16 Fevereiro 2013
Membros da congregação católica londrina irão se mudar para uma igreja em Mayfair que uma vez tomou distância de Oscar Wilde.
A reportagem é de Sam Jones, publicada no jornal The Guardian, 14-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Quase 116 anos atrás, Oscar Wilde, recém-libertado da prisão de Reading após dois anos de trabalho forçado, escreveu para os jesuítas da Farm Street Church, em Mayfair, pedindo-lhes para lhe conceder um retiro de seis meses. Não surpreendentemente, dado a sua condenação por acusações de sodomia e de grosseira indecência e sua subsequente desgraça, eles se recusaram.
No início do próximo mês, essa mesma igreja – a Igreja da Imaculada Conceição, em Farm Street, como ela é formalmente conhecida – vai abrir as suas portas a dezenas de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros católicos romanos, que foram exilados de uma igreja em West End, onde eles participavam da missa ao longo dos últimos seis anos.
No início de janeiro, Vincent Nichols, arcebispo de Westminster, anunciou que as missas quinzenais especiais para católicos LGBT na Igreja de Nossa Senhora da Assunção, em Warwick Street, deviam ser interrompidas. A decisão de acabar com as missas do Soho deixou muitos membros do rebanho de lá tristes e com raiva.
Nichols disse que a diocese estava feliz por oferecer cuidados pastorais para a comunidade LGBT através da celebração da missa na Igreja de Nossa Senhora da Assunção, mas o ensino da Igreja "sobre questões de moral sexual" manteve-se inalterado, apesar das recentes mudanças legais e sociais em torno da "atração ao mesmo sexo". Era a hora de uma nova fase, disse.
Ele também anunciou que a igreja de Warwick Street deveria ser entregue ao Ordinariato Pessoal de Nossa Senhora de Walsingham, o órgão criado há dois anos pelo papa para acolher no abraço da Igreja Católica Romana os anglicanos em desacordo com a posição da Igreja da Inglaterra acerca do clero feminino.
Renate Rothwell, uma antiga membro do rebanho do Soho, está preocupada sobre como eles irão se estabelecer em Farm Street, onde não haverá missas LGBT especiais. Alguns estão tão chateados com o tratamento que lhes foi dado que decidiram boicotar a igreja jesuíta.
"Eu me sinto decepcionada com a Igreja", disse. "É como construir uma casa sobre a areia. Nós construímos uma casa sobre a areia em Warwick Street, porque a doutrina da Igreja é o que é. Isso parece ter nos levado à beira do precipício, e agora eles estão fazendo isso na paróquia jesuíta... Quem pode dizer que, se nós nos tornarmos um incômodo para eles, eles não vão fazer o mesmo?"
Não que a congregação do Soho, que tem cerca de 150 pessoas, planeje se tornar um incômodo. Apesar dos protestos daqueles católicos que os acusam de tentar sequestrar a missa para os seus próprios fins ideológicos, de usar as Preces dos Fiéis para empurrar uma agenda LGBT e de planejar colonizar a sua casa nova em Mayfair, Rothwell disse que eles nunca procuraram mudar ou desafiar o ensino da Igreja.
"O primeiro acordo que fizemos foi de que não iríamos fazer campanha – e ficamos nisso", disse ela. "Era uma missa apropriada, e a liturgia estava de acordo com o ensino da Igreja. Nunca fizemos isso".
Chama a atenção a ausência de crítica aberta por parte de Nichols. O seu apoio anterior às missas do Soho e a resposta inequívoca em 2010 aos seus oponentes – "Qualquer pessoa de fora que esteja tentando fazer um julgamente sobre as pessoas que se apresentam para a comunhão realmente deve aprender a segurar a sua língua" – lhe valeram o gratidão de muitos membros da congregação do Soho.
Muito mais fácil de discernir é a raiva dirigida contra Roma, especialmente a Gerhard Ludwig Müller, que foi nomeado prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé em julho passado e que, afirma-se, tem sido veemente no sentido de interromper as missas.
"Eu acho que a Igreja Católica é muito homofóbica", disse Rothwell. "Eu não sei muito sobre as políticas, mas eu acho que Müller apenas seguiu a linha dura e disse: 'Não, eu quero que essas missas sejam encerradas'".
Mark Dowd, um dos organizadores das missas do Soho, é mais simpático a Nichols do que muitos dos católicos conservadores que repreenderam o arcebispo acerca das missas do Soho, chamando-o de tudo, de "infiltrado em uma missão para destruir o catolicismo como o conhecemos" até "lobo proverbial de mitra e báculo".
"Você poderia dizer que isso é terrível, você está dando essa igreja a esses ex-anglicanos muito de direita e tradicionais, e chutando os gays para fora", disse Dowd. "Mas os pobres velhos arcebispos sempre tem que jogar esses jogos onde eles têm um certo número de peças de xadrez para mover".
Às 17 horas deste domingo, dia 17 de fevereiro, os fiéis LGBT irão se reunir em Warwick Street para a sua última missa no Soho. Quinze dias depois, muitos irão participar da missa vespertina em Farm Street, onde serão acompanhado por Nichols. O que irá acontecer depois é uma incógnita.
Dowd, ao menos, está otimista com a nova casa do rebanho. "Oscar Wilde foi rejeitado, eles não queriam ser associados a ele", disse. "Agora, os jesuítas estão dizendo: 'Ok, está tudo bem".
"Mas nenhum de nós é tão exótico quanto Oscar Wilde. Eu tenho medo."
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Fiéis LGBT exilados se preparam para último missa no Soho, Inglaterra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU