26 Julho 2023
“A Espanha termina o dia dando um exemplo à Europa e ao mundo de que apesar dos meios de comunicação mais poderosos insistirem em apoiar as forças ultraliberais e edulcorar a extrema direita, quando os cidadãos se mobilizam para defender seus direitos e sua liberdade, é possível detê-los”, aponta o editorial de Ctxt, 24-07-2023. A tradução é do Cepat.
Rompendo os presságios de todas as pesquisas divulgadas pelos meios de comunicação da direita – apenas os insultados Tezanos e 40dB se aproximaram do resultado –, Pedro Sánchez, as forças do Governo de coalizão (PSOE+SUMAR) e seus parceiros plurinacionais conseguiram impedir o anunciado triunfo da aliança entre a direita trumpista e a extrema direita, que soma 169 cadeiras, a sete das 176 necessárias.
Com 99% dos votos apurados, o PP vence as eleições com 136 cadeiras (tinha 89, em 2019), e o PSOE resiste em segundo lugar com 122 deputados. Longe de afundar, Sánchez consegue duas cadeiras a mais do que tinha em 2019. A diferença entre os dois grandes partidos é mínima: 1,5 ponto e 300.000 votos, em um total de mais de 15,5 milhões de votos.
Assim, parece claro que o PP não atingirá o seu objetivo principal: retirar Sánchez do Palácio da Moncloa, o que significa um fracasso total para Alberto Núñez Feijóo, que certamente paga por uma segunda semana de péssima campanha, na qual mentiu repetidamente, desprezou os cidadãos ao se recusar a debater na TV pública e demonstrou traços machistas e autoritários. Ainda que não esteja claro que a esquerda conseguirá forjar uma maioria suficiente para tomar posse, já que o Junts aparece como crucial para vencer por mais sim do que não na segunda votação, as forças progressistas terão mais opções de evitar um possível bloqueio do que o PP.
As eleições gerais deixam um cenário de concentração do voto entre os dois grandes partidos nacionais, que respondem por 67% do total de votos, frente aos 48% que somaram em 2019. Uma das razões é o desaparecimento de Ciudadanos e a outra é a melhor notícia do dia: o declínio da extrema direita, que passa de 15%, em 2019, para os atuais 12%, e perde 19 de seus 52 deputados.
O bipartidarismo também se beneficia da perda de apoio do Sumar, plataforma herdeira de Unidas Podemos, que obteve 2,95 milhões de votos (12%) e 31 deputados, frente aos 38 deputados e 3,7 milhões de votos que as mesmas forças separadas alcançaram há 4 anos. A soma de siglas estabelecida por Yolanda Díaz fecha sua primeira disputa eleitoral sem ter conseguido superar o Vox como terceira força, nem em votos, nem em cadeiras, embora permaneça com menos de 23.000 votos. O resultado em Madri é especialmente doloroso, já que Sumar perde três pontos, em relação a 2019, e é melhor na Catalunha: segunda força depois de um PSC avassalador.
A campanha (espetacular, inesperada, contundente) do ex-presidente Zapatero e a atuação corajosa e temperada do próprio Pedro Sánchez, que com audácia decidiu antecipar as eleições, após o desastre das eleições regionais de maio, conseguiram mobilizar o eleitorado socialista e deter as anunciadas evasões para ao PP. Sánchez voltou a demonstrar que é um candidato muito difícil de bater quando tudo parece estar contra ele e, sobretudo, quando todos o consideram morto.
Estes são, certamente, os dois fatores positivos que mais contribuíram para que a centro-esquerda tenha resistido à ofensiva trumpista lançada por Feijóo e seus meios afins, que na ausência de um projeto político apostaram tudo na mentira e na desqualificação, alguns usando as piores artes do jornalismo corrupto e outros as artimanhas da política mais baixa.
As alianças para governar comunidades autônomas com o Vox e as primeiras medidas anunciadas (censuras, aumentos salariais, eliminação de símbolos LGBT e o negacionismo da violência machista) também foram gasolina para boa parte do eleitorado de esquerda, que parecia indeciso ou desmotivado, como indica o fato de a participação final ter ultrapassado os 70%.
O resultado ajustado entre os dois blocos ideológicos leva agora os 11 partidos que obtiveram representação parlamentar a algumas semanas de negociações. O PP anunciou, após a recontagem, que Feijóo se apresentará para tentar formar governo. Contudo, os números, exceto por uma surpresa capital, simplesmente não parecem ser suficientes. Com a UPN e talvez a Coalizão Canária, as direitas somariam 171 deputados. Contudo, não parece previsível que o PNV e Junts possam oferecer seus votos a um Governo com Vox.
Do outro lado, PSOE e Sumar precisarão do apoio explícito de ERC, Bildu, PNV e BNG, e da abstenção de Junts para tomar posse. Por enquanto, é um alívio que Feijóo, o suposto amigo moderado do narcotráfico, aliado descarado da extrema direita e certamente o candidato mais mentiroso que já se apresentou nas eleições na Espanha, só possa comemorar uma vitória estéril, que supõe uma grande notícia para a democracia e para a Europa.
Nesses quatro anos, o governo de coalizão liderado pelo sanchismo e por UP, e apoiado pelos seus parceiros plurinacionais, trouxe ao país muito mais benefícios do que problemas e uma alternativa azul e parda, como se está comprovando em comunidades autônomas e municipalidades, não augurava nada de bom. A Espanha termina o dia dando um exemplo à Europa e ao mundo de que apesar dos meios de comunicação mais poderosos insistirem em apoiar as forças ultraliberais e edulcorar a extrema direita, quando os cidadãos se mobilizam para defender seus direitos e sua liberdade, é possível detê-los.
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Espanha. A esquerda plurinacional resiste ao trumpismo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU