14 Julho 2011
Em 2010 na Guatemala aconteceram 5.960 casos de morte violenta para uma população de apenas 14 milhões de pessoas; uma taxa de 45,1 homicídios para cada 100 mil habitantes. 85% dessas mortes foram por armas de fogo.
A reportagem é de Adrián Pérez e publicada pelo Página/12, 14-07-2011. A tradução é do Cepat.
Uma espiral de assassinatos e crimes envolve a Guatemala. O assassinado do cantor Facundo Cabral no sábado é apenas o mais recente exemplo da crise de segurança de um país dominado pelos cartéis do narcotráfico, ameaçado por formações paramilitares e assolado por bandos de jovens expulsos dos Estados Unidos.
“O que estas páginas nos oferecem podem ser lidas com a lente do pessimismo, mas também e igualmente, podem ser lidas com o desafio do quando ainda temos que fazer”, afirma o procurador Sergio Morales Alvarez (foto) , autor do último relatório publicado pela Procuradoria de Direitos Humanos guatemalteca.
O documento é exemplar e exige respostas imediatas. Desnuda a vulnerabilidade dos direitos humanos nesse país e se apresenta como espelho da violência que grassa entre os setores mais negligenciados. Em 2010 houve 5.960 casos de morte violenta para uma população de apenas 14 milhões 361 mil 666 habitantes, uma taxa de 41,5 homicídios por 100 000 habitantes. 85% dessas mortes foram causadas por armas de fogo, diz o relatório. Segundo o estudo, as vítimas são adultas em uma escala de idade 18-25 anos. Mortes jovens e evitáveis.
O relatório – disponível em pdh.org.gt em sua versão completa indica algumas chaves. Tambem coloca a nú a falta de políticas públicas. “Se o Estado não protege seus cidadãos não pode evitar a violência, se persiste a pobreza e a falta de atenção com setores vulneráveis como mulheres, crianças e adolescentes, não se erradica a violência”.
O país centro-americano, entretanto, não escapa de uma história marcada pela violência estatal. Marco Tulio Alvarez, diretor dos Arquivos da Secretaria da Paz do Escritório da Paz, diz que o que acontece não é totalmente distante da guerra civil que dilacerou o país. Ele afirma ainda que durante este período se deram as condições para as ações de grupos paralelos e aparatos de segurança clandestina que assolam Guatemala.
Alvarez acredita que durante a contra-insurgência se articulou uma infraestrutura de recuros de inteligência que originaram o capital daqueles oficiais que atuavam nas forças armadas. "Com o fim da guerra se chegou à hipótese que continuaram a operar uma estrutura paralela ao Estado", diz o responsável pelos Arquivos para a Paz.
Não está descartado que esses ex-militares participam das novas organizações criminosas. Alvarez calcula que, em alguns casos, se observa que não delinquentes comuns que levam adiante certas operações criminosas, mas sim que existe uma azeitada organização por detrás desses crimes. "Isso envolve a participação de uma infraestrutura de alto nível", diz ele.
A partir do trabalho de recuperar a memória histórica, Alvarez diz que em análises realizadas sobre o modus operandi dos militares durante a ditadura, se pode determinar que exerceram certa práticas proprias de uma guerra contra-subversiva; ações que passaram por cima de normas legais e garantias constitucionais. “De alguma maneira, essas práticas criaram um sistema e uma forma de funcionar esses aparatos paraestatais, influindo e infiltrado no proprio Estado”, diz Alvarez e, avalia que é provável que alguns funcionários das forças de segurança colaborem com estes aparatos.
"É bastante claro que no nosso país estes organismos funcionam. Essa é a razão da criação da Comissão Internacional contra a Impunidade na Guatemala (CICIG). Não apenas no assassinato de Facundo Cabral, mas em muitos outros casos estamos vendo uma alta capacidade de ação dessas organizações onde as forças do Estado são limitados ", acrescenta. O aumento desses atos de violência coincide, de acordo com Alvarez, com a crescente deterioração da segurança. "O que está faltando é identificar esses aparatos clandestinos ligados ao tráfico de drogas, ao crime e a ex-militares", diz ele, e admite que não é fácil chegar até a medula do problema, porque há uma estrutura que mascara a situação.
Alvarez cita o caso da General Hector Mario Lopez Fuentes, um dos generais no comando do Estado-Maior em 1982. "Lamento que esses oficiais tenham participado de práticas muito duras, está claro que cobravam quotas e integraram partes de um grupo emergente que enriqueceu rapidamente. Ao contrário dos argentinos, ainda não fizemos progressos no julgamento desses criminosos e isso está impedindo que tenhamos ‘nosso nunca mais’”.
O relatório anual do PDH guatemalteca foi apresentado em janeiro. Entre as suas 1.200 páginas, Morales Alvarez lança uma interrogação que exige uma ação imediata por parte das autoridades: "Nós já dissemos isso publicamente e agora o fazemos por escrito. Frente ao pessimismo generalizado devemos perguntar: A Guatemala já chegou ao fundo do poço ou vamos continuar cavando ainda mais fundo? Minha resposta é Não! ".
Para ler mais:
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Guatemala emaranhada em seu labirinto - Instituto Humanitas Unisinos - IHU