21 Novembro 2016
"Pouca coisa foi interessante ou inspiradora na reunião da Conferência dos Bispos dos EUA (USCCB), em Baltimore, esta semana. Sua maior parte foi dedicada a burocracias, como a aprovação de planos e programas, bem como assuntos litúrgicos e canônicos menores", escreve Thomas Reese, jesuíta e integrante da ala progressista da Igreja Católica dos EUA, em artigo publicado por National Catholic Reporter, 17-11-16. A tradução por Luísa Flores Somavilla.
Eis o artigo.
O item mais controverso da pauta foi um aumento nas avaliações diocesanas (que fracassou) e uma mudança em seu método. Os bispos, como qualquer contribuinte, não querem aumento de impostos.
Houve uma certa emoção na eleição de diretores e presidentes de comissões.
A eleição do Cardeal Daniel DiNardo, de Galveston-Houston, para presidente da USCCB não foi nenhuma surpresa, já que ele foi eleito vice-presidente três anos atrás e o vice normalmente sucede o presidente. A eleição de Dom José Gomez, de Los Angeles, foi histórica, pois ele não somente é o primeiro vice-presidente latino-americano da conferência, mas também é um imigrante mexicano. Certamente ele será eleito presidente daqui a três anos.
Os dois serão uma dupla interessante. DiNardo é um prelado sensato e sem papas na língua, e os jornalistas mal podem esperar para cobri-lo. Gomez, por outro lado, é um bispo delicado e pastoral, que evita ser o centro das atenções. Em uma conferência de imprensa conjunta, DiNardo respondeu a todas as perguntas, enquanto Gomez parecia feliz em simplesmente observar. Mas depois de cada resposta, DiNardo perguntava a Gomez sobre o que ele pensava, encorajando-o a responder. DiNardo não permitiu que Gomez se escondesse.
A votação para presidente da Comissão de Justiça e Paz Internacional da Conferência dos Bispos dos EUA foi a que melhor revelou sua atual composição. O Arcebispo Timothy Broglio, da Arquidiocese dos EUA para Serviços Militares, venceu o Bispo Robert McElroy, de San Diego, por 127 votos a 88. Os bispos moderados (há muito poucos bispos liberais) votaram em McElroy e os conservadores votaram em Broglio.
Quando era secretário pessoal do cardeal Angelo Sodano, secretário de Estado do Vaticano (1991-2006), Broglio se opôs ao então cardeal Bergoglio e a outros bispos argentinos, cujas recomendações para as nomeações episcopais eram rejeitadas por Sodano uma após a outra. McElroy, por outro lado, direcionou a conferência a apoiar as prioridades do Papa Francisco. Ele provavelmente perdeu alguns votos por exagerar um pouco.
A votação para presidente da Comissão de Evangelização e Catequese foi semelhante, com 122 votos para Robert Barron, bispo auxiliar de Los Angeles, contra 90 votos para o Bispo Frank Caggiano, de Bridgeport, Connecticut.
Um item rotineiro na pauta para a reunião acabou sendo um dos mais emocionantes. Carolyn Woo, presidente e CEO da Catholic Relief Services (CRS), agência de ajuda humanitária internacional da Conferência de Bispos Católicos dos Estados Unidos, foi escalada para entregar um relatório do trabalho da CRS aos bispos.
Foi a última fala de Woo nesse posto, já que em janeiro ela termina seu mandato de cinco anos como chefe da CRS e volta a South Bend, sede da escola de negócios Notre Dame, onde trabalhava quando os bispos a chamaram para o cargo. Embora o antecessor imediato de Woo, Ken Hackett, tenha dirigido a Catholic Relief Services por 18 anos - o que aparentemente torna o seu mandato de cinco anos curto - ela liderou um movimento de retorno à vida acadêmica.
A fala de Woo, na segunda-feira, parecia rotineira ao descrever o trabalho da CRS, mas foi difícil para ela conter as lágrimas ao abordar "as divisões que claramente" dificultam o trabalho da Catholic Relief Services.
Ela não entrou em detalhes sobre essas divisões, mas a Catholic Relief Services tem sido atacada por católicos de direita, acusando-a de ignorar a doutrina da Igreja sobre controle da natalidade e aborto.
Ela relatou o que classificou como a ocasião "mais assustadora" de seu mandato na CRS, uma conversa com alguém que avisou que não haveria consenso a respeito de questões controversas. Ela contou: "Me disseram: ‘Carolyn, não podemos entrar em acordo. Quando estamos ganhando, não podemos entrar em acordo. Quando estamos perdendo, não podemos entrar em acordo.’"
"Uau, eu pensei, então quando podemos agir em conjunto?" disse ela. Carolyn encerrou sua apresentação com "um pedido simples".
"Sempre que você se perguntar o que a CRS está fazendo", disse Carolyn aos bispos, "questione-se algo diferente: ‘O que nós estamos fazendo?’".
O Arcebispo Paul Coakley, de Oklahoma City, no estado de Oklahoma, Presidente do conselho da CRS, foi até Woo e continuou de onde ela parou. Ele disse a seus colegas bispos que, como relatou Woo, ele tinha recebido outro e-mail indecente do Instituto Lepanto, que usa toda uma parte de seu site para atacar a CRS.
O Instituto Lepanto se diz "uma organização de pesquisa e educação em prol da defesa da Igreja Católica contra ataques de forças externas ou internas", inclusive de "hereges" e "traidores".
Coakley disse aos bispos: "Eu quero que vocês saibam que a Catholic Relief Services é católica de ponta a ponta. Espero que não deem crédito a este blogueiro."
Em resposta, Coakley foi ovacionado em pé.
Outra apresentação emocionante foi a do bispo Gregory Mansour sobre a perseguição aos cristãos no Oriente Médio. Chamado de Bispo Gregory, seu primeiro nome, por quase todo mundo, ele comanda a Eparquia maronita de São Maron de Brooklyn, e representa uma voz de liderança para os cristãos no Oriente Médio.
Apesar de seu terrível sofrimento, Mansour não retrata os cristãos como meras vítimas, mas sim como muito ativos na resposta à tragédia de seus países.
"Embora a maioria dos refugiados hoje seja cristã, a maior parte dos que os servem é, e continua sendo a luz do mundo e o sal da terra", disse Mansour. "Hoje os cristãos estão mais unidos do que nunca, em um sofrimento comum, um martírio comum e uma assistência comum aos necessitados".
Sua frustração diante da negligência à difícil situação dos cristãos no Oriente Médio ficou evidente. Ele pediu por defesa, ajuda humanitária e apoio ecumênico para ajudá-los.
Com relação à defesa, ele pediu que os bispos norte-americanos pressionassem o governo dos Estados Unidos para aumentar a ajuda humanitária e a assistência ao desenvolvimento, tanto para os refugiados quanto para pessoas deslocadas internamente. Ele também pediu ajuda aos países da região que estão acolhendo grandes populações de refugiados.
Em relação à admissão de refugiados nos Estados Unidos, "todos os bispos deixaram muito claro que eles são bem-vindos", disse ele, na conferência de imprensa de quinta-feira. "Já os recebemos há anos. Nós todos somos um pouco imigrantes".
Em resposta a uma pergunta do NCR, ele declarou que não queria presença americana nem o armamento das milícias cristãs. Ele ainda observou que o apoio da Rússia e a oposição dos Estados Unidos a Assad estão complicando a situação na Síria. "O Ocidente não deveria determinar quem permanece como figura pública ou não", disse ele.
"Isso deve ser decidido no próprio território".
O bispo acredita que "o fato de a Rússia estar de um lado e os Estados Unidos, de outro faz com que a guerra civil fique muito mais indefinida e cheia de ódio".
Os Estados Unidos devem "encontrar uma maneira de trabalhar com a Rússia, com os aliados do Irã e com os nossos próprios aliados", disse ele, "e talvez repensar algumas alianças para que possamos encontrar uma solução para a Síria, para o Iêmen, para o Iraque, para todo o Oriente Médio".
Os cristãos no Oriente Médio precisam muito de ajuda humanitária. Os Sírios precisarão de ajuda para reconstruir suas igrejas, hospitais, escolas, casas e meios de subsistência. Ele sugeriu a união ou a associação entre paróquias e dioceses dos EUA e do Oriente Médio. Ele também pediu financiamento contínuo de grupos como Catholic Relief Services, Ajuda à Igreja que Sofre, Catholic Near East Welfare Association e os Cavaleiros de Colombo.
Finalmente, ele também sugeriu trabalhar em conjunto com parceiros inter-religiosos para chamar a atenção à necessidade de direitos humanos básicos, plenos direitos de cidadania e liberdade religiosa para as pessoas no Oriente Médio. Ele observou que os católicos têm boas relações com judeus e muçulmanos, mas os três grupos precisam trabalhar juntos pela paz.
Grande parte da reunião da Conferência dos Bispos dos EUA de novembro foi chata. Para a decepção dos jornalistas, os bispos não estavam interessados em falar sobre o novo presidente, Donald Trump, pelo menos não em sessões públicas. O expansivo Presidente da USCCB, Joseph Kurtz, arcebispo de Louisville, disse que os bispos não tinham certeza dos posicionamentos de Trump em muitas questões, mas gostariam de dialogar com o novo governo, para saber quais de suas pautas podem ser adotadas.
O presidente eleito DiNardo estava esperançoso de que as nomeações judiciais favoreceriam a agenda pró-vida dos bispos.
No entanto, os bispos estavam claramente preocupados com o que Trump faria em relação aos imigrantes, especialmente no que diz respeito à ruptura de famílias e deportação daqueles em situação irregular. Logo no início do primeiro dia, eles aprovaram uma declaração em apoio à comunidade imigrante nos Estados Unidos. O diálogo que eles esperam ter com o governo será favorecido pelo fato de que os dois novos líderes da conferência vêm dos estados com o maior número de imigrantes, além de um desses líderes ser ele próprio imigrante.
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EUA. Reunião dos bispos foi chata, com flashes de inspiração - Instituto Humanitas Unisinos - IHU