10 Fevereiro 2018
“O Papa está inteirado e preocupado com a pobreza, as demissões e a situação da Argentina. Está preocupado com todo o mundo, na realidade. E reza por nós”. São palavras de Estela de Carlotto, referência da organização de defesa dos direitos humanos, Avós da Praça de Maio. Após receber um reconhecimento em Milão, foi recebida nesta quinta-feira por Francisco, em audiência privada. “Não foi muito longa, mas, sim, foi muito interessante. Falamos de tudo o que necessitávamos falar”, contou ela, imediatamente após o encontro.
A reportagem é de Andrés Beltramo Álvarez, publicada por Vatican Insider, 08-02-2018. A tradução é do Cepat.
Durou uns 20 minutos e ocorreu no Palácio Apostólico do Vaticano. Foi acompanhada por sua filha Claudia Carlotto, diretora executiva da Comissão pelo Direito à Identidade (Conadi), pela religiosa Geneviève Jeanningros, sobrinha de Léonnie Duquet, uma das freiras francesas desaparecidas durante a ditadura militar (1976-1983), e por Jorge Ithurburu, referência da organização italiana 24 de Março.
Papa Francisco e Estela de Carlotto (Fonte: Vatican Insider)
“Falamos da Argentina, está preocupado com a situação”, disse Carlotto a um grupo de jornalistas, fora da Porta de Santa Ana, um dos ingressos ao Vaticano. Afirmou que [o Pontífice] está bem informado sobre problemas como a pobreza, as demissões e a existência de “violações aos direitos humanos”. Contudo, preferiu não aprofundar mais, argumentando que seu objetivo principal era renovar o pedido de colaboração à Igreja católica para o acesso a todos os arquivos eclesiásticos dos tempos da ditadura.
Por esse motivo, ela lhe entregou uma carta na qual, entre outras coisas, expôs as dificuldades de algumas famílias de desaparecidos para ter acesso à informação em alguns arquivos que já foram abertos por ordem do próprio Papa. Explicou que o trâmite “é muito longo e enfadonho” porque a justiça argentina precisa intervir, enviar uma solicitação e esta deve ser estudada. De qualquer modo, expressou certa esperança, depois que alguns familiares conseguiram, na Santa Sé, dados sobre desaparecidos. “Ou seja, existem, mas é necessário rastreá-los”, apontou.
Destacou a figura do novo presidente da Conferência Episcopal Argentina e bispo de San Isidro, Oscar Ojea, a quem qualificou como “excelente pessoa, muito simples e muito boa”. “Teve a gentileza nos visitar em nossa casa, o Papa disse que é muito bom”, insistiu. Ao mesmo tempo, antecipou que logo fará contato com o vigário militar argentino, Santiago Olivera, para lhe pedir o registro de batismo da capela da Escola de Mecânica da Armada (ESMA), um dos principais centros de detenção clandestina.
“Disse-me que os arquivos estão em Buenos Aires, que estão duplicados e certificados como verídicos. Agora, irei lá ver. Não falamos muito disso. Ficou surpreso com a descoberta (do livro de batismo) e deu conselhos a Olivera sobre como manejá-lo, com muita direção porque pode haver algum dado que nos convém ou não. Disse-lhe que nós o queremos ver”, seguiu.
Mais adiante, afirmou não ter se atrevido a lhe perguntar por que não viajará logo à Argentina, embora algumas pessoas tivessem lhe pedido. “É um assunto muito seu e ele já saberá”, apontou. Afirmou que tem respeito à investidura de Papa, reconheceu-se “católica à sua maneira” e disse que o considera como “um irmão”, daí que se permite “lhe dizer coisas” e “ver seu rosto alegre”.
“Encontrei-o bem, está muito ocupado e muito preocupado. Falamos de temas de violações aos direitos humanos. Outra das premiadas em Milão vem justamente do México e ele está muito preocupado com o que está acontecendo lá, com tanta morte. Disse que só ontem mataram dois sacerdotes”, apontou.
“Foi uma conversa muito afável, fiz-lhe rir um pouco. Não é que não o respeitei, inspira-me muita confiança”, estabeleceu. Também aceitou sentir um pouco de culpa porque não chegou a conhecê-lo na Argentina, onde tinha uma opinião diferente dele, apesar de ter amigos em comum. “A gente se deixa influenciar, mas quando se soube a verdade, retifiquei-me. É claro que ele sabe disso, e agora eu acredito que a obra que está fazendo em nível mundial é excelente”, acrescentou.
Afirmou que [o Papa] reza por todo o mundo. Que lhe abençoou “algumas coisinhas”, como rosários. E refletiu: “Na Argentina, o que é necessário é nos termos como amigos, para levantar o país daquilo em que está caindo, para recuperar o que se está perdendo, mas sempre em paz, porque tudo o que é violência ou atos que transgridam o normal, com isso, nós, Avós, não concordamos. Completamos 40 anos, temos muita paciência e continuaremos tendo”.
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“O Papa está inteirado e preocupado com a Argentina”, afirma Estela de Carlotto - Instituto Humanitas Unisinos - IHU