as coisas como estavam".
Essa linha aparentemente não convenceu a todos, como ficou evidente por um artigo publicado no Porte Latine, o site do distrito francês da Fraternidade São Pio X, no início de maio. (A França abriga a maior concentração mundial de lefebvrianos, com cerca de 120 dos 500 padres da Fraternidade.)
O padre Régis de Cacqueray, superior do distrito francês, escreveu que Bento XVI ainda não vê "as consequências calamitosas da nova religião que se desenrolou ao longo do último meio século na Igreja", afirmando que ele tem "graves e profundas ilusões" acerca do Vaticano II.
Cacqueray exortou a Fraternidade a "recear como uma praga às novidades introduzidas pelo Vaticano II e aos papas que vieram depois do Concílio".
Tal sentimento pode ser o que Fellay tinha em mente quando disse à agência de notícias Catholic News Service no início de maio que "pode haver uma divisão" se um acordo com Roma ocorrer.
Em Roma, enquanto isso, vozes influentes em torno do papa estão silenciosamente afirmando que um acordo não deve ocorrer às custas do abandono do Vaticano II.
O padre do Opus Dei Johannes Grohe, proeminente historiador da Igreja, defendeu a autoridade do Vaticano II durante uma conferência nos dias 3 e 4 de maio sobre o 50º aniversário do Concílio na University of the Holy Cross, do Opus Dei, afirmando que o seu ensino é "vinculante" e "deve ser aceito por aqueles que querem entrar em comunhão com a Igreja Católica".
Grohe pediu uma "profissão de fé", incluindo dos ensinamentos do Vaticano II, para qualquer pessoa que queira se unir à Igreja.
Um alerta ainda mais claro veio do padre franciscano David Maria Jaeger, ao falar sobre o documento Nostra Aetate do Concílio, referente às religiões não cristãs. Jaeger atua como juiz da Rota Romana, a "suprema corte" vaticana.
Jaeger criticou "uma tendência que olha com indulgência para grupos marginais com um perfil midiático exagerado, que verdadeiramente denunciam a doutrina do Concílio". Ele expressou "a vívida esperança de que não iremos nos conformar com uma quase adesão que é apenas uma farsa, acompanhada por óbvias reservas verbais e mentais".
Fellay alertou que o acordo ainda não ocorreu, e que o diabo está nos detalhes. "Não vamos cometer um suicídio aqui", disse.
No entanto, mesmo que um acordo seja firmado, esse quase certamente não será o fim da história. Resta saber quantos lefebvrianos realmente irão atravessar a porta – e que tipo de recepção estará lhes aguardando quando chegarem.
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Ansiedade em jogo entre Roma e lefebvrianos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU