25 Janeiro 2011
O bispo aposentado Samuel Ruiz Garcia, conhecido como o lutador a favor dos pobres e indígenas no sul do México, morreu de complicações decorrentes de doenças de longa data no dia 24 de janeiro. Ele tinha 86 anos.
Samuel Ruiz dirigiu a diocese de San Cristobal de Las Casas, de 1960 a 2000, e, de 1994 a 1998, mediou uma comissão pelo fim pelo conflito entre o governo mexicano e o Exército Zapatista de Libertação Nacional, no estado de Chiapas.
A reportagem é de David Agren, publicada no Catholic News Service, 25-01-2011. A tradução é de Anne Ledur e revisada pela IHU On-Line.
Por seu trabalho com a população indígena do estado de Chiapas, ele recebeu ameaças de morte e, em 2002, foi ganhador do Prêmio da Paz Niwano por ajudar a "melhorar a situação social das comunidades indígenas do México" e por seu trabalho no sentido da "recuperação e preservação de suas culturas nativas".
"DonmSamuel era como o profeta Jeremias, um homem que viveu e experimentou contradição", disse Raúl Vera López, bispo de Saltillo, que serviu como bispo-auxiliar de Ruiz, de 1995 a 1999.
Vera, na missa pelo bispo Ruiz, em 24 de janeiro, na Cidade do México, descreveu Dom Ruiz como "uma pessoa cujas ações foram discutidas e condenadas por um setor da sociedade, mas, para os pobres e para aqueles que trabalharam com ele, foi uma luz brilhante, que cumpriu o que Deus disse ao profeta: `Este dia eu te coloco sobre as nações e sobre os reinos, para arrancar, para destruir, derrubar... para construir e plantar`".
Políticos, jornalistas de destaque e até mesmo um grupo de campesinos empunhando facões estampados com o nome de Dom Samuel Ruiz participaram da missa na Cidade do México. Uma missa funeral será celebrada no dia 26 de janeiro, em Tuxtla Gutierrez, com a presença do núncio apostólico, Dom Christophe Pierre.
A notícia da morte de Dom Ruiz foi manchetes em todo o país, porque ele era bem conhecido por sua defesa dos direitos humanos e trabalho de mediação em Chiapas. Mais recentemente, ele participou de uma comissão servindo como canal entre os rebeldes do Exército Revolucionário do Povo e do Ministério do Interior sobre a questão de desaparecimentos forçados.
O presidente mexicano, Felipe Calderón, disse que a morte do bispo Ruiz "constitui uma grande perda para o México."
"Samuel Ruiz batalhou para construir um México mais justo, igualitário, digno e sem discriminação, e que para que as comunidades indígenas tenham uma voz e seus direitos e liberdades respeitados por todos", disse o presidente em uma declaração.
A secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, em visita ao México no dia 24, disse: "Meus colegas dizem que ele era um mediador incansável que procurou a reconciliação e a justiça através do diálogo, e isso é exatamente o legado que devemos honrar e o exemplo que todos devemos seguir".
Ruiz sofria de hipertensão arterial e diabetes há uma década e tinha artérias obstruídas, algum dano cerebral e dificuldade de movimentar seu corpo. A gravidade de sua doença levou à sua transferência no dia 12 de janeiro para um hospital da Cidade do México a partir de um, no estado de Queretaro, conforme informou um membro da sua equipe médica à CNN.
Ruiz participou de todas as sessões do Concílio Vaticano II. Tom Quigley, ex-conselheiro de política na América Latina para a Conferência dos Bispos Católicos dos EUA, disse que o bispo Ruiz se tornou mais conhecido internacionalmente através de sua participação ativa em 1968, na segunda Conferência Geral do Episopado Latino-americano, em Medellín.
"Ele era um bispo de nenhum lugar, mas tornou-se conhecido... e se tornou o centro de um caso terrível que estava acontecendo na América Latina", disse Quigley.
Em 1960, Ruiz começou a falar contra as leis Chiapas não escritas - como as que proíbem índios andar pelas ruas depois do anoitecer e - até mesmo no início dos anos 1970 - forçando-os a descer as calçadas da cidade pela sarjeta, sempre que não-índios se aproximam.
"Dom Samuel chegou em Chiapas atormentado pelas injustiças e abusos cometidos contra os povos indígenas e os pobres", disse Vera.
"Ele viu com seus próprios olhos as costas dos homens indígenas marcadas pelos chicotes dos senhores de engenho", que pagavam "três centavos por dia", e os trabalhadores eram forçados a comprar nas lojas da companhia, por preços inflacionados, afirmou Vera.
"Ele também conhecia mulheres indígenas submetidas à `lei da primeira noite`, em que os patrões tiravam a virgindade das jovens mulheres em sua contratação”, disse Vera.
Ruiz disse que sua fé o conduziu a examinar as raízes da injustiça e levou seus escritos sobre a exploração dos nativos americanos e sua pesquisa para a cosmologia indígena e teologia. No entanto, suas declarações contra a classe dos senhores poderosos foram interpretadas por alguns - incluindo alguns no Vaticano - como originário da teoria marxista de classe, ao invés do Evangelho.
Durante a visita do Papa João Paulo II de 1990 no México, os proprietários de terras publicaram uma carta aberta, acusando Ruiz de ser comunista e fomentando o ódio de classe.
Ruiz aprendeu a falar quatro idiomas maias e, muitas vezes, percorria por mulas através da sua diocese, onde era carinhosamente chamado Dom Samuel ou "Tata", que significa pai em uma língua maia.
Samuel Ruiz Garcia nasceu 3 de novembro de 1924, em Irapuato, no México. Ele foi ordenado sacerdote em 1949, após estudos na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma. Serviu como um reitor de seminário em Leon, no México, e foi consagrado bispo em 1960.
Em seu 75º aniversário, ele disse a quase 2 mil pessoas, que lotaram a catedral diocesana, que ele era grato a Deus por lhe ser permitido servir a diocese por quase 40 anos, e que ele tinha aprendido muito com os povos indígenas.
"Eu posso dizer que eu sou a mesma pessoa, mas que eu não sou o mesmo", disse ele. "O bispo que chegou aqui foi deixado para trás, evoluiu".
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Samuel Ruiz, bispo dos pobres e indígenas - Instituto Humanitas Unisinos - IHU