06 Março 2012
A falta de um acordo para a votação da reforma das regras de preservação do meio ambiente nas propriedades privadas deverá impor o adiamento da última etapa de votação da reforma do Código Florestal, nesta terça-feira, na Câmara dos Deputados. A votação em regime de urgência de um relatório desconhecido até a noite desta segunda será discutida em reunião de líderes marcada para a tarde. Ambientalistas convocaram manifestação na Esplanada.
A reportagem é de Marta Salomon e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 06-03-2012.
Nesta segunda-feira, o deputado Paulo Piau (PMDB-MG) resolveu adiar a apresentação de seu relatório. Conforme antecipou o Estado na semana passada, o relator do Código Florestal trabalhava para mudar a proposta apresentada pelo Senado, sobretudo para reduzir a recuperação de vegetação nativa em Áreas de Preservação Permanentes (APPs), como os manguezais. Piau é produtor rural e integrante da Frente Parlamentar da Agropecuária.
No Palácio do Planalto, a orientação era para adiar a votação em pelo menos uma semana, tempo em que o governo tentaria buscar a maioria de votos para manter o acordo selado no Senado em dezembro do ano passado, considerado pela presidente Dilma Rousseff como uma espécie de meio-termo entre o que defendem ruralistas e o que desejam ambientalistas.
Sem maioria, o governo teme ver a reprise da maior derrota política sofrida pela presidente em seu primeiro ano de mandato, em maio de 2011. Na ocasião, a Câmara liberou os produtores rurais de recuperarem áreas de vegetação nativa desmatadas ilegalmente.
Não está em questão a anistia da cobrança de multas concedida pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009, por meio de decreto, a desmatadores que regularizassem suas propriedades. Essa anistia foi renovada por decretos de Dilma Rousseff e incorporada pelo Código Florestal.
Críticas
A proposta aprovada pelo Senado, que o relator quer modificar novamente na Câmara dos Deputados, foi duramente criticada pelo professor da Universidade de São Paulo (USP) José Eli da Veiga.
Em entrevista ao Estado no domingo, o professor acusou a redução das APPs no País e atacou a projeção do Ministério do Meio Ambiente de que o projeto permitiria a recuperação de 18 milhões de hectares de APPs ou 180 mil quilômetros quadrados de vegetação nativa.
Autor da contabilidade, João de Deus Medeiros, ex-diretor do departamento de florestas do Ministério do Meio Ambiente e assessor da ministra Izabella Teixeira na negociação com o Congresso, reiterou ontem que o projeto aprovado no Senado prevê a recuperação de 300 mil quilômetros quadrados de vegetação nativa, contando a recuperação de áreas de Reserva Legal em médias e grandes propriedades.
O projeto aprovado pelo Senado exige a recuperação de pelo menos 15 metros a cada margem dos rios mais estreitos, até 10 metros de largura. Já as propriedades com rios mais largos terão de recuperar entre 30 e 100 metros de vegetação nativa a cada margem.
"Ninguém está dizendo que a recuperação será fácil, há um risco real na implementação do Código, mas nosso esforço é evitar um retrocesso", disse Medeiros, que atualmente dá aulas na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele foi citado na entrevista de José Eli da Veiga como um "suposto bom técnico".
Izabella, chamada por Veiga de "ministra fraca", não se manifestou sobre a entrevista, mas reiterou o apoio ao projeto do Senado, porque a proposta teria alcançado uma posição equilibrada entre os pontos de vista de ambientalistas e ruralistas.
'Falta cultura florestal ao produtor', diz especialista
A celeuma em torno do Código Florestal está longe de acabar. Com a iminência da votação do projeto na Câmara dos Deputados, questões como a anistia aos desmatadores, a diminuição das Áreas de Preservação Permanente (APPs) e a manutenção das Reservas Legais voltaram à tona.
A reportagemé de Karina Ninni e Marta Salomon e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 06-03-2012.
"Não consideramos o perdão das multas como anistia, pois quem desmatou o que não devia terá de recuperar as áreas que degradou", afirma Cesario Ramalho da Silva, presidente da Sociedade Rural Brasileira. Ele crê que o desmatador será monitorado por meio do Cadastro Ambiental Rural (CAR).
"Quem infringiu a lei vai se comprometer a recompor a floresta. O produtor não é um bandido", defende Silva.
Mercado
A necessidade de recomposição dos 18 milhões de hectares desmatados ilegalmente deve aquecer o mercado de mudas e sementes, diz o agrônomo Eduardo Ciriello, diretor da Tropical Flora Reflorestadora. "Nos últimos cinco anos, com a atuação mais firme dos órgãos fiscalizadores, a quantidade de viveiros de mudas já dobrou no País. Se todo mundo que tiver de recompor áreas realmente o fizer, vai faltar muda e semente."
Para ele, um entrave a uma negociação racional em torno do Código é a falta de cultura florestal do produtor rural brasileiro.
"Ele não está acostumado a ver, na reserva legal, um espaço que também pode ser produtivo. Ele pode consorciar espécies nativas que não produzem com nativas produtivas de madeira de lei, por exemplo", afirma. "A RL virou uma coisa mítica, um espaço em que ninguém mexe. Isso deveria ser mais discutido."
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Câmara chega ao dia da votação do Código Florestal sem texto de relator - Instituto Humanitas Unisinos - IHU