24 Março 2011
Fragilizada no Supremo Tribunal Federal (STF), a Lei da Ficha Limpa corre riscos reais de ser ainda mais esvaziada. "A constitucionalidade da lei referente aos seus vários artigos poderá vir a ser questionada futuramente antes das eleições de 2012", admitiu o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro do STF e defensor da lei, Ricardo Lewandowski. Segundo ele, nesse futuro exame "a lei vai ser fatiada como um salame e será analisada alínea por alínea".
A reportagem é de Mariângela Gallucci e publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo, 25-03-2011.
O STF deverá se posicionar sobre a constitucionalidade da lei se alguma autoridade, partido político ou entidade de classe de âmbito nacional provocar formalmente o tribunal por meio de uma ação. Na quarta-feira, os ministros apenas decidiram que a norma, publicada em junho de 2010, não poderia ter sido aplicada na eleição do ano passado porque a legislação exige que mudanças desse tipo sejam aprovadas com pelo menos 12 meses de antecedência. Uma decisão anterior, do TSE, tinha determinado a aplicação da lei às eleições de 2010.
Não há ainda uma lista disponível com os nomes dos políticos fichas-sujas que poderão tomar posse em decorrência da decisão do STF. Ontem, Lewandowski afirmou que as posses não serão imediatas. Cada caso terá de analisado individualmente pelos ministros relatores. Confirmado que o político teve votos suficientes para se eleger, terão de ser realizadas as diplomações e marcadas as posses.
No STF, a lei deverá enfrentar resistência quando tiver a sua constitucionalidade questionada. Pelo menos 4 dos 11 ministros já adiantaram que são contra alguns pontos da norma. O primeiro deles estabelece a possibilidade de um político ser excluído da disputa eleitoral por uma condenação ocorrida no passado. "Se você puder apanhar fatos da vida passada para atribuir efeitos futuros, talvez não haja mais limites", comentou o ministro Gilmar Mendes.
Outro ponto prevê a inelegibilidade antes do final do processo criminal. Pela lei, para se tornar inelegível, basta que o político tenha sido condenado por um tribunal colegiado. Críticos afirmam que isso contraria o princípio da presunção da inocência, segundo o qual ninguém será considerado culpado até o final do processo.
Para o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, na análise de caso a caso o STF construirá a jurisprudência sobre a lei, inclusive quanto ao argumento de que ela viola o princípio da presunção de inocência. Ele destacou que os processos têm de ser equilibrados e reconheceu que "a Ficha Limpa vai evoluir".
PERGUNTAS & RESPOSTAS
Dúvidas sobre a Ficha Limpa
1. Um candidato pode ter a candidatura barrada por fatos ocorridos antes da aprovação da lei?
Há ministros que julgam ser inconstitucional essa punição. O caso mais emblemático é barrar candidatura de quem renunciou ao mandato para evitar a cassação. Antes da Ficha Limpa, não havia punição para essa conduta.
2. É inelegível o condenado por órgão colegiado, mas que ainda aguarda julgamento de recursos?
O entendimento da Corte é que ninguém pode ser punido antes de julgamento na última instância. Mas parte dos ministros entende que a inelegibilidade não é uma pena, mas uma condição que impede que alguém dispute a eleição.
3. É exagerada a inelegibilidade por 8 anos ao fim do cumprimento da pena?
Parte dos ministros entende que sim. Ex: um condenado a 30 anos de prisão ficaria inelegível por 38 anos - o prazo da inelegibilidade supera a maior pena prevista na legislação brasileira.
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"Ficha Limpa vai ser fatiada como salame", diz ministro do STF - Instituto Humanitas Unisinos - IHU