11 Dezembro 2011
O livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr, anuncia e promete, com documentos, comprovar pagamentos de propinas durante o processo de privatizações no Brasil, num esquema de lavagem de dinheiro com conexões em paraísos fiscais que, de acordo o autor, une membros do PSDB, como o ex-ministro da Saúde e ex-governador paulista José Serra, ao banqueiro Daniel Dantas.
A reportagem e a entrevista é de Eliano Jorge e publicadas por Terra Magazine, 09-12-2011.
As denúncias chegam às bancas neste fim de semana. No livro e como tema de capa da revista CartaCapital. Na entrevista, Ribeiro Jr afirma ter rastreado o dinheiro. "Esses tucanos deram uma sofisticação na lavagem de dinheiro. Eram banqueiros, ligados ao PSDB", acusa. "Quem estava conduzindo os consórcios das privatizações eram homens da confiança do Serra", acrescenta.
"É um saque (financeiro) que eles fizeram da privatização brasileira. Eles roubaram o patrimônio do País, e eu quero provar que eles são um bando de corruptos", dispara Ribeiro Jr. "A grande força desse livro é mostrar documentos que provam isso".
Durante a corrida presidencial de 2010, Ribeiro Jr foi indiciado pela Polícia Federal, acusado de participar de um grupo que tentava quebrar o sigilo fiscal e bancário de políticos tucanos.
Por três vezes, Terra Magazine fez contato com a assessoria de Serra na tarde e no início de noite desta sexta-feira (9) em busca de ouvir o ex-governador de São Paulo a respeito das denúncias. Às 20h, a reportagem recebeu a resposta de que Serra não se pronunciaria a respeito.
Eis a entrevista.
Seu livro denuncia um esquema de corrupção que teria sido comandado por amigos e parentes do ex-governador José Serra. No seu entender, como isso funcionava?
Eu tô há 20 anos, como diz o próprio livro, vendo essas contas, rastreando tudo. Eu apurava matérias de direitos humanos, depois virei um especialista (em lavagem de dinheiro). O tesoureiro do Serra, o Ricardo Sérgio, criou um modus operandi de operar dinheiro do exterior, e eu descobri como funcionava o esquema. Eles mandavam todo o dinheiro, da propina, tudo, para as Ilhas Virgens, que é um paraíso fiscal, e depois simulavam operações de investimento, nada mais era que internação de dinheiro. Usavam umas off-shore, que simulavam investir dinheiro em empresas que eram dele mesmo no Brasil, numa ação muito amadora. A gente pegou isso tudo.
E como você conseguiu pegar isso?
Não teve quebra de sigilo, como me acusaram. São transações que estão em cartórios de títulos e documentos. Quando você nomeia um cara para fazer uma falcatrua dessa, você nomeia um procurador, você nomeia tudo. Rastreando nos cartórios de títulos e documentos, a gente achou tudo isso aí.
São documentos disponíveis para verificação pública então?
Não tem essa história de que investiguei a Verônica Serra (filha do ex-governador), que investiguei qualquer pessoa ou teve quebra de sigilo. A minha investigação é de pessoa jurídica. Meu livro coloca documentos, não tem quebra de sigilo, comprova essa falcatrua que fizeram.
Segundo seu livro, esse esquema teria chegado a movimentar cifras bilionárias então?
Bilionárias, bilionárias. Esses tucanos deram uma sofisticação na lavagem de dinheiro. Eram banqueiros, ligados ao PSDB, formados na PUC do Rio de Janeiro e com pós-graduação em Harvard. A gente é muito simples, formado em jornalismo na Cásper Líbero, mas a gente aprendeu a rastrear esse dinheiro deles. Eles inventaram um marco para lavar dinheiro que foi seguido por todos os criminosos, como Fernando Beira-Mar, Georgina (de Freitas que fraudou o INSS), e eu, modestamente, acabei com esse sistema.
Temos condenações na Justiça brasileira para esse tipo de operações. Os discípulos da Georgina foram condenados por operações semelhantes que o Serra fez, que o genro (dele, Alexandre Bourgeois) fez, que o (Gregório Marín) Preciado fez, que o Ricardo Sérgio fez.
Está dito no seu livro que pessoas ligadas a Serra que teriam participado desse esquema?
Ricardo Sérgio, a filha (Verônia Serra), o genro (Alexandre Bourgeois), Preciado, o primo da mulher dele, e, acima, (o banqueiro) Daniel Dantas, o cara que comandava todo esse esquema de corrupção.
Em A Privataria Tucana, você afirma que faria parte das operações uma sociedade entre Verônica Serra, filha do ex-governador Serra, e Verônica Dantas, irmã de Daniel Dantas.
É verdade, conta a história da Verônica Serra com a Verônica Dantas. Isso era um pagamento de propina muito evidente para o clã Serra. Inventaram essa sociedade entre elas em Miami. Quem investe nessa sociedade? Os consórcios que investiram e ganharam (na privatização): o Opportunity, o Citibank. Eles que dão o dinheiro, está no site deles próprios.
Em 2002, Serra era candidato a presidente do Brasil, o Dantas quis chantagear. Quem revelou isso aí? Fui eu, o jornalista investigativo? Foi a própria revista IstoÉ Dinheiro que revelou a sociedade de Dantas e o clã Serra. Porque ele tinha dificuldade em compor a Previ, do governo, do Banco do Brasil. Ele estava chantageando os tucanos para compor com ele. Você vê como o Dantas é manipulador nessa história toda.
Primeiro veio a matéria para justificar o dinheiro dessa corrupção, dizendo que a Verônica Dantas havia enriquecido porque era uma mártir das telecomunicações. Depois, veio uma matéria fajuta... Quando não o satisfazia, (Dantas) ele chantageou o Serra. Para compor com a Previ, que estava com problemas com a Telecom, naquele processo todo.
Descobri que a sociedade de Verônica Dantas e Verônica Serra não acabou, como disseram, foi para as Ilhas Virgens, sendo operada pelo Ricardo Sérgio. Para quê? Jogar dinheiro aonde? Pra própria filha do governador do Serra. Mapeei o fluxo do dinheiro, esses caras roubaram, receberam propina, e a propina está rastreada. O dia em que o Dantas deu a propina da privatização, peguei a ponta batendo no escritório da filha dele lá no (bairro paulistano do) Itaim-Bibi. O Dantas pagou pro Serra. A parte da propina do Serra está documentada.
Para que você acha que seria essa propina?
Quem estava conduzindo os consórcios das privatizações eram homens da confiança do Serra. Era o Ricardo Sérgio Oliveira. Foi caixa de campanha dele. Isso é um saque que eles fizeram da privatização brasileira. Eles roubaram o patrimônio do País, e eu quero provar que eles são um bando de corruptos.
No livro, você também diz que Serra espionava o então governador mineiro Aécio Neves (PSDB).
Está documentado. Eu trabalhava no jornal (O Estado de Minas), e me pediram para localizar. Eu descobri. Consegui a prova documental que ele contratou a Fence (Consultoria, empresa que faz varreduras contra grampos clandestinos), no Rio de Janeiro, onde ele fazia as maracutaias. O Serra gosta de espionagem. Ele contratou um dos maiores carrascos da ditadura, está documentado no livro.
Você publica ainda que Serra investigou a governadora maranhense Roseana Sarney (DEM) em 2002 e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) quando era ministro da Saúde...
Isso está documentado. Os caras trabalharam, está no Diário Oficial. O agente Jardim (Luiz Fernando Barcellos), ligado ao Ricardo Sérgio. Isso está documentado, não é mentira. É porque essa imprensa defende o Serra e não divulga. O Serra montou a espionagem, ele manda espionar todos os inimigos dele.
Sua apuração mostra que essa espionagem do PSDB viria desde o governo FHC.
Justamente. O Serra gosta de espionar. Fui acusado de araponga? E o Serra, muito antes, quando era ministro, ele contratava espiões para espionar os caras do próprio partido, está documentado. A grande força desse livro é mostrar documentos que provam isso.
E de onde você tirou esses documentos?
É o contrato que ele pegou e contratou uma empresa de um coronel baixo nível da época da ditadura. O pretexto era que fazia negócio de contra-espinagem. O doutor Ênio (Gomes Fontenelle, dono da Fence) trabalhou na equipe dele. Estava em 2008 para quê? Para espionar o Aécio. Por que ele contratou, com dinheiro público do Estado? Por que contratou para fazer contra-espionagem no Rio de Janeiro? Todo mundo sabe que o Aécio vai pro Rio de Janeiro. A espionagem está documentada.
Seu livro mostra que, acreditando estar sendo espionada, a equipe de campanha de Dilma Rousseff teria tentado contra-atacar com arapongas também?
Não foi contratando araponga. Você fala minha pessoa?
Em geral.
Não. As pessoas que trabalhavam na campanha da Dilma eram pessoas de bem, ligadas ao mercado financeiro. Me chamaram porque estavam vazando tudo. Os caras faziam uma reunião, no dia seguinte estava na imprensa. Eu achava que era coisa do (ex-deputado tucano Marcelo) Itagiba ou do (candidato a vice-presidente, deputado do PMDB, Michel) Temer. Aí vem a surpresa: era o fogo-amigo do PT.
De quem?
Rui Falcão (atual presidente do PT e deputado estadual).
Mas você foi indiciado pela Polícia Federal, acusado pela quebra do sigilo fiscal da filha de Serra...
Claro. Por quê? Quebra de sigilo fiscal. É um crime administrativo que só se imputa a funcionário público. O inquérito todo da Polícia Federal é uma fraude, não tem foco. Abriu para apurar quebra de sigilo fiscal e abrange tudo. Nunca vai atingir a mim. Mas precisavam ter um herói, e me jogar pro público.
A imprensa queria o último factoide para jogar a Dilma no segundo turno. O que fizeram? Deturpar meu depoimento na Polícia Federal. Eu nunca disse que quebrei sigilo de nenhuma pessoa, mas o cara da Folha disse, ele deturpou, induziu todo mundo a dizer que confessei ter quebrado o sigilo fiscal. Ele mentiu sobre um depoimento na Polícia Federal, e a mídia toda espalhou isso. Era a única arma dessa imprensa carrasca, que mostrou seu lado. Eu nunca disse isso, meus quatro depoimentos são coerentes, têm uma lógica. A imprensa foi bandida.
O que você sabe sobre aquela história de dossiês do PT sobre tucanos, inclusive sobre o ex-presidente FHC?
Não sei nada disso.
Não conseguiu descobrir se realmente fizeram e quem fez?
Não sei nada desse assunto.
Você tem tomado precauções com sua segurança? Terá que aumentá-las agora, após as denúncias do livro?
Não, eu sigo minha vida como sigo desde que comecei, há 20 anos. Eu tenho uma trajetória muito bacana na profissão. Andei nos principais jornais do Brasil. Comecei violação de direitos humanos, ganhei muitos prêmios, denunciei muitas violações. Hoje, eu investigo a lavagem de dinheiro.
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Livro de jornalista acusa Daniel Dantas de pagar propina a tucanos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU