12 Março 2020
Toneladas de plásticos de todos os tipos acabam no mar, criando em algumas áreas ilhas artificiais de resíduos. Em contato com a água e expostos à luz solar, esses polímeros se degradam liberando aditivos prejudiciais ao meio ambiente.
A pesquisadora Cristina Romera (Jaén, 1982) é responsável, no Instituto de Ciências do Mar (CSIC), em Barcelona, por analisar as condições que favorecem a migração desses compostos orgânicos dos microplásticos para o mar.
Por isso, a cientista acaba de obter a bolsa International Rising Talent do programa L'Oréal-UNESCO For Women in Science.
Com este prêmio, foi selecionada como uma das 15 jovens pesquisadoras mais promissoras do mundo. “Estou muito feliz porque a carreira científica é muito difícil e muitas vezes não vemos nosso trabalho reconhecido. Isto é uma motivação para continuar”, conta a SINC.
O reconhecimento dá visibilidade não apenas ao seu trabalho, mas também ao problema da poluição por plásticos no mar. “Além disso, conscientiza a sociedade”, enfatiza.
A entrevista é de Adeline Marcos, publicada por Agência SINC, 11-03-2020. A tradução é do Cepat.
Milhões de toneladas de plásticos navegam à deriva no mar. O que realmente acontece quando atingem os oceanos?
O plástico não é puro, possui aditivos, e quando em contato com a água, começa a liberar esses compostos. Mesmo com a degradação, é liberado o monômero - molécula simples - do plástico, que forma os polímeros.
Em um artigo publicado na Nature Communications, mostramos que todos os anos são liberadas 23.600 toneladas de carbono orgânico desprendido do plástico que entra no mar.
O que acontece depois?
Vimos que existem bactérias marinhas que o consomem, e isso faz com que se reproduzam mais rápido. Agora, queremos averiguar quais bactérias são, para saber se no futuro poderiam ser usadas ou poderiam nos dar uma pista, para um caminho de degradação.
Quais implicações ambientais tem a liberação desse carbono orgânico?
Está alterando o ecossistema marinho. Até agora, os efeitos do plástico eram vistos em animais maiores, que ficavam presos neles ou que os ingeriam e tinham seus estômagos cheios de plásticos.
Mas nada se sabia sobre como isso afeta a parte mais baixa da cadeia trófica, os micro-organismos. As bactérias, em particular. Por enquanto, temos visto que, sim, sofrem uma alteração, mas ainda não sabemos a magnitude. Mais estudos são necessários para conhecer a implicação global.
Que hipóteses existem até agora?
A liberação de toneladas de carbono a cada ano pode contribuir para a reserva de carbono orgânico que já existe no oceano. Mas ainda é preciso estudar quais efeitos isso teria no ciclo do carbono.
Que consequências globais poderiam existir nesse caso?
Globalmente, ainda não me atrevo a dizer que a contribuição seja significativa. No entanto, dos experimentos que fizemos, em comparação com a quantidade de carbono orgânico já existente no mar – umas 700 gigatoneladas -, essas toneladas geradas pelo plástico ainda são um número pequeno.
Mas podem ser importantes na superfície, mais contaminada, porque é onde está o plástico flutuante e onde recebe a luz solar que faz com que se fotodegrade mais rápido. Os 10% do carbono encontrado nessa área poderia vir do plástico. Deste modo, poderia contribuir em pequena escala.
Qualquer tipo de plástico que caia no mar provavelmente liberará esse composto, certo?
Sim, fizemos experimentos com todos os tipos de plásticos e todos liberam carbono. Mas alguns estão mais expostos à luz solar do que outros, que é o fator que mais contribui para a degradação.
Os que estão na superfície recebem essa luz do sol. Depois, estão os que afundam, que não recebem a luz e se degradam muito mais devagar. As temperaturas no fundo do oceano também são muito mais frias.
O uso do plástico disparou em meados do século passado. Quais são os elementos mais poluentes?
Começou principalmente com o plástico descartável, não apenas com a produção em massa. Nas limpezas que são realizadas nas praias estão presentes sobretudo esse tipo.
Isso fez com que a poluição aumentasse muito, porque é um plástico usado por alguns minutos e depois jogado fora e dura anos no ambiente.
Seria possível retornar ao estado dos oceanos antes da existência dos plásticos?
Se tomarmos as medidas apropriadas, tudo volta a um equilíbrio. Acredito que isso poderia ser alcançado, embora o plástico que já está no mar vai permanecer lá. No final, acabará sedimentando no fundo e ficará enterrado ou dentro dos animais. Mas já seria o fim se pararmos de jogar plásticos no mar.
Do plástico que chega ao mar, 80% vem da terra, pelos rios, pelas estações de tratamento de água, etc. Esta é uma medida que está em nossas mãos para parar.
Como podemos realmente frear essa situação?
Reduzindo a fabricação de plástico descartável, que, sim, é dispensável na maioria dos casos. Também podemos evitar a chegada de resíduos ao mar, apresentando sistemas adequados.
Em Barcelona, por exemplo, toda vez que chove, o sistema de esgoto fica saturado e o lixo entra no mar sem filtro. Com a tempestade Gloria, as praias estavam cheias de plásticos e outros detritos que não se entende como as pessoas podem jogar no vazo sanitário. Poderiam ser melhoradas as infraestruturas para evitar que continue chegando o plástico ao mar.
Quais mecanismos poderiam ser implementados?
O plástico que já está no mar é muito difícil de tratar, mas poderíamos implementar mecanismos de degradação antes que a água chegue nas usinas de resíduos. Além disso, também não sabemos a magnitude do problema, porque de todo o plástico que entra no mar, apenas 1% foi contabilizado.
Exatamente 99% do plástico que percorre os oceanos está perdido. Não sabemos se está afundado ou se ficaria preso às redes ao tentar pegá-los. Não sabemos nem até que tamanho mínimo o plástico chega, assim que vai se fragmentando em pedacinhos, nem onde está (na coluna de água, sedimentando-se ou tão pequeno que não podemos medi-lo).
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“De todo o plástico que entra no mar, apenas 1% foi contabilizado”. Entrevista com Cristina Romera - Instituto Humanitas Unisinos - IHU