22 Setembro 2023
Em 15 de maio de 2023, Lucas Ferrante e Philip Martin Fearnside publicaram um artigo na revista científica Journal of Racial and Ethnic Health Disparities com o título “Crise de oxigênio na Amazônia brasileira: Como vidas e saúde foram sacrificadas durante o pico da COVID-19 para promover uma agenda com consequências de longo prazo para o meio ambiente, os povos indígenas e a saúde”, disponível aqui. Esta série traz uma tradução em português deste estudo.
O artigo é de Lucas Ferrante e Philip Martin Fearnside, publicado por Amazônia Real, 20-09-2023.
Lucas Ferrante é doutor em Biologia (Ecologia) pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e atualmente é pós-doutorando na Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Foi primeiro autor de notas em Science e Nature Medicine sobre o impacto de COVID-19 na Amazônia, inclusive em povos indígenas, e coordenou o grupo formado a pedido do Ministério Público-AM sobre o COVID-19 em Manaus. Tem pesquisado agentes do desmatamento, buscando políticas públicas para mitigar conflitos de terra gerados pelo desmatamento, invasão de áreas protegidas e comunidades tradicionais, principalmente sobre Terras indígenas e Unidades de Conservação na Amazônia.
Philip Martin Fearnside é doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan (EUA) e pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus (AM), onde vive desde 1978. É membro da Academia Brasileira de Ciências. Recebeu o Prêmio Nobel da Paz pelo Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), em 2007. Tem mais de 750 publicações científicas e mais de 700 textos de divulgação de sua autoria que estão disponíveis aqui.
Em janeiro de 2021 suprimentos de oxigênio na maior cidade da região amazônica se esgotaram no auge da segunda onda da epidemia de COVID-19, chocando o mundo com a morte de pacientes hospitalares por falta desse recurso médico básico em Manaus, que durante a primeira onda de COVID-19 tornou-se a primeira cidade do mundo a enterrar seus mortos em valas comuns. As autoridades brasileiras usaram essa tragédia para promover uma agenda política que implica enormes consequências ambientais e de direitos humanos. O transporte de oxigênio foi usado para promover a construção de uma estrada que, juntamente com as estradas vicinais planejadas, daria aos desmatadores acesso a grande parte do que resta da Floresta Amazônica brasileira.
Aqui demonstramos que a estratégia logística adotada pelos Ministérios da Saúde e Infraestrutura do governo Jair Bolsonaro para levar oxigênio a Manaus foi a pior escolha possível, e a previsível demora na chegada do oxigênio custou centenas de vidas. Em vez de enviar caminhões para transportar oxigênio na quase intransitável rodovia BR-319 durante a estação chuvosa, a opção de transporte mais adequada eram as barcaças no Rio Madeira. À medida que os suprimentos de oxigênio diminuíam em Manaus, as famílias das vítimas do COVID-19 mais ricas se esforçavam para comprar os poucos cilindros restantes a preços fora do alcance dos estratos econômicos mais pobres (e muitas vezes etnicamente distintos). Disparidades étnicas de saúde são agravadas tanto pelas consequências diretas da crise do oxigênio quanto, ao longo prazo, pelas consequências do projeto da rodovia que avançou materialmente pelo uso político da crise. [1]
[1] Esta série traduz o trabalho Ferrante, L. & P.M. Fearnside. 2023. Brazil’s Amazon oxygen crisis: How lives and health were sacrificed during the peak of COVID-19 to promote an agenda with long-term consequences for the environment, indigenous peoples and health. Journal of Racial and Ethnic Health Disparities. Os autores foram apoiados pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (CAPES) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM).
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Vidas sacrificadas na crise de oxigênio de Manaus para promover a BR-319: 1 - Resumo da série - Instituto Humanitas Unisinos - IHU