18 Abril 2011
O Brasil está debatendo a criação de uma Comissão da Verdade, uma proposta já existente no governo Luiz Inácio Lula da Silva, e que agora foi retomada com força por Dilma Rousseff. Jair Krischke, conselheiro fundador do Movimento de Justiça e Direitos Humanos esteve dias atrás em Buenos Aires onde em conversa com Página/12 fez uma avaliação crítica do governo Lula e partilhou esperanças de que o mandato de Rousseff traga alento para os que lutam pela punição dos repressores da ditadura brasileira (1964-1985).
Eis a entrevista de Jair Krischke concedida ao Página/12, 18-04-2011. A tradução é do Cepat.
Qual é a opinião do senhor sobre a proposta do governo da Comissão da Verdade?
Um problema. Custou muito trabalho e muito esforço das organizações de direitos humanos e dos familiares para chegar até este momento. O ministro de Defesa, Nelson Jobim quer transformar verdade em reconciliação. Isso não é absolutamente possível. A reconciliação é uma palavra muito bonita, mas apresenta exigências: quem ofendeu tem que reconhecer o que fez, o crime que cometeu; logo tem que pedir perdão aos familiares das vítimas que o perdoariam ou não. Os militares brasileiros, entretanto, não reconhecem o que fizeram e jamais pedirão perdão.
Tem esperança de que a Comissão venha a funcionar?
Eu confio em Dilma. Ela não é como Lula que não queria nada com o tema. Durante os oito anos que esteve no governo nunca recebeu os familiares. Dilma é diferente. É uma mulher ligada a esse tema, sabe do que se trata e acreditamos que é a favor da Comissão da Verdade. Temos grandes expectativas, mas sabemos que não vai ser fácil.
Como avalia o trabalho da atual Secretaria dos Direitos Humanos?
A ministra Maria do Rosário já declarou publicamente que partilha da postura do ministro Jobim. Isso nos preocupa, mas a sociedade civil brasileira vai trabalhar para que o tema avance. Maria do Rosário declarou à imprensa que a Comissão da Verdade não vai punir ninguém. Claro que nenhuma Comissão da Verdade não vai punir ninguém. O que deve fazer é entregar as informações à Justiça.
O que pensa da decisão do Supremo Tribunal Federal que ratificou no ano passado a Lei da Anistia de 1979?
Antes de fazer a apresentação diante da Justiça, eu disse ao presidente do Colégio de Advogados que não deveríamos fazê-lo. Porque conhecendo como sempre se posiciona nossa Suprema Corte, ingressar com essa causa e sair perdendo implicaria em encerrar o assunto. E esse tema não é jurídico, é político e precisa ser discutido políticamente.
Ajuda a sanção do ano passado da Corte Interamericana de Direitos Humanos?
Isso foi muito importante para nós. As organizações de direitos humanos enviaram uma carta pedindo que se cumpra a decisão da Corte-IDH.
A sanção da Corte IDH se refere à repressão contra a guerrilha do Araguaia. O que aconteceu com os arquivos secretos nesse caso?
Quando Lula assumiu, a Justiça mandou abrir os arquivos do Araguaia. A decisão dizia que se não o fizésse em 15 dias, pesaria uma multa diária. O governo foi até a Suprema Corte para apelar dessa resolução e perdeu. A notificação final que exigia a abertura chegou em outubro de 2007 no Palácio do Planalto. Imediatamente, Jobim designou uma equipe para ir para o Araguaia buscar os corpos e não os familiares. A equipe não encontrou nada. Uma semana ou dez dias depois, uma irmã de um dos desaparecidos foi e fez umas escavações de 30 metros e encontrou ossos. Parece brincadeira, mas essa era a posição de Lula: não fazer nada.
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Comissão da Verdade: "Eu confio em Dilma. Ela não é como Lula que não queria nada com o tema" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU