13 Setembro 2011
As perspectivas de uma guerra civil com fundamento religioso, na Síria, estão crescendo dia após dia, de acordo com muitos analistas do Oriente Médio. E, naturalmente, em um confronto que oporia sunitas, xiitas e alauítas, a minoria à qual a dinastia de Bashar al-Assad pertence e que rege o país há décadas, muitos se perguntam qual seria a posição e o papel dos mais de dois milhões de cristãos em um eventual conflito. E o exemplo do Iraque os leva a imaginar um futuro muito difícil, se não dramático.
A reportagem é de Marco Tosatti, publicada no sítio Vatican Insider, 12-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fontes oficiais informam que os mercadores libaneses de armas notaram, nas últimas semanas, um rápido aumento dos preços, que eles atribuem à crescente demanda do mercado negro sírio.
E Muhammad Rahhal, um dos líderes do Conselho Revolucionário dos comitês de coordenação sírio, declarou na semana passada ao jornal árabe-londrino Al-Sharqi al-awsat (O Oriente Médio), de uma forma brutal: "Tomamos a decisão de armar a revolução que em breve se tornará muito violenta, porque o que estamos enfrentando hoje é uma conspiração global que só pode ser respondida com um levante armado".
E alguns defendem que a Arábia Saudita, tranquilizada pelo fato de ter silenciado os seus próprios dissidentes, além dos do Bahrein e do Iêmen, está financiando amplamente os combatentes sunitas da Síria, para combater Assad e a sua aliança com o Irã.
O alauítas nunca foram considerados total e puramente muçulmanos pelos outros seguidores do Profeta, sunitas e xiitas. E o fundamentalismo islâmico esmagado em Hama por Assad-pai nos anos 1980, está renascendo com força. O próprios slogan das primeiras manifestações – "Deus, Síria, liberdade e só" – é indicativo nesse sentido. Assim como o que está acontecendo em Homs, uma cidade no coração da Síria, onde confrontos e repressão são mais duros.
Homs está se transformando em uma Beirute da guerra civil, fracionada com base religiosa, com ruas onde é perigoso passar se você não é da religião certa. Os alauítas tornaram seguras as ruas que levam às suas áreas residenciais, com postos de bloqueio "confessionais", porque temem um massacre, em uma Síria pós-Assad, assim como muitos cristãos, por outro lado.
Nessa perspectiva, é preciso ler a mensagem em que o patriarca greco-melquita católico, Gregório III (Laham), falando da "primavera árabe" e dirigindo-se de modo indireto ao presidente Bashar al-Assad, pediu "interação" entre o governo e as gerações jovens atualmente na oposição. O patriarca se dirigia aos muçulmanos sírios por ocasião da festa do "Fitr" (a "ruptura do jejum"), que conclui o mês do Ramadã.
Gregório III criticou a atitude dos governos árabes, assim como o dos americanos e europeus: "Nós esperávamos que, nessas circunstâncias trágicas, o mundo árabe se mexesse, ou seja, que os países árabes e muçulmanos convocassem uma cúpula depois da outra, para estudar as dores e as aspirações dos seus povos, e que houvesse interação com as revoluções das gerações jovens. Juntos, teriam que analisar as causas e os parâmetros dessas revoluções, as suas dimensões, as suas finalidades, os seus riscos e as oportunidades que podem representam para todos nós, em vez de deixar que forças estrangeiras – qualquer que seja a sua intenção – interfiram e se intrometam em nossos assuntos, ditando-nos as suas ideias, ameaçando os nossos governos, incitando os nossos presidentes à renúncia e à saída dos seus países, e infligindo a destituições e processos humilhantes àqueles que foram os símbolos dos nossos países árabes".
"O nosso mundo árabe precisa de uma revolução intelectual, espiritual e social", concluiu Gregório III, afirmando que essa revolução não deve ser violenta, não deve seguir o modelo que alguns meios de comunicação televisivos sugerem desde o início deste ano.
É uma mudança das posições decididamente pró-Assad mantidas até agora pela maioria dos cristãos sírios. E Samir Geagea, líder das Forças Libanesas, ecoa essa mensagem, para quem "a presença cristã na região não se baseia nos sistemas atuais. E se regimes fundamentalistas tomarem o poder, nos oporemos a eles como nos opusemos a alguns dos regimes atuais", uma referência clara ao governo sírio. "Se a presença cristã dependesse dos regimes ditatoriais, não existiríamos", concluiu.
Palavras corajosas, mas uma coisa é o Líbano, e outra a Síria, onde as deserções dos postos mais baixos do Exército estão se intensificando, e onde o uso das armas em manifestações antes pacíficas parece estar aumentando.
O regime também parece estar se preparando para um confronto. Assad assinou um acordo com o Irã para a construção de uma grande base militar no aeroporto de Latakia, que serviria como rota direta para o fornecimento de armas pesadas e de outros materiais do Irã.
Latakia, um porto no norte do país, é a "capital" alauíta da região. Em Latakia, foi particularmente dura a repressão dos palestinos e dos opositores. E há quem pense que o governo quer criar um enclave alauíta na região, se perdesse o controle de parte ou de todo o resto da Síria em um futuro conflito civil interconfessional, o que marcaria um fim tragicamente irônico do sonho pan-árabe do partido Baath, secular e socialista.
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Síria: ventos de guerra inter-religiosa? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU