14 Fevereiro 2011
"Os signatários da DM podem sinceramente apresentar a Professio fidei exigida como condição indispensável para ensinar, em nome da Igreja, nas faculdades de teologia?", questiona o teólogo alemão, Manfred Hauke, professor de Patrística e Dogmática na Faculdade de Teologia de Lugano e vice-diretor da Revista Teológica de Lugano.
Segundo ele, "o memorando dos 143 teólogos entristece pois não oferece nenhuma contribuição para lançar-se rumo a um futuro cheio de esperança, mas sim uma demolição põe em perigo o tesouro da fé eclesial".
O artigo, intitulado "Aufbruch oder Abbruch? – Eine Stellungnahme zum Theologen-Memorandum „Kirche 2011“ foi, originalmente, publicado pelo jornal alemão Die Tagepost, 07-02-2011. A tradução é da Agência Zenit, 13-02-2011.
Eis o artigo.
Em 3 de fevereiro, um conhecido jornal alemão, o Süddeutsche Zeitung, publicou um relatório (Memorándum) assinado por 143 teólogos alemães, com o título "Igreja 2011: uma adesão necessária" (Ein notwendiger Aufbruch (1)). As petições lembram, em muitos aspectos, a "Declaração de Colônia", de 1992, e a iniciativa "Nós Somos Igreja", de 1995. A faculdade teológica mais representada entre os signatários é a de Münster, com 17 teólogos, incluindo o decano Klaus Müller; uma teóloga de Münster faz parte do comitê de redação do memorando (cf. M. Drobinski, Theologen gegen den Zölibat, Süddeutsche Zeitung, 3.2.2011). Também uma petição muito específica remete à influência de Münster, a de constituir tribunais administrativos para a Igreja (Klaus Lüdicke). Portanto, o texto poderia tranquilamente ser chamado de "Declaração de Münster" (DM).
Por ocasião da DM, seus signatários indicam o debate público sobre os abusos sexuais que houve no ano passado. Ao procurar por "causas do abuso, do silêncio e da moral dupla", teria "crescido a convicção de que são necessárias reformas profundas". O convite dos bispos ao "diálogo" teria suscitado expectativas que seria preciso acolher. Os teólogos querem fazer de 2011 um "ano de partida" para que a Igreja possa sair de "estruturas fossilizadas". O "diálogo aberto" deve incluir seis "áreas de ação":
(1) São necessárias "mais estruturas sinodais em todos os níveis da Igreja", sob o princípio: "O que afeta todos deve ser decidido entre todos".
(2) A vida da comunidade necessitaria, para sua condução, de estruturas mais democráticas (para sua orientação). "A Igreja também precisa de padres casados e mulheres no ministério eclesial."
(3) Um primeiro passo para alcançar uma "cultura do direito" seria "a criação de uma jurisdição administrativa" (ou seja, de tribunais administrativos).
(4) Com relação ao que chamam de "liberdade de consciência", foi dito: "A alta estima do casamento por parte da Igreja (...) não exige a exclusão de pessoas que vivem responsavelmente o amor, a fidelidade e o apoio mútuo em uma união de pessoas do mesmo sexo [casais homossexuais] ou como divorciados recasados".
(5) No espírito de "reconciliação", seria preciso ir contra "uma moral estrita, sem misericórdia". (
6) A liturgia vive graças à participação ativa dos fiéis e não deveria ser tão unificada de maneira centralista.
Temos de dar a razão aos signatários da DM em que a Igreja (de língua alemã) está passando por uma "crise profunda". Por outro lado, muitas sugestões apresentadas pelos teólogos signatários fazem parte desta crise e não podem favorecer a superação dos problemas. Os pedidos contidos no memorando são, em boa parte, pedidos conhecidos, procedentes dos anos 60 e 70 do século passado. Existe um "passo adiante" nos esforços a favor da práxis vivida da homossexualidade. O debate público sobre os abusos sexuais é instrumentalizado para empurrar uma Igreja enfraquecida para uma situação que se afasta da sua origem apostólica e se aproxima do protestantismo liberal. Segundo as estatísticas, o percentual (deplorável) do abuso sexual pelo clero católico é muito menor comparado ao que acontece nas estruturas (comparáveis) do âmbito secular (por exemplo: famílias, escolas, associações esportivas) e até mesmo com relação ao que se sabe dos pastores protestantes, casados, em sua maioria (cf. J. M. Schwarz, Kirche, Zölibat und Kindesmissbrauch, www.kath.net, 3.2.2010).
Os teólogos da DM cometem um "abuso com o abuso" ao promover petições que certamente não podem combater as causas que estão na base dos próprios abusos. Não se diz que a castidade é necessária para uma verdadeira renovação. Não se fala sequer sobre a exigência da conversão. Pelo contrário: Deseja-se o reconhecimento, por parte da Igreja, da situação dos divorciados novamente casados, que vivem (nas palavras de Jesus) em um estado de adultério (cf. Mc 10,11), e mesmo os casais homossexuais, cuja prática sexual, de acordo com os catálogos dos vícios no Novo Testamento, leva à exclusão do Reino de Deus (cf. 1Cor 6,10).
Aqui não se vê a influência de um conhecimento teológico mais profundo, mas sim uma perda de fé e de moral. Os elementos fundamentais da doutrina apostólica são sacrificados devido a um pensamento que quer estar "a par" da situação atual. A petição de retirar a obrigação do celibato recorda os pedidos do Iluminismo tardio, superados há muito tempo por Johann Adam Möhler e outros protagonistas na renovação católica do século XIX. Nem mesmo aos ilustrados das igrejas estatais da época josefinista, entretanto, teria ocorrido rebaixar os valores do matrimônio cristão ou encorajar o concubinato homossexual.
Inclusive o pedido de ter "mulheres no ministério apostólico" é dirigido contra a origem apostólica da Igreja, pelo menos quando se entende "ministério" no sentido do sacramento da Ordem. Recorde-se aqui a Carta Apostólica de João Paulo II, Ordinatio Sacerdotalis (1994), na qual o Papa sublinha que "a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e esta sentença deve ser considerada definitiva por todos os fiéis da Igreja". O que se aplica a "todos os fiéis da Igreja" vale, provavelmente de maneira mais forte, para os teólogos que têm uma missio canonica.
Vamos dar uma breve olhada em outros pedidos, ainda que não possamos dar aqui uma resposta exaustiva. Certamente é importante uma "participação" de todos os fiéis na vida da Igreja, mas esta participação não deve ser confundida com as formas políticas da democracia. De acordo com a sucessão apostólica, a Igreja é guiada pelo Papa e pelos bispos. No início da Igreja, também os fiéis, muitas vezes, participaram da eleição de bispos por meio do seu testemunho e consentimento: mas estes fiéis foram preparados pelo testemunho dos mártires, na época das perseguições; não era a situação de hoje, em que quase 90% dos "católicos" alemães não vão à Missa no domingo e dependem quase que inteiramente da influência da mídia, a qual, em sua maior parte, é decididamente desfavorável à fé católica.
As eleições episcopais não eram decisões tomadas pelo povo, mesmo na Igreja antiga. Segundo o Papa Leão Magno, o bispo deveria ser eleito pelo clero, aclamado pelo povo e ordenado pelos bispos da província, com o consentimento do Metropolitano. O princípio jurídico citado pela DM vem originalmente do direito romano privado e foi interpretado em 1958 por Yves Congar, no sentido da recepção dentro da Igreja, mas não como democratização do Magistério nem do ministério de guia (Quod omnes tangit, ab omnibus tractari et approbari debet); explicar o consentimento do povo de Deus como "decisão" ou inclusive como base de "estruturas mais sinodais" é sinal de uma ideologização fora da história eclesial.
O que se afirma sobre a questão das "paróquias XXL" refere-se a uma dolorosa realidade. A solução das dificuldades não está em mudar as estruturas da Igreja, procedentes de Cristo (como o sacerdócio ministerial reservado aos homens e sua responsabilidade específica para a guia da comunidade). Para organizar bem a vida das comunidades, é necessária a prudência pastoral e o compromisso de todos, mas não uma laicização na guia de das comunidades paroquiais. A "liberdade de consciência" proclamada na DM separa claramente a consciência do sujeito da verdade objetiva à qual a consciência deve se orientar. Não faz sentido aplicar a "liberdade de consciência" para aprovar os casais do mesmo sexo e o adultério. Newman falaria aqui de um pretendido "direito à voluntariedade" (Carta ao Duque de Norfolk). A "misericórdia" na moral, mencionada sob a voz da "reconciliação", não deve se separar da necessidade de respeitar os mandamentos de Deus: Deus perdoa o pecador sinceramente arrependido, mas lhe dá a entender também (como Jesus à adúltera): "De agora em diante, não peques mais" (Jo 8, 11).
A petição da DM de integrar as "experiências e expressões da época contemporânea" na liturgia já tem seu lugar conveniente no atual ordenamento - por exemplo, na oração dos fiéis e na homilia. O acolhimento de "situações concretas da vida" não deve obscurecer a importância da liturgia como glorificação de Deus, juntamente com toda a Igreja, que proporciona formas muito precisas para a expressão comum.
Certamente, é preciso elogiar o "diálogo" dentro da Igreja. Para um debate legítimo entre cristãos católicos, entretanto, deve estar claro o pré-requisito presente na profissão comum da fé católica. Diversos pontos da DM questionam essa base. Os signatários da DM podem sinceramente apresentar a Professio fidei exigida como condição indispensável para ensinar, em nome da Igreja, nas faculdades de teologia? Os bispos responsáveis terão a coragem de insistir contra a dissidência sobre o caráter eclesial da teologia? A próxima visita do Santo Padre à Alemanha será uma grande oportunidade para uma renovação na fé católica. O memorando dos 143 teólogos, porém, entristece: não oferece nenhuma contribuição para lançar-se rumo a um futuro cheio de esperança, mas sim uma demolição põe em perigo o tesouro da fé eclesial.
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Iniciativa dos teólogos alemães: renovação ou demolição? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU