03 Janeiro 2022
Contemplar o mistério do Natal voltando o próprio olhar para Belém e imaginando a nós mesmos diante da manjedoura, para assim nos colocarmos a serviço e em “colóquio interior” com Maria, José e o Menino Jesus. Essa é a imagem sugestiva com que Inácio de Loyola (1491-1556), nos Exercícios Espirituais (parágrafos 111-117), exorta a redescobrir o sentido da Natividade. Trata-se de um convite do santo basco que visa a experimentar em uma autêntica “composição de lugar” a mesma admiração sentida pelos pastores diante da visão da cabana onde Jesus nasceu há mais de 2.000 anos.
A reportagem é de Filippo Rizzi, publicada em Avvenire, 30-12-2021. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Recentemente, o jesuíta Enrico Cattaneo abordou esse assunto na revista da Companhia de Jesus La Civiltà Cattolica, refletindo sobre o tema: “O Natal com Inácio de Loyola, leitor da ‘Vita Christi’”. O artigo do religioso inaciano, ex-professor de Patrologia na Pontifícia Faculdade da Itália Meridional (seção San Luigi) de Nápoles e no Pontifício Instituto Oriental de Roma, também foi concebido à luz de um importante jubileu: os 500 anos da conversão de Inácio após o ferimento em Pamplona, ocorrida em 20 de maio de 1521. O Ano Inaciano, inaugurado em 20 de maio passado em Pamplona, se encerrará em 31 de julho próximo, em Roma, na memória litúrgica dedicada ao fundador dos jesuítas.
Inácio de Loyola recebe o Menino Jesus em seus braços. Pintura de Tommaso Missiroli, sécolo XVII. Pinacoteca Comunale di Faenza (Foto: Avvenire)
O coração das reflexões do Pe. Cattaneo não são apenas as fontes inacianas sobre o Natal, mas também a obra “Vita Christi” do grande escritor asceta dominicano e depois cartuxo Ludolfo da Saxônia (1295-1377). “Muito do que Inácio experimentou nos Exercícios e nos seus colóquios interiores com o Senhor – diz o estudioso ao Avvenire – encontra a sua dívida nos escritos de Ludolfo”.
E observa: “Na sua Autobiografia, o próprio Inácio explica que chegou a ler os três grandes volumes da ‘Vita Christi’ de Ludolfo da Saxônia. Forçado a ficar na cama devido a uma fratura na perna, ele se entediava em ficar sem fazer nada. Então, pediu livros para ler, possivelmente livros de aventuras cavalheirescas (Inácio ainda era um homem do mundo), mas, na casa do seu irmão, havia apenas livros religiosos, uma Vida de Cristo e as Vidas dos santos. Ele os leu mais para passar o tempo do que por interesse de verdade, mas foi justamente a partir dessa leitura que veio a sua conversão.”
O convite sugerido pelos dois grandes escritores ascetas Inácio e Ludolfo é entrar no mistério da Natividade quase com os olhos de uma criança que perscruta a “magia do presépio”. “A Vita Christi de Ludolfo da Saxônia é uma espécie de ‘Suma’ da vida cristã a partir dos Evangelhos. Com efeito, os Exercícios têm como rastro os Evangelhos, da Natividade à Ressurreição. Com Ludolfo, Iñigo aprende sobretudo aquela que foi chamada de ‘composição do lugar’, ou seja, imaginar a cena que estou meditando – neste caso, poderíamos pensar no nosso Natal – em todos os seus detalhes, de modo a me fazer partícipe do evento.”
O Pe. Cattaneo menciona outro aspecto: o íntimo significado do Natal que revela já dentro de si mesmo o mistério do “patíbulo à Cruz”. Mas também que o anúncio do nascimento do Filho do homem foi dirigido acima de tudo aos pobres e aos simples.
“Ludolfo e consequentemente Inácio veem no nascimento de Jesus o Senhor dos Senhores, o Rei dos reis, os sinais da humildade de Deus, para que os pastores não tivessem medo de se aproximar dele. Isso vale para todos, também para nós. É o que o Papa Francisco continua nos repetindo com o seu magistério: não tenham medo de se aproximar do Senhor, que não afugentará vocês, porque veio para lhes salvar. Basta pensar no canto dos anjos: ‘Glória a Deus e paz aos homens’. Talvez devamos, acima de tudo, fazer as pazes com Deus, a quem acusamos neste momento difícil também por causa da Covid-19.”
Outra sugestão que vem desses textos é aprender a contemplar o Natal com outros olhos. “Ludolfo, por exemplo, exorta idealmente a entrar na manjedoura, a se colocar aos pés do Menino e a ‘rogar a Nossa Senhora que o entregue a ti e te permita tomá-lo nos braços e beijá-lo com respeito...’.”
Outra exortação, enfim, depois da contemplação, é a de aprender a rezar. “Santo Inácio certamente tirou daí a sugestão de terminar cada Exercício com um ‘colóquio’, ora com Nossa Senhora, para que interceda junto ao seu Filho, ora com o próprio Senhor, para que interceda junto do Pai. Ele chama isso de ‘colóquio’, porque deve ser ‘como um amigo que fala com um amigo’, ‘ora pedindo alguma graça, ora pedindo perdão, ora comunicando as próprias coisas e pedindo conselhos sobre elas’. E, para o Natal, o pedido é que ‘renasça em mim a santidade de uma vida nova’.”
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O Natal segundo Santo Inácio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU