10 Novembro 2021
A partir do relato da esmola da viúva, a reflexão do Papa Francisco no domingo no Angelus. No final, a preocupação com a crise no Chifre da África, em particular na Etiópia, e o apelo à beatificação, no sábado passado, na Espanha, de três frades capuchinhos mártires da guerra civil espanhola. Em seguida, entre os italianos, uma saudação aos fiéis de Prato e Foligno e aos garotos da Profissão de Fé de Bresso. Aqui estão as palavras do Papa antes da oração mariana.
A reflexão do Angelus do Papa Francisco foi publicada por Avvenire, 07-11-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Caros irmãos e irmãs, bom dia!
A cena descrita pelo Evangelho da liturgia hodierna se passa dentro do Templo de Jerusalém. Jesus olha, olha o que acontece neste lugar, o mais sagrado de todos, e vê como os escribas gostam de passear para serem notados, cumprimentados, reverenciados e ter lugares de honra. E Jesus acrescenta que “devoram as casas das viúvas e para disfarçar fazem longas orações” (Mc 12,40).
Ao mesmo tempo, seus olhos avistam outra cena: uma pobre viúva, justamente uma daquelas exploradas pelos poderosos, coloca na caixa de ofertas do Templo "tudo o que possuía para viver" (v. 44). Assim diz o Evangelho, ela coloca tudo o que possuía para viver na caixa de ofertas. O Evangelho apresenta-nos esse contraste marcante: os ricos, que dão o que é supérfluo para serem vistos, e uma mulher pobre que, sem aparecer, oferece tudo o que tem. Dois símbolos de atitudes humanas. Jesus olha as duas cenas. E é precisamente este verbo - “olhar” - que resume o seu ensinamento: de quem vive a fé com duplicidade, como aqueles escribas, “devemos nos guardar” para não nos tornarmos como eles; enquanto a viúva devemos "olhá-la" para tomá-la como modelo.
Detenhamo-nos nisto: guardar-se dos hipócritas e olhar para a pobre viúva. Em primeiro lugar, guardar-se dos hipócritas, isto é, ter cuidado para não basear a vida no culto da aparência, da exterioridade, no cuidado exagerado pela própria imagem. E, acima de tudo, ter cuidado para não dobrar a fé aos nossos interesses. Aqueles escribas cobriam sua própria vanglória com o nome de Deus e, pior ainda, usavam a religião para cuidar de seus interesses, abusando de sua autoridade e explorando os pobres. Aqui vemos aquela atitude tão ruim que inclusive hoje vemos em muitos lugares, em muitos lugares, o clericalismo, este estar acima dos humildes, explorando-os, “fazendo pouco deles”, sentindo-se perfeitos. Esse é o mal do clericalismo.
É um aviso para todo tempo e para todos, Igreja e sociedade: nunca aproveitar do próprio papel para esmagar os outros, nunca tirar proveito nas costas dos mais fracos! E vigiar, para não cair na vaidade, para que não nos aconteça de nos fixarmos nas aparências, perdendo a substância e vivendo na superficialidade. Perguntemo-nos: nos ajudará no que dizemos e fazemos; queremos ser apreciados e gratificados ou prestar um serviço a Deus e ao próximo, especialmente aos mais frágeis? Vigiemos sobre as falsidades do coração, sobre a hipocrisia, que é uma doença perigosa da alma! É um pensar duplo, um julgar duplo, como diz a própria palavra: “julgar sob”, aparecer em um modo, e “hipo”, embaixo, ter outro pensamento. Duplos, pessoas com a alma dupla, duplicidade da alma.
E para nos curar dessa doença, Jesus nos convida a olhar para a pobre viúva. O Senhor denuncia a exploração dessa mulher que, para fazer a oferta, deve voltar para casa sem nem mesmo o pouco que tem para viver. Como é importante libertar o sagrado dos laços com o dinheiro! Jesus já o havia dito, em outro lugar: não se pode servir a dois senhores. Ou você serve a Deus - e pensamos que ele vai dizer "ou ao diabo", não - ou Deus ou ao dinheiro. Ele é o senhor e Jesus diz que não devemos servi-lo. Mas, ao mesmo tempo, Jesus elogia o fato de que essa viúva coloca tudo o que tem na caixa de ofertas. Não fica com mais nada, mas encontra em Deus o seu tudo. Ela não tem medo de perder o pouco que tem, porque confia no muito de Deus, e esse muito de Deus multiplica a alegria de quem doa.
Isso também nos faz pensar naquela outra viúva, a do profeta Elias, que estava prestes a fazer um pão com a última farinha que tinha e o último azeite; Elias diz a ela: “Dá-me de comer” e ela dá; e a farinha nunca diminuirá, um milagre (cf. 1Reis 17.9-16). O Senhor sempre, diante da generosidade das pessoas, vai além, é mais generoso. Mas é Ele, não a nossa avareza. Eis então que Jesus a propõe como mestra de fé, esta senhora: ela não frequenta o Templo para acalmar sua consciência, não reza para ser vista, não ostenta a fé, mas doa com o coração, com generosidade e gratuidade. Suas moedinhas têm um som mais agradável do que as grandes ofertas dos ricos, porque expressam uma vida dedicada a Deus com sinceridade, uma fé que não vive de aparências, mas de confiança incondicional. Aprendamos com ela: uma fé sem adereços exteriores, mas interiormente sincera; uma fé feita de amor humilde por Deus e pelos irmãos. E agora vamos nos dirigir à Virgem Maria, que com o coração humilde e transparente fez de toda a sua vida um dom por Deus e para o seu povo.
Francisco
(Mapa do Chifre da África | Reprodução)
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O risco de cair no culto da aparência - Instituto Humanitas Unisinos - IHU