03 Mai 2012
O Congresso aprovou ontem a criação de um banco de dados genéticos, formado com o DNA de condenados por crimes violentos e de suspeitos. A lei aprovada, que segue agora para a sanção presidencial, permitirá melhorar a investigação criminal no País e facilitar a identificação de bandidos reincidentes. Na prática, estabelece um modelo de análise que já ficou famoso em séries policiais americanas, como CSI.
A reportagem é de Denise Madueño e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 03-05-2012.
"O índice de reincidência no Brasil é alto, de 70%. Muito criminoso sai da prisão e comete crime novamente", observa o deputado João Campos (PSDB-GO), relator do projeto na Câmara dos Deputados. O DNA é um material genético individual: cada pessoa tem uma combinação única, que funciona como um RG. Ou seja, cada caso de homicídio, estupro ou latrocínio em que se conseguir chegar a um culpado renderá um perfil genético - que poderá ser comparado com futuros casos.
"Evidências biológicas, como manchas de sangue, cabelos, etc, são encontradas em cenas de crimes, principalmente aqueles cometidos com violência. Atualmente, os resultados da identificação genética já são rotineiramente aceitos em processos judiciais em todo o mundo. O DNA pode ser extraído dessas evidências e estudado por técnicas moleculares no laboratório, permitindo a identificação do indivíduo de quem tais evidências se originaram", argumentou o autor do projeto, senador Ciro Nogueira (PP-PI).
O projeto altera a Lei de Execuções Penais para obrigar os condenados por crimes violentos à identificação do perfil genético. Quanto aos suspeitos investigados, isso dependerá de decisão judicial. "O DNA não poderá, por si só, provar a culpabilidade criminal de uma pessoa ou inocentá-la, mas poderá estabelecer uma conexão irrefutável entre a pessoa e a cena do crime", argumenta Nogueira.
O novo banco de dados terá caráter sigiloso e será gerenciado por uma unidade oficial de perícia criminal. Na hipótese de o crime em análise acabar prescrito, sem que a autoridade policial conclua o inquérito ou que o acusado seja condenado, o perfil genético do acusado será excluído do sistema.
Esse material coletado alimentará a chamada Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos, atualmente em análise, que deverá tomar por base o sistema de informação Codis (Combined DNA Index System), desenvolvido pela Polícia Federal dos Estados Unidos (FBI).
No Brasil, a rede deverá ser abastecida por perícias dos Estados e da Polícia Federal, com dados retirados de vestígios genéticos deixados nos locais de crimes. Há três anos, o Ministério da Justiça anunciou um acordo de cooperação técnica gratuita com o governo americano que previa testes do programa em Amapá, Amazonas, Ceará, Mato Grosso, Paraíba e Paraná.
Após a sanção, lei entra em vigor em 180 dias
O banco de dados de DNA deve ser sancionado sem vetos pela presidente Dilma Rousseff. Dessa forma, entrará em vigor em 180 dias. No entanto, apesar da negociação no Congresso, o projeto é alvo de crítica de juristas.
Hoje, a identificação criminal é feita somente por meio das impressões digitais e por fotografia. O projeto inclui, agora, a possibilidade de coleta de material biológico. No caso em que a pessoa está na condição de investigado, a coleta ocorrerá quando for essencial à investigação e com autorização judicial. "Será ampliada a possibilidade de identificação criminal. O material genético colhido na cena de um crime, por exemplo, poderá ser confrontado com o banco de dados, permitindo identificar o criminoso", afirmou o deputado João Campos (PSDB-GO), um dos relatores do projeto na Câmara.
A medida, porém, é vista com reservas. Para muitos, a coleta de material genético constitui um ataque ao preceito constitucional de que "ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo". Presidente da Comissão de Direito Penal da Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo (OAB-SP), Fernando José da Costa observa que hoje uma impressão digital usada como prova pode até ser anulada em um julgamento. "O uso dela tem de ser autorizado pelo acusado."
Outra discussão envolveria uma suposta invasão de privacidade. No Brasil, estabeleceu-se o princípio de que cavidades (boca, ânus, vagina, áreas de cirurgias) não podem ser invadidas para a coleta de evidências, ficando como regra geral a da concordância do investigado, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF). Por causa disso, a lei aprovada ontem prevê que a coleta será feita por meio de "técnica adequada e indolor". Segundo Campos, essa forma exclui coleta de sangue, por exemplo. A extração de DNA poderá ser feita de cabelo ou saliva.
Prática
Quanto ao uso de provas sem autorização, já há casos práticos. Um deles é o de Aparecida Fernanda Ribeiro da Silva - que foi sequestrada ainda bebê por Vilma Martins Costa e registrada como filha dela, com o nome Roberta Jamilly. Em 2003, ela se recusou a fornecer material para o exame de DNA que comprovaria a suspeita de que Vilma não era sua mãe. Uma amostra da saliva tirada de um cigarro foi usada como prova, sob o argumento de que a evidência foi colhida em local público.
O mesmo ocorreu no caso da cantora mexicana Glória Trevi que, em 2001, quando ela estava presa na Polícia Federal em Brasília, declarou ter engravidado após ser estuprada dentro da cela. Ela se recusou a fazer exames, mas o STF ordenou a coleta de amostras da placenta exteriorizada no parto e a comparação com o DNA dos agentes federais, o que provou a inocência dos policiais.
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Congresso aprova criação de banco de dados de DNA para crimes violentos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU