08 Janeiro 2012
Às vésperas de a usina de Santo Antônio começar a girar sua primeira turbina em Porto Velho (RO), ribeirinhos retirados das margens do rio Madeira ainda dependem da ajuda financeira da concessionária para sobreviver.
A reportagem é de Gustavo Hennermann e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 08-01-2012.
Cerca de 270 famílias foram removidas para dar lugar ao reservatório de água da hidrelétrica. Elas se mantinham com a pesca artesanal e a agricultura e, agora, enfrentam dificuldades para produzir nos assentamentos.
No assentamento rural Vila Teotônio - um dos seis construídos pela Santo Antônio Energia -, os pescadores reclamam que ficaram sem fonte de renda depois de peixes e turistas "sumirem".
Desde o fim de 2010, esse assentamento começou a receber 40 famílias que moravam numa vila próxima a uma cachoeira que hoje está coberta pela água.
O grupo foi instalado na beira do reservatório, que começou a encher em setembro e seguirá elevando o nível da água até o fim de janeiro.
"Eu saía de barco e, na volta, enchia os congeladores de peixe. Hoje, gasto 80 litros de combustível dando volta nesse lago e não trago 20 kg", diz Pedro Fonseca da Cruz, 59.
"Já minha mulher servia comida para turistas que vinham pescar na cachoeira. Agora não vendemos três marmitex por dia", afirma.
Segundo o vice-presidente da associação de moradores, Mario Marcelo Gonçalves da Silva, 32, os pescadores conseguiam até 500 kg de peixe por dia no período mais produtivo e cada família do vilarejo hoje inundado tinha renda mensal entre R$ 2.000 e R$ 5.000 durante o ano.
"Hoje, a renda aqui no assentamento é zero. Somos bancados por eles [concessionária] e, por isso, pedimos para estenderem por oito meses o pagamento de um auxílio mensal de R$ 1.000", afirma.
O auxílio pago tem o objetivo de garantir a renda enquanto a produtividade é ajustada. A previsão era de pagá-lo por até dez meses.
No entanto, o período terá de ser estendido em todos os assentamentos rurais, segundo o gerente de sustentabilidade da concessionária, Ricardo Márcio Martins Alves.
De acordo com ele, há "dificuldades na reorganização da atividade produtiva" porque os pescadores terão de se adaptar a novas técnicas de pesca e porque os agricultores terão de se familiarizar com um solo diferente.
Por determinação do Ibama, a concessionária tem de dar assistência técnica e monitorar os assentamentos durante três anos.
No caso do assentamento mais antigo - Novo Engenho Velho, inaugurado em outubro de 2008 -, o apoio aos assentados continua, apesar de o tempo mínimo já ter se encerrado. O início da operação comercial da usina deve ocorrer no final deste mês.
Técnica de pesca terá que mudar, afirma empresa
Os pescadores que foram deslocados das margens do rio Madeira e assentados perto do reservatório da usina de Santo Antônio terão de aprender novas técnicas de pesca para continuar na atividade, segundo a concessionária da hidrelétrica.
O ambiente de trabalho mudou para os moradores do assentamento da Vila Teotônio, que dizem que o "peixe sumiu" depois de terem se mudado.
Acostumados a pescar na cachoeira, onde os peixes se agrupam, eles agora terão de trabalhar em um lago, onde a profundidade é maior e a velocidade da água, menor.
"O material utilizado e as técnicas deles são adequadas para pescar em água corrente. Agora, será exigido mais esforço. Sob esse ponto de vista, é fato que a quantidade de peixe [pescado] diminuiu", afirma o gerente de sustentabilidade da Santo Antônio Energia, Ricardo Márcio Martins Alves.
Mas, diz ele, um monitoramento da atividade pesqueira mantido pela concessionária há dois anos aponta que os volumes de pesca por espécie não se alteraram ao longo de 2010 e 2011.
"São dados coletados no desembarque de pescadores que trabalham ao longo de todo o empreendimento. Isso quer dizer que o peixe continua lá", afirma Alves.
Ele diz ainda que a concessionária integra um grupo de trabalho, comandado pelo Ministério da Pesca, que tenta definir, para a comunidade da Vila Teotônio, novas formas de pescar.
Além disso, a Santo Antônio Energia diz que já contratou por conta própria uma consultoria que, além de testar os métodos de pesca, trará pescadores de regiões que já fizeram adaptações semelhantes para conversar com os assentados.
Ao todo, serão investidos R$ 570 milhões no remanejamento de famílias da zona rural e urbana, de acordo com a concessionária.
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Reassentados por usina dependem de ajuda para sobreviver - Instituto Humanitas Unisinos - IHU