04 Novembro 2020
O estudo da Filosofia anda em declínio desde o século passado. Seus principais pensadores e os estudos produzidos por eles são da década passada. As transformações sociais ocorridas no mundo deixaram a filosofia em desuso e recriaram as ideologias populistas e fascistas de momentos anteriores e se impregnaram nos ideais da massa, dando espaço para o que os especialistas denominaram de pós-verdade e fake news.
A reportagem é de André Martins, estagiário do Curso de Jornalismo da Unisinos.
Para o filósofo Rossano Pecoraro, professor de filosofia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, a filosofia está atualmente falida e prestes a implodir, sem nenhum sinal de melhora e incapaz de guiar o mundo para outro paradigma social. “Não precisa de uma análise hermenêutica para ver a falência da filosofia em nossos tempos”, afirma.
A morte da filosofia pós-moderna foi o tema da palestra “A filosofia do século XXI. A necessidade de uma nova racionalidade e de outra ética”, nesta quinta-feira, 29-10-2020, em evento promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, na qual Pecoraro foi o palestrante.
Pecoraro, durante a sua fala, explicou os principais motivos que levaram ao colapso da filosofia. Para ele, a culpa é da própria filosofia, que se deixou afundar pela pós-verdade e pelas transformações políticas que ocorreram no último século. Enquanto conceitos filosóficos centrais foram criminalizados, a própria filosofia se absteve de um pensamento contemporâneo e abandonou o trabalho que foi feito há séculos. “O pensamento contemporâneo jogou fora o bebê junto com a água suja do banho”, critica, em alusão à falência do saber crítico e ao crescimento de um populismo autoritário com aversão ao pensamento filosófico.
A filosofia viveu o ápice no século passado, após a Segunda Guerra Mundial, com o crescimento do pensamento filosófico, como, por exemplo, a Escola de Frankfurt. Mas na visão de Pecoraro, após o encerramento dessa era de pensadores, os novos filósofos não se adequaram a um pensamento histórico e crítico, e deram início a um processo de ridicularização da filosofia, que em alguns anos levou a atual situação de falência. “Ao invés de corrigir ou formular de maneira inédita questões e problemas das nossas tradições, a filosofia abandonou a luta e se denomina fraca”, comenta.
Para Pecoraro, a crise na filosofia começa mesmo no século XX, quando a maioria das narrativas predominantes da cultura daquele momento já sentenciava a sua morte, se afundando em uma crise de identidade. Naquele momento, eram duas as áreas filosóficas trabalhadas: um discurso póstumo da imitação e da pura e simples análise textual, e a multiplicação dos discursos, que dava vida a uma geografia e não a uma história. “Um dos grandes medos da filosofia contemporânea era o de ser taxada de unitária ou de escrever de um ‘tijolão filosófico’, reitera.
A pós-modernidade é consequência da crise filosófica, no ponto de vista de Pecoraro. Expressão criada por universidades europeias na década de 1980 e 1990, a pós-modernidade foi um título adotado quase do nada por professores para designar um momento histórico que teve um forte impacto sociocultural. O fenômeno da pós-modernidade, segundo Pecoraro, foi o criador da proliferação das fake news e das principais causas que ajudaram a acabar com a filosofia contemporânea. “É um fenômeno decisivo, uma vez que a proliferação das narrativas digitais, o assassinato para qualquer critério de validade dos discursos e a produção de fake news, nada mais é do que uma criação pós-moderna”, assegura.
As ideias que vieram da pós-modernidade se impregnaram na contemporaneidade e tiveram êxito para penetrar no mundo e ecoarem fortemente na opinião pública. Para Pecoraro, a filosofia questiona, pergunta e duvida, mas na comunidade filosófica em geral, se priorizam algumas convicções. “A primeira convicção é a de que a filosofia é qualquer coisa. A segunda é que ela se ocupa com qualquer assunto temático. E a terceira é que a sua tarefa é dar respostas ou soluções a temas já dados”, diz.
Pecoraro entende que a filosofia é o “mestre das perguntas” e o pensar no agora. “A filosofia é o mestre da ação e não da reação”, adverte. Entretanto, hoje a filosofia é incapaz de dar uma orientação e isso se deve a sua incapacidade de mudança social e política, além da sua atual capacidade estrutural e sistêmica. O que se fazer então? Pecoraro sugere: “O ponto de partida deve ser o de pensar o presente. O futuro não tem muita relevância nem deve interessar à filosofia”.
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A filosofia está falida e a culpa é dela própria. Seu desafio é pensar o presente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU