03 Mai 2016
Depois de passar a madrugada em claro, de guarda na ocupação do estudantes do Centro Paula Souza em São Paulo, Tiago* se dirigiu, às 5 da manhã, ao auditório do edifício para dormir algumas horas pela primeira vez desde quinta-feira, quando ação em protesto contra o Governo Geraldo Alckmin começou. Seria acordado por volta do meio-dia, com uma lanterna no rosto. Era um policial e um funcionário do centro que vinham retirar o garoto de 14 anos e todos os seus companheiros do ambiente. O estudante relatou ter recebido alguns empurrões, mas a saída, em geral, aconteceu sem sobressaltos enquanto a Polícia Militar entrincheirava os manifestantes no hall de entrada do prédio, onde funciona a administração das escolas técnicas do Estado de São Paulo.
A reportagem é de Gustavo Moniz publicada por El Pais, 02-05-2016.
Localizado na zona central de São Paulo, o emblemático edifício envidraçado está há cinco dias ocupado por cerca de 150 secundaristas. É a tentativa de reacender a onda de protestos de secundaristas que tomou cerca de 200 colégios em 2015. No ano passado, a principal pauta era frear a proposta de reorganização escolar, que implicaria no fechamento de cerca de 90 escolas, e eles conseguiram. Agora, os estudantes protestam contra o que consideram uma "reforma disfarçada", com o fechamento das salas de aula e a superlotação das escolas, mas, principalmente, querem explicações sobre o escândalo de desvio de verba na compra da merenda da rede estadual e a queda da qualidade da alimentação oferecida nos colégios. Como em 2015, eles prometem não sair até que suas exigências sejam atendidas pelo governador tucano.
No domingo, a Justiça havia autorizado a reintegração de posse do Paula Souza, mas o mandado judicial ainda não estava pronto por volta das 11h de segunda, quando cerca de 40 policiais militares da Força Tática entraram no local e liberaram a entrada de funcionários. O secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, acompanhou a ação. Foi quando os estudantes foram retirados de todas as salas e colocados no hall de entrada do edifício, onde permanecem acampados. Às 16h50, porém, o juiz Luis Manuel Pires, da Central de Mandados do Tribunal de Justiça, julgou ilegal a operação da PM e deu 72 horas para a Secretaria de Segurança Pública se explicar. A polícia saiu do prédio por volta das 20h.
Atração política
Durante esta segunda, a ocupação do Centro Paula Souza atraiu políticos de oposição a Alckmin ao local. A primeira foi a deputada federal Luiza Erundina (PSOL), seguida pelo deputado estadual Carlos Gianazzi, também do PSOL, e pelo o ex-senador Eduardo Suplicy (PT) - todos dizendo querer prestar apoio aos estudantes. Os alunos agradeceram, mas repetiram que o movimento é apartidário, que não levanta bandeiras de partidos na ocupação e que alunos de diversas orientações políticas são ouvidos igualmente. É uma resposta a Alckmin, que disse no sábado que a manifestação é "política" e afirmou que os estudantes não invadem escolas do PT. “É uma invasão seletiva”, falou Alckmin.
Além do Paula Souza, a escola estadual Fernão Dias, em Pinheiros, a ETEP, na avenida Tirandentes, e a ETEP Paulistano, no Jardim Paulistano, também estão ocupadas. A Fernão Dias foi a escola que ficou mais tempo ocupada nos protestos dos estudantes contra a reorganização escolar, entre novembro de 2015 e janeiro de 2016.
O Centro Paula Souza rebate os alunos. Afirma que investiu mais de 250 milhões de reais na ampliação e melhorias de escolas nos últimos dois anos. "O Centro Paula Souza segue trabalhando para solucionar questões pontuais com a readequação da estrutura disponível em algumas unidades e a negociação com as prefeituras e a Secretaria da Educação, responsável pelo orçamento, compra e distribuição de alimentos", diz nota divulgada nesta segunda. A instituição começou a distribuir merenda seca (barras de cereal, bolachas e suco) para quatro Etecs a partir desta segunda-feira. Outras sete unidades deverão começar a receber alimentos até sexta.
Para os estudantes, porém, isso não é suficiente. Eles se mostram firmes e só mudam o semblante quando falam sobre o medo de serem perseguidos depois que a ocupação terminar. Temem ser alvo de retaliações por parte de professores e diretores nas escolas onde estudam e passar apuros nas mãos da polícia nas ruas. Para driblar a tensão, eles mudam de assunto e entoam o grito de guerra: "Tá tranquilo, tá ocupado"!
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“Tá tranquilo, tá ocupado”: nova queda de braço entre Alckmin e os estudantes - Instituto Humanitas Unisinos - IHU