O governo disparou uma artilharia no câmbio, colocou uma espada sobre a cabeça do mercado ao acenar com a possibilidade de o
Conselho Monetário Nacional lançar medidas para derivativos e fortaleceu a posição do ministro da Fazenda,
Guido Mantega, no comando da economia. A edição de uma medida provisória e de um decreto taxando investimentos com derivativos cambiais elevou a cotação do ministro que vinha alertando para "medidas duras" que estavam a caminho no governo para conter a apreciação do real. A adoção de novas medidas e a autoridade do ministro entraram em xeque nos últimos dias, quando declarações da presidente
Dilma Rousseff indicaram que o governo não se moveria diante da turbulência externa. "Pela primeira vez, a política cambial saiu claramente das mãos do BC e foi parar nas mãos do CMN, da Fazenda", alerta uma das fontes consultadas pelo Valor.
A reportagem é de
Angela Bittencourt e publicada pelo jornal
Valor, 28-07-2011.
Sob o efeito das novas medidas, que entraram em vigor ontem quando reveladas pelo Diário Oficial da União, parte do mercado deu uma releitura ao "confronto verbal" que teria, dias antes, distanciado
Dilma de
Mantega. Credenciado economista pondera que, ao descartar medidas mais agressivas no câmbio, a presidente
Dilma estaria afastando a possibilidade de o governo adotar, por exemplo, quarentena para o capital externo aportado no país.
Mantega, por sua vez, estaria acenando com "medidas duras", focando capitais especulativos - o que de fato se confirmou. Outro economista atribui a falta de sintonia verbal entre
Dilma e
Mantega à deficiente comunicação do governo e não a discordâncias na gestão da política cambial.
"O governo mudou com a chegada de
Dilma ao Planalto. Tem hoje uma presidente que é economista e um ministro da Fazenda com grande poder em mãos. O
presidente Lula tinha a preocupação de cultivar o conflito para arbitrar. E isso era evidente na relação
Mantega e
Henrique Meirelles. O
presidente Lula - um político - operava dessa maneira.
Dilma não é assim. Ela entende o que acontece na economia e tem sua própria opinião", comenta outra fonte para quem também ocorreu, no
governo Dilma, um esvaziamento do poder do Banco Central.
Esse economista avalia que não há contradição entre as declarações de
Dilma - descartando medidas em entrevista na sexta-feira - e as declarações de
Mantega no início desta semana. "Não há contradição, mas talvez descompasso resultante de uma avaliação duvidosa do próprio governo sobre o cenário externo. Nos últimos quatro dias a situação piorou muito nos Estados Unidos. No meio da semana passada havia esperança de que o
governo Obama e o Congresso americano chegariam a um consenso sobre a elevação do limite de endividamento do país. Mas isso já mudou. Predomina a imprevisibilidade que afeta as economias em escala global", pondera a fonte.
As medidas anunciadas ontem pelo governo brasileiro levam em conta que o cenário para o câmbio não deve mudar tão cedo, entendem economistas ouvidos pelo Valor. Isso porque a tendência de enfraquecimento do dólar poderia mudar em duas situações: se o embate político que se observa nos Estados Unidos fosse solucionado ou se os sinais de recuperação da economia americana fossem definitivos. "As chances dessas duas situações ocorrerem diminuiu muito nos últimos dias. Além disso, prevalece a percepção no mercado internacional de que o
presidente Obama já está enfraquecido. Seja qual for o resultado dos entendimentos com o Congresso,
Obama sairá arranhado. E isso ajuda a manter o dólar para baixo contra todas as moedas", comenta um interlocutor.
A perspectiva para o dólar no Brasil também não muda. A moeda tende a seguir em baixa, uma vez que a economia brasileira vai relativamente bem num mundo catastrófico. Portanto, o real tende a se manter valorizado. E, como em 2008, o câmbio passa a oferecer mais riscos por seguir numa única direção. Nesse sentido, o governo está agindo corretamente, na avaliação de economistas, porque apostas unidirecionais podem crescer e tornar ainda mais arriscadas as posições especulativas.
"Não se trata simplesmente de forçar uma desvalorização do real. É mais que isso. Quando as medidas se restringem ao IOF elas são reativas. Agora, as medidas têm cunho preventivo", avalia uma fonte que lembra da insegurança e das perdas geradas por operações contratadas por empresas em derivativos em 2008. Nos últimos 12 meses encerrados em agosto de 2008 (antes da quebra do Lehman Brothers), o dólar acusava queda de 16,75% ante o real. A relação dólar/real não é muito diferente agora. Nos últimos 12 meses encerrados na terça-feira, o dólar cai 13% ante o real.
Em 2008, a perda acentuada do dólar animou grandes empresas a elevarem suas apostas em derivativos pautadas pela queda da moeda americana. Esses apostadores enfrentaram uma crise inédita no Brasil com a eclosão da crise do subprime que incentivou uma alta do dólar em quase 17% apenas em setembro de 2008. A
Aracruz e a
Sadia foram destaque na crise doméstica cultivada pela turbulência global de três anos atrás. Ambas contabilizaram perdas bilionárias pela contratação de instrumentos financeiros que passaram a ser conhecidos como "derivativos tóxicos".
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CMN assume linha de frente na batalha cambial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU