16 Fevereiro 2012
A taxa sobre as transações financeiras pode representar uma etapa importante para o reequilíbrio das relações entre instituições e finanças. Se um professor escolar precisa trabalhar 4.500 anos para ganhar o que um diretor-executivo do Lehman Brothers ganhava em um ano, existe uma questão de justiça.
A análise é do economista italiano Leonardo Becchetti, professor da Universidade de Roma "Tor Vergata", presidente do Comitê de Ética do Banco Popular Ético, da CVX-Itália e da Liga Missionária dos Estudantes, em artigo para a revista dos jesuítas italianos, Popoli, 27-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Cresce o favor com relação a uma taxa sobre as transações financeiras (TTF, impropriamente chamada também de Tobin Tax), seja na opinião pública, seja entre os economistas. Além disso, no mundo dos mercados financeiros internacionais, vivemos como no Faroeste antes da chegada da lei: há uma necessidade fundamental de pôr regras às finanças, porque foi desperdiçada uma quantidade imensa de dinheiro pela necessidade de salvar os bancos, dinheiro que bastariam, teoricamente, para resolver os problemas da educação obrigatória ou da desnutrição no mundo.
Estudos científicos demonstram que, nos últimos 20 anos, a relação positiva e consolidada entre o crescimento do mercado financeiro e o da economia se interrompeu, e foi registrada uma relação negativa entre o crescimento dos derivados OTC [over the counter] – produtos financeiros cotados nos mercados não regulamentados – e o financiamento dos bancos às empresas.
Por isso, é preciso restabelecer um primado da política e da economia real sobre as finanças. Na tempestade da crise financeira, o consenso na opinião pública europeia pela TTF se ampliou. A OCDE, organização econômica que reúne os países ocidentais, em um estudo divulgado em janeiro, fala sobre os problemas criados sobre os mercados financeiros pelas especulações sobre os derivados e, justamente sobre derivados, ela propõe a aplicação de uma taxa.
No nível dos governos, França e Alemanha se manifestaram favoráveis, com a vontade da França de proceder, se necessário, até mesmo de forma unilateral.
Até agora, a principal objeção à TTF foi de que sua introdução levaria a uma fuga de capitais. Funcionaria, portanto, apenas no caso (muito improvável) de que fosse aplicada em nível global. Na realidade, isso é falso: esse tipo de taxa já existe em cerca de 20 países que a aplicam de modo unilateral. Hong Kong, África do Sul e Brasil puseram regulamentações, e nem na China e na Índia a circulação dos capitais de curto prazo é completamente livre. Só o Ocidente continua sendo uma "pradaria" onde os ataques da especulação financeira não encontram obstáculos.
O país com a taxa mais alta desse tipo é o Reino Unido, que aplica a Duty Stamp Tax (0,05% sobre as ações da Bolsa de Londres). Ela permite recolher 5 bilhões de libras esterlinas por ano. Se aplicada em nível de União Europeia, segundo a Comissão, daria cerca de 50 bilhões de euros por ano em receitas que poderiam melhorar os serviços públicos, o estado do meio ambiente ou da coesão social.
Mas existe um segundo resultado que a TTF pode dar: frear fortemente as operações de trading de alta frequência realizadas por alguns intermediários que efetuam milhares de operações em curto prazo, influenciando os mercados, com as consequências que conhecemos.
Quase 10 bilhões de dólares em três anos foram empregados para salvar os bancos: fundos que agravaram as dívidas de muitos países. Se a crise atual nasce de erros cometidos pelos grandes bancos dos EUA, esses erros foram pagos, depois, pelos Estados e, portanto, pelos contribuintes. Uma parte do mundo financeiro privatizou os lucros, socializou as perdas e, posteriormente, utilizou os fundos públicos empregados para o seu próprio resgate para apostar contra os próprios salvadores.
Como denuncia a OCDE, os problemas ainda estão de pé, e há o risco de que estourem outras bolhas. Portanto, o que está em jogo também é fazer com que essas crises não se repitam. A TTF pode representar uma etapa importante para o reequilíbrio das relações entre instituições e finanças. Se um professor escolar precisa trabalhar 4.500 anos para ganhar o que um diretor-executivo do Lehman Brothers ganhava em um ano, existe uma questão de justiça.
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Taxar as finanças: uma questão de justiça - Instituto Humanitas Unisinos - IHU