03 Julho 2011
A Igreja da Inglaterra bloqueia as nomeações episcopais dos sacerdotes homossexuais pelo menos até 2013. Uma marcha a ré que ainda provocará discussão.
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vatican Insider, 03-07-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Uma pausa às consagrações episcopais dos padres gays. Os bispos da Igreja da Inglaterra bloquearam temporariamente a nomeação a bispos dos sacerdotes homossexuais. À espera do documento com o qual, em 2013, serão abrangentemente fixadas as normas a respeito, a Igreja Anglicana se confia a uma brusca marcha a ré para conter a perda de fiéis e as dilacerantes polêmicas provocadas pelo sim aos bispos gays.
Há apenas um ano, o chefe dos anglicanos, Rowan Williams, havia estabelecido que "a Igreja Anglicana não tem nenhum problema em nomear bispos pessoas homossexuais, contanto que sejam respeitadas as tradições e os padrões históricos que impõem aos padres gays que permaneçam célibes". O "sim" aos bispos gays haviam levantado uma onda de reações e de polêmicas dentro do mundo anglicano, tanto da parte conservadora quanto progressista.
A intenção era a de manter unida a Igreja da Inglaterra, mas parece ter tido o efeito contrário. A partir da ameaça de um cisma conservador depois da nomeação a bispo de Jeffrey John, diácono unido civilmente a outro homem. "O custo para toda a Igreja seria muito alto se a tolerância aos gays tivesse que ser levada até o ponto de aceitar padres e bispos com relações ativas", afirmou Williams em setembro de 2010, mesmo dizendo-se consciente, desde a sua nomeação a arcebispo de Canterbury, que a questão homossexual representa "uma ferida para todo o ministério".
O problema é particularmente grave porque, enquanto todos os padres na Igreja Católica são obrigados ao celibato, na Igreja anglicana só os homossexuais o seriam, com uma evidente discriminação. "As suas declarações são inconsistentes", comentou o líder de uma associação de direitos humanos, Peter Tatchell. "Rowan está na janela com relação ao problema dos padres gays, e não sei se ele dorme à noite. Antes de se tornar arcebispo de Canterbury, ele apoiava a inclusão dos gays e a igualdade. Agora, ele penaliza os padres gays como Jeffrey John e chega a contentar alguns dos cristãos homofóbicos mais odiosos do mundo. A seu ver, a unidade da Igreja conta mais do que os direitos de gays e lésbicas".
Mas também da parte conservadora chegam críticas severas. "Não é a Igreja que tem um problema", defende o comentarista norte-americano David Virtue. "É Williams quem tem. A Igreja tem permanecido de pé por 2.000 anos e jamais abençoou, aceitou ou aprovou nenhum tipo de relação sexual fora do casamento heterossexual".
No Vaticano, os desenvolvimentos desse episódios são acompanhados com atenção, porque, apesar das atuais dificuldades entre anglicanos e católicos em questões de caráter teológico e ético, Bento XVI promoveu com decisão o diálogo, recebendo em audiência, no dia 23 de novembro de 2010, o primaz da Comunhão Anglicana, o arcebispo de Canterbury (acompanhado por sua esposa Jane e seu filho Philip), em uma data altamente simbólica: o 40º aniversário do histórico encontro entre o então arcebispo de Canterbury, Michael Ramsey, e o Papa Paulo VI. Um "face a face" de porte epocal, que deu origem a uma nova era de relações depois da ruptura ocorrida no tempo de Henrique VIII no século XVI.
O arcebispo Williams falou abertamente ao Papa Ratzinger sobre as tensões e as dificuldades que assediam a Comunhão Anglicana e, portanto, da incerteza do futuro da própria Comunhão. Desenvolvimentos recentes, especialmente relativos ao ministério ordenado e a certos ensinamentos morais, afetaram não só as relações internas à Comunhão Anglicana, mas também as relações entre a Comunhão Anglicana e a Igreja Católica.
A decisão da Igreja de Inglaterra de aprovar a ordenação de presbíteras em 1992 tornou-se um dos problemas no caminho rumo à plena unidade entre as duas Igrejas. Em 2003, bispos anglicanos da África, Ásia e América Latina criticaram duramente a decisão da Igreja Episcopal dos Estados Unidos (pertencente à Comunhão Anglicana) de designar como bispo um homossexual em New Hampshire. A Igreja Episcopal dos Estados Unidos também nomeado como presidente, pela primeira vez, uma mulher, Katharine Jefferts Schori, até pouco tempo atrás bispa de Nevada.
Há anos, na verdade, a questão dos padres abertamente homossexuais promovidos a bispo levanta, em todo o mundo, um ardente debate. Ainda em novembro de 2003, a consagração de Gene Robinson, gay declarado, como bispo coadjutor da diocese episcopal de New Hampshire (EUA), correu o risco de tornar real o cisma entre os anglicanos e os episcopais.
Os líderes espirituais das Igrejas anglicanas dos países do Terceiro Mundo, de fato, condenaram a consagração. A comunhão com a Igreja anglicana norte-americana "está comprometida", trovejou o reverendo Peter Akinola, de Lagos, bispo de Abuja e chefe da comunidade anglicana da Nigéria, manifestando-se em nome "dos primazes do Sul", que representam 50 dos 70 milhões de anglicanos do mundo. A consagração de bispos gays "viola os preceitos claros e coerentes da Bíblia".
A Igreja Anglicana do Quênia, por sua parte, anunciou o rompimento das relações religiosas com a comunidade anglicana norte-americana depois da consagração do bispo homossexual. "Como Igreja, não podemos aceitar a homossexualidade em nossas fileiras, pois é um pecado. Consequentemente, decidimos romper os nossos laços com a Igreja anglicana norte-americana", explicou o bispo Thomas Kogo, da diocese anglicana de Eldoret (na parte ocidental do país).
A Igreja anglicana da Uganda também protestou duramente: "Já decidimos romper as relações com aquelas dioceses que consagram bispos homossexuais ou abençoar casamentos entre homossexuais. Na realidade, não somos nós que rompemos com a diocese de New Hampshire. São elas que decidiram ficar de lado".
Oito anos atrás, o próprio arcebispo de Canterbury, Rowan Williams, tentou mediar a situação, expressando o seu "profundo pesar" pelas divisões dentro da Comunhão Anglicana. "As divisões que surgem são um motivo de profundo pesar", disse Williams, líder espiritual da Igreja Anglicana. As divisões "serão tão mais visíveis quanto mais for impossível que o ministério de Gene Robinson como bispo seja aceito por cada província da Comunhão", acrescentou. "É claro que aqueles que consagraram Gene Robinson agiram de boa fé", reconheceu Williams, no entanto, convidando a enfrentar "com honestidade" os efeitos dessa iniciativa na Comunhão Anglicana mundial, com 70 milhões de fiéis, especialmente nos países não ocidentais.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Anglicanos: uma pausa aos bispos homossexuais - Instituto Humanitas Unisinos - IHU