28 Junho 2011
Comunidade de Curitiba implanta modelo de consumo que reduz o impacto ambiental – inclusive em grandes centros urbanos.
A reportagem é de João Rodrigo Maroni, e publicada na Gazeta do Povo, 29-06-2010.
No tempo dos nossos avós, o lixo não virava lixo – virava comida de galinha. Além de ter carne e ovos fresquinhos todos os dias, o pão, o leite e o queijo eram doados pelos vizinhos, que em troca recebiam laranjas, limões e o que mais tivesse no quintal. O esterco se transformava em adubo para a horta das famílias. E o ciclo se repetia.
A poucos quilômetros do centro de Curitiba, no bairro Mossunguê, a cena ainda pode ser vista ao lado. Ao menos na Quinta da Videira, uma espécie de mini chácara autossustentável e “quartel general” do coletivo Casa da Videira, um grupo formado por 25 pessoas que, ao adotar soluções simples, do tempo da vovó, parecem estar anos adiante no que diz respeito a preservar os recursos naturais. Cada família dedica-se a estudar um tema específico, como sustentabilidade, mobilidade e segurança comunitária. Depois, todos compartilham informações.
Soluções
Em tempos de aquecimento global, mudanças climáticas e uma busca desesperada por novas soluções para diminuir o impacto das grandes cidades sobre a natureza, essa turma recicla o próprio lixo, cria animais sem incomodar a vizinhança e usa apenas um carro – só para citar algumas iniciativas ambientalmente corretas. “Queremos fazer com que o nosso jeito de ser, nossa vida, seja uma boa notícia para os outros”, resume o pedagogo Eduardo Feniman. Ele e a esposa, Debora, também pedagoga, moram na Quinta e dedicam-se exclusivamente à comunidade, o que inclui cuidar de galinhas, cabras, coelhos e da horta no fundo do quintal.
Nos canteiros, o lixo orgânico dos vizinhos transforma-se em beterrabas, couves, cenouras e muito mais. “Aqui tem três toneladas de lixo. Você está sentindo cheiro?”, pergunta Eduardo, sem esconder um sorriso ao ver a cara de espanto do repórter. Além das hortaliças, eles produzem pães, conservas, molho de tomate e geleias. Compram algumas frutas, grãos e açúcar. Uma vizinha, que tem uma vaca, doa o leite.
O professor de Administração Rene Seifert, a esposa dele, Vanessa, e o pequeno Oliver, 1 ano, também integram a Casa da Videira. Rene estudou na Inglaterra e conta que chegou a adotar lá fora ideias surgidas na comunidade. O casal de classe média está há cinco anos sem ter um carro próprio. “Temos um carro coletivo, uma kombi”, diverte-se.
Mesmo morando em apartamento, é possível adotar soluções ecologicamente corretas. “Temos a lixeira viva [equipamento compacto e simples, que faz a compostagem do lixo orgânico através da ação de minhocas, sem cheiro] e horta também. Tenho alface, escarola, rúcula, temperos”, enumera Vanessa. Debora diz que até o lixo do banheiro na Quinta é processado. Ele é queimado e as cinzas vão para os canteiros. Ela reconhece, no entanto, que o ritmo moderno nem sempre facilita mudar o estilo de vida. “Hoje em dia as pessoas buscam pelo mais fácil. Até porque trabalham, passam o dia fora de casa”, pondera. Mas a pedagoga acredita que com um pouco de força de vontade é possível mudar hábitos – como diminuir o uso de embalagens descartáveis. Na Casa da Videira, os alimentos são comprados a granel e guardados em potes de vidro, caixas e outros recipientes de uso prolongado.
Para Eduardo, antes de tudo as pessoas precisam resgatar um espírito de coletividade. Só desta forma soluções “verdes” podem ser implementadas em maior escala nas cidades. “Num apartamento, talvez eu não consiga produzir minha comida, mas em sinergia com outros isto é possível”, conclui.
BONS EXEMPLOS
Algumas cidades pelo mundo que adotaram medidas sustentáveis:
Wallington
A eco-vila conhecida como BedZED, localizada no sul de Londres, na Inglaterra, é um exemplo de comunidade sustentável. As cerca de 80 residências do bairro foram todas construídas com madeira certificada e aço reciclado. As casas foram projetadas para otimizar a luz do sol e armazenam água da chuva para a descarga dos vasos sanitários. O local também possui tratamento de esgoto próprio.
Barcelona
A cidade espanhola foi a primeira cidade europeia a ter uma lei de energia solar térmica, que entrou em vigor em 2000 e obrigou a utilização de energia solar para abastecer 60% da água quente em todas as novas construções. Além disso, a cidade ampliou em 20 vezes a área de superfície de painéis solares.
Chengdu
A cidade chinesa, de quase 5 milhões de habitantes, deu início em 1993 a um projeto de revitalização integral dos rios Nan e Fu. Com parcerias entre os setores público e privado, o governo promoveu a conscientização da opinião pública e removeu mais de 30 mil famílias das margens dos rios, que tiveram a maior parte de seus leitos restaurados. O projeto serviu de modelo para outras cidades da região.
Houston
Com mais de 2 milhões de habitantes, a cidade dos Estados Unidos lançou um programa para melhorar a qualidade de vida dos moradores, reduzindo o consumo de energia e as emissões de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. A ação reduziu o consumo de energia em 641 residências através de uma maior eficiência energética e economizou 1,1 mil toneladas de CO2.
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"Queremos fazer com que o nosso jeito de ser, nossa vida, seja uma boa notícia para os outros" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU