02 Abril 2011
"A invocação `Santo subito` [Santo já] foi acolhida, mas quantas resistências sobre a sua mensagem... De Madre Teresa, disse-se que se poderia canonizá-la ainda em vida. Eu pensava: o mesmo poderia ser dito sobre João Paulo II. Ele morreu como um patriarca bíblico, cheio de anos e de sabedoria, indicando o caminho da graça".
O cardeal Stanislaw Dziwisz (na foto, ao lado de João Paulo II), arcebispo de Cracóvia, na Polônia, foi durante 40 anos secretário pessoal de Karol Wojtyla, permanecendo perto dele até o seu último dia.
A reportagem é de Orazio La Rocca, publicada no jornal La Repubblica, 01-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto e revisada pela IHU On-Line.
Eis a entrevista.
Cardeal Dziwisz, em um mês, depois de seis anos da sua morte, João Paulo II será beato. Alguns se lamentam que isso foi feito com muita pressa. O que o senhor acha?
Devemos confiar no julgamento e, portanto, nos tempos da Igreja. Não há dúvida de que chegar à beatificação em apenas seis anos desde a morte é um fato de enorme destaque, cujo mérito vai sobretudo a Bento XVI, que, concordando com o indulto com relação aos tempos previstos pela legislação canônica, pôs as condições para que a invocação "Santo subito" que explodiu na Praça de São Pedro no dia dos funerais fosse acolhida lá em cima. De fato, se não víssemos o dedo de Deus e as moções do Espírito por trás de tais eventos, seríamos pagãos que falam a esmo das coisas sagradas.
Eminência, sobre a agonia do Papa Wojtyla, há ainda alguma coisa de inédito a ser esclarecida?
Não há nenhum mistério por trás da morte de João Paulo II. Veja, quem lhe havia sido próximo por uma vida inteira, podendo constatar desde o início o seu sofrimento pelo obscurantismo imposto pelo regime comunista na Polônia e encontrando depois – uma vez em Roma – a total transparência à qual ele se atinha como critério regulador da sua vida e da sua própria atividade, só podia se comportar consequentemente. E fazer aquilo que ele mesmo, se pudesse, nos teria dito fazer. Ele era um homem que tinha um profundo senso do mistério, e isso gerava ao redor dele uma aura de insondabilidade e de grande respeito. Uma espécie de espaço absoluto, desvinculado de tudo, diretamente ligado com Deus.
É verdade que foi João Paulo II que pediu que os médicos interrompessem os tratamentos?
A mídia e talvez também uma certa propaganda política se aproveitaram impropriamente daquela frase, "Deixem-me ir para o Pai", que ele disse em um contexto específico e inequívoco, e certamente não para suplicar que lhe fosse dada a morte. É uma hipótese não só totalmente estranha à sua mentalidade, mas também profundamente defasada com relação ao efetivo andamento das coisas. O Papa foi tratado e ajudado a viver até o instante posterior à efusão do último suspiro. Com aquela frase, ele queria nos consolar e atenuar a nossa dor.
Wojtyla, portanto, morreu em "odor de santidade"?
Como humilde testemunha, digo que foi a morte de um homem que viveu em Deus, que, também no último trecho da sua corrida, não teve hesitação nem momentos desesperadores, mas continuou permanecendo serenamente em Deus. Tudo aquilo que ele pediu e fez naqueles últimos dias pode ser remetido à sua profunda piedade, vivida na vida até à morte. Parecia absorto e distante e, ao contrário, sob as pálpebras semifechadas, os seus olhos estavam vivos e diziam a sua presença e a sua oferta a Deus também na hora suprema. Morreu como um patriarca bíblico, cheio de anos e de sabedoria, indicando a todos a graça – não o terror – da morte e de uma morte santa. O canto do Magnificat espontaneamente entoado pelos presentes quando ele expirou foi a resposta mais condizente ao testemunho de santidade que recém havíamos acolhido, entre a comoção indizível.
O que lhe restou dos 40 anos vividos ao lado de Wojtyla?
Tudo ficou impresso no meu coração, porque nada pode ser tirado de cima de nós com relação ao que a graça de Deus dispõe e oferece, às vezes abundantemente. Enquanto o meu serviço estava em curso, primeiro ao cardeal Wojtyla e depois a João Paulo II, eu percebia constantemente que ele tinha a ver com um santo. Um dia, olhando para Madre Teresa entre os seus pobres na TV, ele deixou escapar que se poderia canonizá-la ainda em vida. Era só uma declaração simpática. Mas eu pensei que o mesmo poderia ser dito sobre ele.
O longo pontificado de Wojtyla foi entendido e atualizado?
Entre ele e as pessoas que ele encontrava havia nascido um feeling singular. Por meio das diversas facetas, o seu pontificado foi sobretudo um convite aos homens, aos Estados, aos sistemas econômicos, às civilizações, a "escancarar as portas a Cristo" e a "acolher o seu poder salvador". Ora, não há dúvida de que, com relação a essa fundamental diretriz de marcha, haja resistências, traições, nostalgias equivocadas, durezas inúteis. Um apelo que Bento XVI assumiu, continuando a renová-lo nas formas culturais condizentes aos anos que vivemos: não ouvir o seu convite significa ignorar o ensinamento de João Paulo II.
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"João Paulo II morreu como um patriarca bíblico" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU