11 Outubro 2011
Nada de salas de aula, mas sim professores online, provas via web e milhares de estudantes de todo o mundo. Começou nesta segunda-feira, em Stanford, a educação do futuro.
A reportagem é de Riccardo Luna, publicada no jornal La Repubblica, 10-10-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Na "escola do futuro", não há cadeiras quebradas, paredes sujas nem prédios em ruínas. Na verdade, não há cadeiras, nem paredes, nem prédios. E nem cátedras.
Há apenas os únicos dois elementos absolutamente indispensáveis para que se possa falar de um curso de estudos: os professores, mas só aqueles realmente bons. E sobretudo os estudantes, muitos estudantes. Nunca se viu tantos alunos em uma única classe: os que na manhã desta segunda-feira darão início ao muito esperado curso de Introdução à Inteligência Artificial da Universidade de Stanford são mais de 140 mil e vêm de todas as partes do mundo. Ou melhor, não veem de fato, porque cada um deles, de hoje até o dia 12 de dezembro, quando irá ocorrer o exame final, para acompanhar as lições, vão ficar em casa, ou talvez em um parque com um laptop sobre os joelhos, ou então estará fazendo outra coisa e se conectará na rede quando lhe for mais cômodo para rever o professor no YouTube.
Eis, portanto, a rede Internet, sim, aquela que devem existir na escola do futuro: e com banda larga se possível, senão os vídeos soluçam, e o saber vai para o inferno.
Bem-vindos à "University of Everywhere", a universidade de todos os lugares: hoje, terá início o experimento mais avançado talvez que a educação jamais viveu desde os tempos de Sócrates. O objetivo é ensinar à distância, simultaneamente e grátis para todos aqueles que assim o desejarem. Se funcionar, nada mais será como antes. Se funcionar, logo se tornará realidade o cenário imaginado há alguns dias pelo ex-diretor do New York Times, Bill Keller, em seu blog: "Os cursos serão online e serão votados pelos estudantes como os livros da Amazon. O ensino será organizado com leilões no modelo do eBay. Os estudantes, ao invés do título de estudo, irão conquistar níveis de habilidade como nos videogames. E, presumivelmente, eles vão tomar a cerveja de sexta-feira à noite no Genius Bar da Apple".
Detenhamo-nos por um momento. Porque aqui ninguém está brincando.
Enquanto os estudantes vão às ruas pelo direito à educação, uma autêntica revolução didática está em curso verdadeiramente, e é mais forte do que a ignorância de certos ministros ou do que a miopia de muitos políticos que consideram a educação como um custo a ser cortado, e só.
Depois de ter derrubado os pilares da indústria cultural – da música ao cinema, dos livros aos jornais –, a Internet está atacando agora o lugar onde bate o coração do saber há mais de 2 mil anos: a escola. O objetivo final é criar câmpus virtuais onde o saber está distribuído em rede, os livros didáticos são lidos gratuitamente nos tablets e as lições são invertidas com relação ao que costumávamos fazer há dois séculos: chega de discursos feitos ex cathedra e temas de casa. É melhor, ao invés, ver em casa o vídeo do professor quantas vezes forem necessárias para cada um de nós (já que somos todos diferentes, como explicou o guru da educação Ken Robinson), e depois, em sala de aula, se discute e se fazem os exercícios.
A centelha da revolução se acendeu por acaso. Se, em 2004, a pequena Nadia não tivesse tido problemas em matemática, seu primo, Salman Khan, não teria iniciado a dar aulas particulares para ela: só que, como se encontravam em duas cidades diferentes dos Estados Unidos, Salman dava as suas aulas pelo Yahoo! Messenger, um serviço de mensagens instantâneas, mostrando as fórmulas das operações em um caderno virtual, o Microsoft Paint. Depois de algum tempo, Nadia lhe disse que preferia um vídeo, "porque eu posso vê-lo novamente se eu não entender alguma coisa".
E, assim, no dia 16 de novembro de 2006, o primo abriu um perfil no YouTube onde subia as suas explicações. Mas Salman não era um primo qualquer: nascido em New Orleans, mas originário de Bangladesh, ele tem no currículo três graduações pelo MIT de Boston e um mestrado em Harvard. Em suma, é um meio gênio. Ou melhor, retiremos o "meio". E, assim, os seus clipes para Nadia na rede se tornaram um culto: graças a módulos banais escritos em Java, uma das linguagens de programação mais conhecidas, no fim de cada vídeo de Khan existem baterias de perguntas, e se você responder exatamente a todas, você sobe para um nível superior e tem outras perguntas. Funciona como um videogame praticamente, mas, enquanto isso, Nadia aprendia. E não só ela.
Na rede, esses vídeos foram um sucesso imediato, a tal ponto que Salman Khan, depois de três anos, decidiu que essa seria sua vida: deixou o cargo de gerente de fundos financeiros de alto risco, obteve um pequeno financiamento de capital de risco do Vale do Silício e, desse dia em diante, o seu canal foi rebatizado de "Khan Academy".
Mas a verdadeira reviravolta ainda estava por vir: no verão passado, do palco do Festival das Ideias de Aspen, o fundador da Microsoft, Bill Gates, pessoalmente, elogiou o site revelando que os seus filhos o usavam rotineiramente. Em resumo, Salman se encontrou com um milhão e meio de dólares da Bill & Melinda Gates Foundation, seguidos de outros dois milhões da Google (a Google nessa história é importante, depois veremos o porquê).
Hoje, a Kahn Academy é um gigante da educação primária até 2.600 vídeos de aulas de história, matemática, finanças e física. Na página inicial do site, há um contador que atualiza quantas lições já foram dadas (estamos próximos do estratosférico valor de 80 milhões). E ela se deu a missão de nos ensinar "o que queremos, quando queremos e no nosso ritmo de aprendizagem".
Pequena nota: é tudo gratuito.
Mas as surpresas não haviam terminado. Seis meses atrás, em Long Beach, uma centena de cérebros de todo o mundo se reuniram para a conferência anual do TED. Bill Gates apresentou a sessão dedicada à educação e levou Salman Khan para o palco, naturalmente. Na sala, estava um jovem alemão, sobre o qual vamos concentrar os holofotes a partir de agora: chama-se Sebastian Thrun, tem 44 anos, olhos azuis, é professor de informática em Stanford, onde lidera o Laboratório de Inteligência Artificial.
Thrun está no TED porque criou, para o Google, o protótipo do carro que se dirige sozinho. Quando é sua vez de falar, ele explica que o carro já percorreu 140 mil quilômetros sem piloto pelas ruas da Califórnia e, na sala, muitos têm um calafrio: "Espero ansioso pelo momento em que as gerações depois de nós vão olhar para trás e dirão como era ridículo que os seres humanos dirigissem carros". Mas, depois, Thrun escutou o discurso de Salman Khan decidiu deixar os carros para trás para demonstrar como era ridículo o fato de que a educação de qualidade, que é o pressuposto indispensável para imaginar um mundo melhor, fosse tão cara e reservada a tão poucas pessoas.
Nasceu assim o curso de Stanford que começa hoje. O professor Thrun não estará sozinho. Ao seu lado, estará Peter Norvig, 55 anos, cabelos brancos, um conjunto de camisas havaianas vestidas com desenvoltura, por muito tempo responsável pelos robôs da Nasa e, depois, chefe do setor de pesquisa da Google. Aqui, a Google tem um papel central, porque serão alguns instrumentos feitos em colaboração com o gigante da informática de Mountain View que tornaram possível a gestão de 140 mil estudantes ao mesmo tempo: as suas perguntas e as tarefas que terão que fazer a cada semana, durante dois meses, para obter, se passarem pelo exame final, um certificado de frequência com uma pontuação de avaliação.
Esse pedaço de papel não vai valer como uma graduação, mas as lições serão as mesmas de quem paga 50 mil dólares por ano. Há, naturalmente, um "pequeno probleminha" que Thrun e Norvig ainda não resolveram: ou seja, como impedir alguém de fazer os seus temas de casa no lugar de outro e, depois, avaliações finais exageradas. "Mas se superarmos esse obstáculo, a educação vai mudar para sempre". Vamos ver.
Enquanto isso, na manhã de hoje, tocou a primeira campainha. Naturalmente, é o trinado do Twitter: "A primeira lição foi carregada. Assistam-na e depois conversemos a respeito".
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