Com renúncia fiscal estimada em R$ 24,5 bilhões até o fim de 2012, o governo lançou ontem 35 medidas para estimular investimentos e diminuir os efeitos negativos do câmbio sobre a indústria, após uma queda de braço entre a equipe econômica e a ala desenvolvimentista. A medida provisória e os decretos que compõem o
Plano Brasil Maior não haviam sido divulgados até o fechamento desta edição.
A reportagem é de
Daniel Rittner e
Fernando Exman e publicada pelo jornal
Valor, 03-08-2011.
A medida mais elogiada pelos empresários só foi sacramentada no fim de semana: a restituição em espécie, aos produtores de bens manufaturados, do equivalente a 3% de suas exportações como forma de compensar o pagamento de tributos ao longo da cadeia que não são desonerados pelos benefícios em vigência. O mecanismo, batizado de Reintegra, tem aplicação imediata e os pagamentos devem começar em 90 dias. Com base nas atuais vendas ao exterior, devolverá cerca de R$ 4 bilhões por ano aos exportadores.
"Não é crédito tributário. É devolução imediata", disse o ministro do Desenvolvimento,
Fernando Pimentel. Pesos-pesados da indústria, convidados a assistir ao lançamento do
Plano Brasil Maior, deixaram o Palácio do Planalto perguntando-se se a restituição pode gerar questionamentos na
Organização Mundial do Comércio (OMC). "Tomamos toda a cautela para que as medidas não sejam interpretadas como subsídio", disse
Pimentel.
Considerado um dos mais resistentes a ampliar o leque de medidas, o ministro da Fazenda,
Guido Mantega, foi quem apresentou os detalhes do plano. Para ele, a atual situação de crise econômica nos países ricos "será prolongada" e não deverá melhorar, pelo menos, nos próximos dois anos. Por isso, o governo buscará garantir que o mercado interno "pertença à indústria brasileira e não aos aventureiros que vêm de fora."
Além de reforçar sua estrutura de defesa comercial, a presidente
Dilma Rousseff assinou decreto para regulamentar a lei que institui margem de preferência de até 25% para produtos e serviços nacionais nas licitações públicas. O foco maior será dado nas indústrias de defesa, medicamentos, têxteis, calçados e tecnologia de informação. Bancos estatais foram orientados a exigir o uso de fornecedores locais. Um exemplo são os financiamentos do programa
Minha Casa, Minha Vida. Construtoras que tomarem linhas oferecidas pela
Caixa não poderão mais usar materiais importados.
No entanto, os anúncios que mais chamaram a atenção foram as desonerações tributárias, principalmente a restituição de 3% aos exportadores de manufaturados. "Mais importante que o percentual é o mecanismo", definiu o vice-presidente executivo da
Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib),
Ralph Lima Terra. O próprio mecanismo, porém, ainda não está detalhado. O sistema será montado, pela Receita Federal e pelo Ministério do Desenvolvimento, em até 90 dias. Haverá uma lista, com restituição de 0,5% até 3%, restrita a bens manufaturados. Os pedidos de reembolso devem ser feitos à Receita.
Além do
Reintegra, houve outras três grandes medidas de desoneração. A isenção de IPI para bens de capital, material de construção e caminhões e veículos comerciais leves, com vigência até o fim de 2011, foi estendida por mais um ano. Haverá ainda a possibilidade de usar imediatamente, e não mais em 12 meses apenas, o crédito de PIS/Cofins sobre as compras de bens de capital. Finalmente, o governo prometeu zerar o passivo estimado em R$ 19 bilhões de pedidos de ressarcimento de PIS/Cofins cobrados nas exportações.
Como sinal de que os exportações não vão se decepcionar novamente,
Mantega anunciou que, a partir de outubro de 2011, empresas com escrituração fiscal digital terão processamento automático dos pedidos de ressarcimento e pagamento em 60 dias. A partir de março de 2012, a escrituração digital será obrigatória para todas as companhias.
Mas o alívio tributário total pode ser relativizado. Embora o cálculo de desonerações divulgado oficialmente atinja R$ 24,5 bilhões, o governo inclui na conta a renúncias já feitas de R$ 3,8 bilhões até julho. Ou seja, o pacote ficou em R$ 20,7 bilhões.
Outras medidas, como a adoção de uma "estratégia nacional de exportações" e a criação de um "conselho nacional de desenvolvimento industrial", foram interpretadas pelos empresários mais como um pacote de boas intenções do que como benefícios concretos. "É matéria requentada", disse o executivo da Abdib.
O
Plano Brasil Maior define dez metas até 2014. A primeira delas busca ampliar o investimento fixo de 18,4% para 22,4% do PIB. Os gastos da iniciativa privada com ações de pesquisa e desenvolvimento devem saltar dos atuais 0,59% para 0,90%. A participação brasileira nas exportações mundiais, de 1,36% do total, chegaria a 1,60%.
Um dos eixos da nova política industrial, o
BNDES prorrogou prazos e ampliou linhas existentes.
Pimentel afirmou que o governo usará a autorização legal já concedida ao Tesouro de emitir títulos públicos para fazer novos aportes de recursos ao banco.
O Congresso liberou o Tesouro a se endividar em R$ 55 bilhões para esta finalidade. Mas, desse total, somente R$ 30 bilhões foram efetivamente usados. Segundo ele, a intenção é emitir todo o valor restante, ou R$ 25 bilhões.
O BNDES estendeu, até o fim de 2012, o
Programa de Sustentação do Investimento (PSI) e incluiu setores como o de equipamentos de TIC (tecnologia da informação e comunicação) produzidos no país com tecnologia nacional e o de ônibus híbridos. Em outro programa, o BNDES Revitaliza, promete apoio a setores mais afetados pela valorização cambial, com orçamento de R$ 6,7 bilhões e taxa fixa de juros de 9% ao ano, válido até dezembro de 2012.
O governo incluiu nas medidas duas discussões ainda indefinidas no âmbito do
Mercosul: a negociação de um novo acordo automotivo e o aumento das tarifas de importação do bloco contra mercadorias nas quais há surtos de importação, principalmente da China. A proposta brasileira é aumentar, de cem para 200 produtos, a lista de exceções à tarifa externa comum (TEC). O governo argentino vê a ideia com cautela.
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Plano Brasil Maior. Governo devolverá R$ 4 bi por ano a exportador - Instituto Humanitas Unisinos - IHU