12 Fevereiro 2012
""Privatização" ou "concessão", seja qual for o eufemismo ou a propaganda ideológica do momento, trata-se quase sempre de simbiose entre governos e empresas, relação da qual o capital costuma sair mais gordo. O público, não raro, sai parasitado", constata Vinicius Torres Freire, jornalista, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo,12-02-2012.
Eis o artigo.
"A privatização não é uma questão ideológica." É o que dizia mais uma vez Fernando Henrique Cardoso, posto num dos lados do debate ideológico suscitado pela mais recente privatização conduzida por governo petista, a dos aeroportos.
A conversinha que se ouviu desde que se leiloaram os aeroportos é ideológica no sentido mais barato da expressão. E no mais caro também. A querela vulgar obscurece um assunto mais importante, o da reorganização da propriedade da grande empresa no Brasil, que se tornou ainda maior com apoio do Estado.
Privatizações, sociedades com entes estatais ou paraestatais, subsídios, proteções tarifárias, apoio estatal às alianças privadas em vários meganegócios: os meios utilizados pelos governos são vários, tanto faz se petistas ou tucanos. Os fins são bem semelhantes.
Tudo isso serviu para reorganizar a posse da grande empresa, torná-la mais resistente à competição externa ou até mais produtiva ou ino vadora. Mas os primeiros beneficiados são os donos do grande capital.
Considere-se a lista das maiores empresas brasileiras (por faturamento, na publicação "Valor 1000").
A Petrobras é a número 1. A Vale, privatizada sob FHC com sócios estatais, é a número 2. A JBS-Friboi (número 3) é uma "múlti brasileira" criada nos anos Lula com apoio do BNDES. O Pão de Açúcar (5) quase teve a tal ajuda oficial no ano passado, para comprar o Carrefour (11).
A Telemar/Oi (7) é um grupo imenso criado na privatização das teles sob FHC (com ajuda estatal). O conglomerado ficou ainda maior com a ajuda de Lula, que mudou leis a fim de permitir a compra da Brasil Telecom e autorizou mais entrada de dinheiro estatal na megatele.
A Braskem (9) é uma associação da Odebrecht com a Petrobras. A empreiteira começou a engordar no negócio da petroquímica com as privatizações dos anos 1990.
A Eletrobras (8) é a estatal elétrica returbinada pelos governos do PT e sócia das grandes empreiteiras na geração de eletricidade.
A Brasil Foods (12) resultou da quase quebra da Sadia (que brincava com derivativos loucos), engolida pela Perdigão (dos fundos de pensão de estatais) e financiada pelo BNDES, mais uma "campeã brasileira" do setor de alimentos.
Daí vem uma penca de múltis estrangeiras, estatais e ex-estatais privatizadas sob FHC e Itamar Franco (1993-94), como teles e siderúrgicas, sempre com dedo estatal.
A Embraer (39), quase falida em 1994, foi privatizada para um banco e, bidu, fundos de pensão de estatais. A empresa é ótima, mas não voaria alto sem bilhões de crédito subsidiado para suas exportações.
O conjunto dessas histórias de "parcerias público-privado" dá para encher livros. Há conexões mais complexas: por exemplo, como o Estado auxilia grupos a se associarem em vários ramos de negócios ou a ganharem pedações do mercado.
Um ótimo livro, de Sérgio Lazzarini ("Capitalismo de Laços", Campus Elsevier, 2010), desembaraça parte dessa história difícil.
O resumo da ópera aqui destas colunas é mais simples. "Privatização" ou "concessão", seja qual for o eufemismo ou a propaganda ideológica do momento, trata-se quase sempre de simbiose entre governos e empresas, relação da qual o capital costuma sair mais gordo. O público, não raro, sai parasitado.
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