14 Outubro 2011
Um ano depois do resgate no Chile, maioria dos mineiros está sem emprego e enfrenta problemas de saúde. A reportagem é de Diego Zúñiga e publicado pelo sítio Deutsche Welle, 13-10-2011.
O jornalista chileno Carlos Vergara, autor do livro Operação San Lorenzo, um dos mais bem-sucedidos relatos sobre o resgate dos mineiros chilenos em San José, há um ano, trabalhava na editoria de Política do jornal La Tercera no dia em que a notícia do acidente veio à tona. Ele foi enviado para fazer a cobertura do caso, que envolvia 33 trabalhadores presos a 700 metros de profundidade.
No mesmo dia do desmoronamento da mina, em 5 de agosto de 2010, o então ministro de Minas, Laurence Golborne, estava em visita oficial ao Equador com o presidente Sebastián Piñera, precisamente para fechar acordos no setor de mineração. Um dia mais tarde, Piñera pediu que Golborne voltasse ao Chile e se colocasse à frente dos trabalhos de resgate.
"Os primeiros 17 dias foram os mais difíceis porque não tínhamos certeza que os mineiros estavam vivos", disse Golborne, que hoje responde pela pasta de Obras Públicas. Neste dia 13 de outubro completa um ano o resgate dos trabalhadores, que ficaram soterrados por 69 dias.
"O resgate foi um dos momentos mais importantes da minha vida. Saber que estavam com vida e compartilhar esta notícia extraordinária foi maravilhoso. Tínhamos muita esperança. Na verdade, muitas coisas passavam pela minha cabeça antes de saber que eles estavam vivos. Porém, nunca deixamos de acreditar que a história teria um final feliz", lembra Golborne.
Atritos com o presidente
A partir do momento em que souberam do acidente, vários veículos de comunicação iniciaram uma ampla cobertura. À medida que os familiares dos soterrados começavam a chegar até a mina da empresa San Esteban, a 50 quilômetros de Caiapó, começavam a transparecer as dificuldades do resgate.
Isso levou o governo a assumir a operação, batizada de "Profeta Jonas" e coordenada pelo ministro Golborne. Com isso, o ministro ganhou popularidade e começou a subir nas pesquisas de opinião. "Houve um conflito com o próprio presidente (Piñera).
Quando se percebeu a existência de 33 mineiros com vida, no dia 22 de agosto, Piñera agradeceu a Golborne e lhe disse que seu trabalho havia chegado ao final. Prontamente, trocaram o nome da operação, que passou a se chamar "San Lorenzo", e Piñera insistiu em visitar a mina", conta Vergara.
Esses acontecimentos não passaram em branco para a imprensa, que especulou sobre possíveis atritos entre os políticos na disputa pela atenção da mídia. Para Knut Bergmann, especialista alemão em Comunicação Política e Estratégia da Fundação Neue Verantwortung, em situações como essa, os políticos devem entrar em sintonia com as vítimas.
"É crucial sentir empatia sincera. Quando as pessoas percebem que os políticos exploram as situações em benefício próprio, surge o mal-estar. Estabelecer um vínculo sincero com as vítimas é muito difícil, ainda mais para pessoas que estão sob os olhares do público e dos meios de comunicação", avalia Bergmann.
Essa "empatia sincera" talvez tenha permitido que Golborne liderasse a preferência do público nas pesquisas sobre o protagonista no resgate dos mineiros, conforme uma pesquisa do Ipsos. "Com exceção de Golborne, a popularidade não foi muito duradoura para outras pessoas", ironiza Vergara. Segundo a pesquisa do Centro de Estudos da Realidade Contemporânea (CERC), publicada em outubro de 2011, um ano após o resgate, Piñera só alcança 22% de aprovação entre os cidadãos.
Em outubro do ano passado, segundo um estudo da Adimark, eram 63%. Hoje, o governo enfrenta protestos por melhoras na qualidade de ensino. No auge da cobertura midiática no ano passado, com mais de 2 mil jornalistas credenciados para cobrir o resgate, começou a se falar no país do "Chilean way", uma expressão inventada para dar a entender que se as coisas feitas "à moda chilena" iriam dar certo.
"O resgate foi uma árdua tarefa, na qual um país inteiro se uniu por uma causa grande. Foi um desafio que mostrou o melhor dos chilenos e que, quando se trabalha em equipe, é possível atingir os objetivos a que nos propomos. Esta experiência é única na história. Foi um acidente com um final positivo, vivenciado por milhões de pessoas. Esta foi uma prova e um sinal de unidade e esperança para o mundo", disse Laurence Golborne sobre o pior acidente em uma mina na história do país.
Um estudo da Universidade de Navarra, na Espanha, defende que, com o tempo, o resgate dos mineiros não deixará méritos individuais. Haverá a lembrança de uma façanha coletiva. O mesmo estudo, entretanto, afirma que "liderança e compromisso", "respeito" e "excelência" são três características associadas à imagem do presidente Piñera, que concentrou mais o foco da mídia do que o ministro Golborne. Mesmo assim, o governo não conseguiu cumprir as expectativas da população em outras áreas, acrescenta Vergara.
História de misérias
No dia 5 de agosto de 2011, 25 dos 33 mineiros resgatados no ano passado estiveram na sede do governo chileno para comemorar o primeiro aniversário do desabamento. As relações entre eles não são boas. Uns acusam os outros de terem tirado proveito pessoal da tragédia, esquecendo a promessa de seguirem sempre juntos, feita sob a terra no ano passado. Quatro dos mineiros visitaram em Washington uma exposição fotográfica sobre o resgate.
Quinze dos 33 estão desempregados. Alguns sofrem de silicose, uma doença causada pela inalação de poeira de sílica, outros têm diabetes ou continuam traumatizados. "Tiveram poucos dias de fama e hoje tudo voltou ao cinza de sempre. Outro dia li uma entrevista de Edison Peña, o mineiro maratonista, falando de uma clínica de desintoxicação. Ele reconheceu que a única coisa que fez logo depois de sair da mina foi beber", lembra Vergara.
Ainda que no início os trabalhadores resgatados tenham viajado pelo mundo e ouvido tantas promessas, no final a vida voltou a ser o que sempre foi. "Não sei o que mais poderiam ter conseguido. Não acredito que alguém tenha se aproveitado deles. Não eram, em absoluto, um poço de ouro. No fim, a história dos mineiros não é nada mais do que uma longa e repetida história de misérias", avalia Vergara.
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Mineiros chilenos, um ano após o salvamento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU