01 Setembro 2021
Um texto curto, mas deliberadamente publicado na primeira página do Osservatore Romano. Mesmo sem citá-lo diretamente, é a resposta que o Vaticano através do respeitado teólogo argentino Victor Manuel Fernandez, arcebispo de La Plata muito próximo do Papa, dá ao rabino Rasson Arousi que pediu esclarecimentos sobre afirmações que Francisco fez na catequese, de 11 de agosto passado.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada por La Repubblica, 30-08-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.
Rasson Arousi disse estar "preocupado" porque algumas das palavras do Papa pareceriam sugerir que a lei judaica está obsoleta. Fernandez responde que as palavras do Papa, tiradas de São Paulo, na realidade reproduzem convicções profundas de algumas tradições judaicas. Também para os judeus, a salvação vem do cumprir a Lei, mas com a ajuda de Deus. A emuná - atitude de confiança em Yahweh que ativa o cumprimento da Lei - está no centro da Torá. Mesmo no judaísmo não há autossuficiência diante de Deus. A única lei externa sem a obra purificadora de Deus para judeus e cristãos não pode mudar o homem.
Victor Manuel Fernandez é próximo de Francisco desde os tempos de Buenos Aires. Na Argentina, ele sempre o aconselhou nas questões teológicas mais espinhosas. Durante anos foi reitor da Universidade Católica da Argentina, depois promovido a La Plata. Para Fernandez, "quando São Paulo fala da justificação pela fé, ele está na realidade retomando profundas convicções de algumas tradições judaicas". “Porque - continua – caso se afirmasse que a própria justificação se obtém através do cumprimento da Lei com as próprias forças, sem ajuda divina, estaria se caindo na pior das idolatrias, que consiste em adorar a si mesmo, as próprias forças e as próprias obras, em vez de adorar o único Deus".
Explica Fernandez que “é imprescindível lembrar que alguns textos do Antigo Testamento e muitos textos hebraicos extrabíblicos já mostravam uma religiosidade da confiança no amor de Deus e convidavam a um cumprimento da lei ativado nas profundezas do coração pela ação divina". "Um eco recente dessa antiga convicção judaica, que renuncia à autossuficiência diante de Deus, pode ser encontrado na seguinte frase do Rabino Israel Baal Shem Tov (início do século XIX): 'Temo muito mais as minhas boas ações que me produzem prazer do que aquelas más que me produzem horror”.
Segundo o bispo argentino, “as tradições judaicas também reconhecem que, para cumprir integralmente a Lei, é necessária uma mudança que comece nos corações”. Ele escreve: “Cristãos e judeus não dizemos que o que vale é o cumprimento exterior de determinados costumes sem o impulso interior de Deus. A teologia judaica coincide na realidade com a doutrina cristã neste ponto, especialmente se partirmos da leitura de Jeremias e Ezequiel, onde aparece a necessidade de uma purificação e de uma transformação do coração. Como não ver em Rm 2, 28-29 uma continuação e aprofundamento de Jr 4,4; 9,24-25? Judeus e cristãos reconhecemos que a única lei externa não nos pode mudar sem a obra purificadora e transformadora de Deus (Ez 36,25-27), que por nós já começou a fazer-se presente no seu Messias (Gl 2,20-21)".
E conclui: "Por outro lado, lembremo-nos que, segundo a interpretação muito profunda de Santo Agostinho e de Santo Tomás sobre a teologia paulina da lei nova, a esterilidade de uma lei externa sem a ajuda divina não é apenas uma característica da Lei judaica, mas também dos preceitos que o próprio Jesus nos deixou: 'até a letra do Evangelho mataria se não tivesse a graça interior da fé, que cura'".
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A resposta do Vaticano ao Rabino Rasson Arousi: “Mesmo para os judeus, a salvação vem do cumprimento da Lei...” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU