01 Setembro 2011
"Guru": essa palavra, nascida para designar os depositários da antiga sabedoria indiana e os mestres de ioga, nunca foi aplicada tão extensivamente ao mundo da indústria e da tecnologia como no caso de Steve Jobs. Seu biógrafo, Ken Auletta, o compara a Thomas Edison e Henry Ford. No Wall Street Journal, Michael Malone escreve que "a era do computador pode ser vista como um prolongamento da vontade sobre-humana desse personagem singular, brilhante e visionário, decidido a refazer o mundo à sua imagem e semelhança".
A reportagem é de Federico Rampini, publicada no jornal La Repubblica, 01-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
A partir dessas análises, eis alguns traços do "guru": não necessariamente o mais esperto ou o mais experiente, "faltando-lhe o talento de um grande engenheiro, reuniu uma equipe dos melhores alunos e soube seduzir-lhes ou intimidar-lhes para que realizassem a sua obra maior; o seu gênio pessoal fez dele o maior empresário e vendedor da era digital".
O preço a ser pago para trabalhar com ele foi quase sempre o anonimato (alguém sabe quem inventou o iPhone?) e muitas vezes também a dor: o "guru", como em uma seita religiosa, pode sugar toda seiva vital dos seus colaboradores. A sua agressividade na empresa era lendária, especialmente no primeiro capítulo da sua história na cúpula da Apple: quando ele voltou depois do longo exílio (1985-1996), o exílio e a doença o haviam tornado mais sábio. Duplamente guru.
E agora como se faz para encontrar um herdeiro? É concebível que exista uma sucessão planejada para um guru? No seu livro The Productive Narcissist, o psicólogo Michael Maccoby explica por que isso é quase impossível. Um executivo-chefe "narcisista" como Jobs é um profeta, um visionário e um showman, com a autoestima suprema que lhe permite assumir riscos extremos, na ambição de transformar o mundo.
Mas, como esses sujeitos raros são psicologicamente emotivos e instáveis, eles precisam, ao seu lado, de um número dois dotado de psique do tipo "obsessiva": estáveis, sólidos, trabalham nos bastidores para que a máquina da organização empresarial realize com precisão as intuições do guru.
O problema é que, com a saída do guru, as lógicas do poder empresarial e a vontade dos acionistas pressionam para que o número dois seja o sucessor. Isso aconteceu com a Apple, com Tim Cook, que, depois de ter preenchido por muito tempo o papel de braço direito, foi elevado a executivo-chefe. Imediatamente, ninguém vê a diferença, porque, nos anos da simbiose entre Jobs e Cook, foi testada a "máquina Apple", que produziu inovações em um fluxo constante.
No túnel da concepção de novidades que é a máquina dos projetos da Apple, estão em gestação ideias e soluções sobre as quais Jobs e Cook trabalharam juntos nos últimos 18 meses. E depois? O futuro mais distante está envolto pela incerteza, porque a receita para construir um guru em laboratório ainda não foi inventada. E se alguém tentasse, em vez de Jobs, poderia fabricar o Frankenstein.
A incógnita não é tanto se a Apple pode continuar sendo uma formidável incubadora de ideias e de inovações, tais como as que já estão nos arrastando para o "pós-computador" (iPhone e iPad e "nuvens" desenham uma alternativa aos aparelhos com teclado que ocuparam as nossas escrivaninhas nos últimos 30 anos). A incógnita verdadeira é se a Apple terá um profeta capaz de encantar as massas, o continuador daquela religião secular para a qual as massas de apaixonados se aglomeravam à noite na fila em frente à Apple Store na véspera do lançamento de novos produtos.
O contador de histórias que hipnotizava gerações de jovens e de adultos: esse é o guru-Jobs provavelmente irrepetível, porque qualquer substituto pareceria um imitador.
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Quando o rei não tem herdeiros. O caso Steve Jobs - Instituto Humanitas Unisinos - IHU