12 Mai 2012
A defesa do casamento gay pelo presidente Barack Obama na quarta-feira (9) foi, acima de tudo, um divisor de águas.
Um presidente norte-americano em exercício tomou partido numa questão que muitas pessoas consideram o último movimento de direitos civis, fornecendo a evidência mais poderosa até hoje de como as visões estão mudando rapidamente numa questão que era politicamente destruidora há apenas cinco anos.
A reportagem é de Adam Nagourney, publicada no The New York Times e reproduzida pelo Portal Uol, 11-05-2012.
Obama enfrenta um risco considerável ao entrar nesse debate, relutantemente ou não, no calor de eleições tão próximas. Um dia antes de anunciar sua posição, eleitores da Carolina do Norte --um Estado fundamental para o plano de reeleição de Obama e anfitrião da convenção democrata neste verão-- aprovou por uma margem de 20 pontos uma emenda constitucional proibindo o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Foi o 31º Estado a aprovar uma emenda como esta.
Como George W. Bush demonstrou em 2004, quando sua campanha planejou iniciativas contra o casamento gay numa série de Estados que oscilam entre o voto democrata e o republicano, os oponentes têm muito mais chance de votar nesses assuntos do que os apoiadores.
Mitt Romney, o provável candidato presidencial republicano, não demorou para proclamar sua oposição ao casamento gay depois que Obama se pronunciou. E não importa o quanto as atitudes nacionais estejam mudando, a questão continua muito controversa entre os eleitores negros e latinos, dois grupos essenciais para o sucesso de Obama.
Mas, como Obama reconheceu claramente, as forças da história parecem estar mudando. O presidente corria o risco de parecer politicamente tímido e calculista, ficando de lado enquanto um grande número de norte-americanos --incluindo membros de ambos os partidos-- abraçam o casamento gay. Esta seria uma imagem particularmente discordante para um homem que foi eleito o primeiro presidente negro do país, dizem muitos democratas.
A declaração de Obama pode ter vindo atrasada e sem planejamento, forçada depois que seu vice-presidente, Joe Biden, declarou seu apoio ao casamento entre pessoas do mesmo sexo em uma entrevista à televisão no último domingo. Ainda assim, é uma voz significativa adicionada ao coro que se tornou cada vez mais robusto, num lembrete de que uma visão que antes era relegada aos cantos obscuros do debate político agora se tornou central.
O próprio risco da atitude de Obama --alguns comentaristas invocaram a atitude de Lyndon B. Johnson ao abraçar os direitos civis em 1964, com todos os perigos políticos resultantes-- tornou difícil minimizar a importância histórica do que aconteceu na Casa Branca na quarta-feira.
“Se você é uma das pessoas que se importa com esse assunto, não esquecerá onde estava quando viu o presidente fazer aquelas declarações”, disse Chad Griffin, próximo presidente da Campanha pelos Direitos Humanos, um grupo de defesa dos direitos homossexuais. “Independentemente da sua idade, é a primeira vez que você vê um presidente dos Estados Unidos olhar para a câmera e dizer que um gay deve ser tratado com igualdade de acordo com a lei. A mensagem que isso envia, para um jovem gay ou transgênero lutando para se assumir, é transformadora.”
Foi também um lembrete de como as atitudes políticas e públicas estão mudando. Os primeiros organizadores do moderno movimento pelos direitos gays, depois da batida policial no Stonewall Inn em Nova York em 1969, consideravam a si mesmos ousados por ter esperança de aprovar atos contra a discriminação. Eles não cogitavam seriamente o dia em que pessoas do mesmo sexo tivessem permissão para se casar.
Faz apenas 16 anos que Bill Clinton --o segundo candidato presidencial democrata a fazer campanha diante de um público gay num evento aberto à imprensa-- assinou o Ato de Defesa do Casamento, que definiu o casamento como a união de um homem e uma mulher, permitindo que os Estados se recusassem a reconhecer casamentos entre pessoas do mesmo sexo realizados em outros Estados.
Clinton defendeu a lei em meio a uma campanha pela reeleição depois que seus auxiliares concluíram que se opor a ela seria arriscado. Clinton desde então diz que se arrepende da decisão; Obama instruiu seu Departamento de Justiça a não defender a lei.
Sob vários aspectos, Obama chegou tarde na festa. Biden foi apenas um dos últimos democratas importantes a anunciar seu apoio, e muitos agora dizem que parece impensável que em 2016 qualquer candidato democrata sério à presidência seja contrário ao casamento gay. Uma série de figuras importantes do partido Republicano --Ken Mehlman, ex-presidente do Partido Republicano; Theodore Olson, que foi advogado geral de Bush-- também foram ativos ao pressionar pelo casamento gay.
O voto da Carolina do Norte de certa forma distrai a atenção do que as pesquisas mostram como um aumento estável na porcentagem de norte-americanos que dizem apoiar o casamento gay ou uniões civis; este número agora é maioria. As estatísticas são particularmente altas entre os norte-americanos mais jovens, sugerindo que esta é uma tendência que provavelmente crescerá em vez de diminuir.
Tudo isso sugere que há, além dos riscos, possíveis vantagens claras para Obama. Seu anúncio, embora simbólico, sem carregar a força da lei, pode energizar grandes partes de sua base eleitoral, particularmente os eleitores mais jovens, e reconquistar os democratas liberais que estavam desapontados com Obama por causa desse tema.
E o anúncio de Obama vem num momento em que Romney está tentando se colocar no centro; eleitores independentes e mulheres são dois eleitorados que tendem a apoiar o casamento gay. Agora, entretanto, ele quase certamente enfrentará pressão de sua base para levar a luta sobre o casamento gay para Obama.
“O presidente Obama agora transformou a definição de casamento num tema decisivo da corrida presidencial, especialmente em Estados oscilantes como Ohio, Carolina do Norte, Virgínia, Flórida e Nevada”, disse Brian S. Brown, presidente da Organização Nacional pelo Casamento.
Na verdade, republicanos e democratas não têm nenhuma certeza de que este será um tema decisivo em algum Estado, dada a urgência das preocupações econômicas, sobretudo nos Estados oscilantes. As pesquisas mostram que o casamento gay não é uma grande preocupação para os eleitores oscilantes. Será que Romney vai mesmo querer passar os próximos cinco meses falando sobre casamento gay, em vez de economia e empregos? E Obama pode também não estar tão ansioso para discutir mais o assunto e se enredar nas tramas dessa discussão.
Mas talvez, em relação a esse dia, não é dos cálculos políticos de curto prazo que as pessoas provavelmente irão se lembrar ao falar sobre a entrevista de Obama nos anos vindouros. “Acho que não trata de Estados ou grupos demográficos específicos”, disse Steve Elmendorf, um estrategista demográfico. “Ele disse a coisa certa”, disse ele. “Ele fez a coisa certa. As pessoas vão analisar a política disso à exaustão.”
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Ao defender o casamento gay, Obama toma atitude arriscada, porém inevitável - Instituto Humanitas Unisinos - IHU