11 Dezembro 2017
A febre das redes sociais e a sede de notoriedade estão roubando aquilo que há de melhor no ser humano, que é o respeito e a dignidade da pessoa, de todas elas, vítimas e carrascos
O comentário é de Juan Arias, jornalista, publicado por El País, 07-12-2017.
Diego Rocha Pereira, operador da TV Globo, havia gravado e tornado pública uma conversa do jornalista William Waack que foi considerada um ato de racismo contra os negros e que levou a direção da emissora a afastar Waack de seus programas, entre eles o Painel, na Globo News, e o Jornal da Globo, telejornal noturno.
A notícia teve repercussão até mesmo internacional, dada a estatura profissional de um dos melhores jornalistas da Globo. O gesto do operador Rocha Pereira foi considerado um ato de coragem e visto como uma denúncia justa do comportamento de Waack.
Até que as redes sociais começaram a divulgar, nesta quarta-feira, uma foto do denunciante, postada por ele mesmo no Instagram, em que Diego Rocha aparece sentado no estúdio de TV de onde Waack fazia seus programas, com um ar de conquistador e a seguinte legenda: “O que acham?”.
Não sei como Rocha entrou nas dependências da Globo nem como conseguiu chegar até o local de trabalho de Waack. Isso ainda precisará ser explicado. Mas eu gostaria de responder, da minha parte, ao seu desafio: “O que acham?”. Minha resposta é que considero que aquilo que começara como uma denúncia justa foi profanado pelo seu próprio autor ao transformá-la em chacota. Essa foto deixou envergonhados aqueles que conhecíamos William e que ficamos perplexos e incrédulos com suas palavras contra os negros.
Essa foto deveria deixar todos nós envergonhados, a começar pelos negros que se sentiram vingados com a publicação do filme de Diego e que agora veem aquela catarse transformada em um jogo baixo, de publicidade pessoal arrogante e desprezível.
E o pior, aquilo que talvez tenha sido mais dolorido para mim, foi a surpresa ao ler os comentários sobre a foto de Diego no Instagram. Esperava encontrar a mesma raiva que ela gerou dentro de mim. O meu espanto é que foi o contrário que aconteceu.
Vejam alguns deles:
“Que pisão da porra”
“Bicho, tu é o cara”
“Obrigado por essa imagem”
“Que foda do caralho”
Se a nossa sociedade vê o gesto vulgar de Diego como algo a ser admirado, então creio que a febre das redes e a sede de notoriedade estão roubando aquilo que há de melhor no ser humano, que é o respeito e a dignidade da pessoa, de todas elas, vítimas e carrascos. Neste caso, o que insultou, não os negros, mas todos aqueles que ainda acreditam que há limites que não podem ser ultrapassados sem cair na indignidade, foram essa foto e esse gesto de fazer piada em cima de algo que, para todos nós, aparecera como um ato de coragem.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Uma denúncia justa de racismo transformada em chacota - Instituto Humanitas Unisinos - IHU