11 Novembro 2016
A invasão da Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF) pela Polícia Civil de São Paulo foi apenas mais um episódio da escalada antidemocrática por que passa o Brasil. Agentes do Garra (Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos) pularam uma janela e invadiram a escola de formação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), onde efetuaram disparos de armas de fogo.
A reportagem é publicada por CartaCapital, 11-11-2016.
"As agressões à nossa democracia se banalizam sem causar alarido e, de forma acelerada, retiram direitos e afrontam o Estado democrático de Direito", afirma o advogado e professor Pedro Estevam Serrano, colunista de CartaCapital. Confira, abaixo, dez exemplos recentes de autoritarismo à brasileira.
Polícia invade escola do MST
Agentes da Polícia Civil de São Paulo invadiram a escola Florestan Fernandes, em Guararema, na sexta-feira 4. A ação foi parte da Operação Castra, deflagrada no Paraná com o apoio de São Paulo e Mato Grosso do Sul para prender integrantes do MST acusados de crimes. Em nota, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo tentou justificar a ação dizendo que os presentes "tentaram desarmar os agentes". Gilmar Mauro, liderança do MST que estava na escola do momento da invasão, disse que a versão da SSP é "fantasiosa".
Em decisão do dia 30 de outubro, o juiz Alex Costa de Oliveira, da Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal, autorizou que a Polícia Militar utilizasse técnicas de tortura para forçar a desocupação do Centro de Ensino Médio Asa Branca (Cemab), em Taguatinga. O juiz autorizou, por exemplo, o corte do fornecimento de água, energia elétrica e gás de cozinha e permitiu o uso de "instrumentos sonoros contínuos" a fim de impedir o sono dos estudantes. Os alunos deixaram a escola no dia 1º de novembro, após cinco dias de ocupação.
A apresentação do espetáculo Blitz – O Império que Nunca Dorme, da Trupe Olho da Rua, foi interrompida pela Polícia Militar na tarde do dia 30 de outubro, em uma praça de Santos, no litoral de São Paulo. De acordo com a Polícia Civil, a PM se sentiu ofendida pela peça, que faz críticas ao Estado, e prendeu o ator Caio Martinez Pacheco por desrespeito aos símbolos nacionais, além de desobediência e resistência. Os policiais também intimidaram parte do público que filmava a ação. A Trupe Olho da Rua afirmou que vai questionar a arbitrariedade no Ministério Público.
Por seis votos a quatro, o Supremo Tribunal Federal validou o corte salarial automático de servidores públicos que decidirem entrar em greve. O ministro Marco Aurélio Mello, que votou contra o corte salarial, afirmou que a decisão “fulmina” o direito à greve. "Não concebo que o exercício de início de um direito constitucional possa de imediato implicar esse prejuízo de gradação maior, que é corte da subsistência do trabalhador e da respectiva família”, disse no julgamento, em 27 de outubro.
Em Miracema do Tocantins (TO), dois estudantes foram algemados durante a desocupação de uma escola pela Polícia Militar. O promotor Vilmar Ferreira de Oliveira foi procurado pela direção da escola, que alegou que entre os estudantes havia militantes do MST, da CUT e do PT. À Folha de S.Paulo, o promotor disse que foi até a escola, mas que não houve acordo. "Determinei que fossem algemados, para segurança deles e para impedir que agredissem os militares (...) Dentro de escola não é lugar para fazer manifestação, cultuar partido político", disse Oliveira ao jornal.
Nota técnica divulgada em setembro pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) provocou uma caça às bruxas no órgão. O documento concluiu, entre outras coisas, que a aprovação da PEC 241 (PEC 55 no Senado) poderá gerar uma perda de 743 bilhões de reais para saúde em 20 anos. O conteúdo do documento irritou o presidente do Ipea, Ernesto Lozardo, que usou o site e os canais de comunicação da instituição para questionar publicamente o estudo. A situação levou a pesquisadora Fabíola Sulpino Vieira, uma das autoras da nota, a pedir exoneração do cargo no início de outubro.
No dia 27 de setembro, a 4ª Câmara Criminal do Tribunal do Júri do TJ-SP anulou os quatro julgamentos que condenaram 74 policiais militares pelo massacre do Carandiru, que terminou com a morte de 111 presos no dia 2 de outubro de 1992. Para os desembargadores, não há elementos que comprovem quais foram os crimes cometidos por cada um dos agentes, e novos julgamentos deverão ser realizados. O presidente da 4ª Câmara, Ivan Sartori, chegou a pedir a absolvição dos réus. “Não houve massacre, houve legítima defesa”, disse. A promotoria afirmou que entrará com recurso no Superior Tribunal de Justiça para manter as condenações.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu que a Operação Lava Jato tem caráter “excepcional” e não precisa seguir as regras dos processos comuns. Em julgamento realizado no dia 22 de setembro, a Corte entendeu, por 13 votos a 1, que as ações da Lava Jato “trazem problemas inéditos e exigem soluções inéditas”. Esse foi o argumento usado para arquivar pedido de abertura de processo disciplinar contra o juiz federal Sergio Moro. Assinado por 19 advogados, a representação contestava a captação, o uso e a divulgação ilegais de conversas telefônicas entre a então presidenta Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, em março.
O capitão do Exército Willian Pina Botelho usou um nome falso para se infiltrar em um grupo de manifestantes contrários a Michel Temer. A ação do capitão, que se apresentava nas redes sociais com o nome de Balta Nunes, resultou na prisão de 18 adultos e oito adolescentes no dia 5 de setembro, antes mesmo do início de um protesto contra Temer em São Paulo. O comandante-geral do Exército, general Eduardo da Costa Villas Bôas, afirmou ao El País que a operação contou com "absoluta interação" com a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo. O governo Geraldo Alckmin (PSDB), por sua vez, nega envolvimento.
Postar críticas à Polícia Militar nas redes sociais também virou pretexto para prisão. Em junho foram registrados ao menos três casos de detenção por suposto desacato. De acordo com o Código Penal de 1940, o crime de desacato consiste em “desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela". No Ceará, um adolescente de 17 anos foi levado à delegacia para prestar em depoimento, sem a presença de um responsável. Em Rio Claro (SP), uma jovem foi detida enquanto trabalhava em um shopping. Em Pedregulho, também no interior de São Paulo, a PM algemou e prendeu um jogador de basquete de 19 anos.
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Dez arbitrariedades que mostram a escalada autoritária no Brasil - Instituto Humanitas Unisinos - IHU