23 Setembro 2013
«Havia um homem rico que se vestia de púrpura e linho fino, e dava banquete todos os dias. E um pobre, chamado Lázaro, cheio de feridas, que estava caído à porta do rico. Ele queria matar a fome com as sobras que caíam da mesa do rico. E ainda vinham os cachorros lamber-lhe as feridas. Aconteceu que o pobre morreu, e os anjos o levaram para junto de Abraão. Morreu também o rico, e foi enterrado. No inferno, em meio aos tormentos, o rico levantou os olhos, e viu de longe Abraão, com Lázaro a seu lado.
Então o rico gritou: "Pai Abraão, tem piedade de mim! Manda Lázaro molhar a ponta do dedo para me refrescar a língua, porque este fogo me atormenta’.
Mas Abraão respondeu: "Lembre-se, filho: você recebeu seus bens durante a vida, enquanto Lázaro recebeu males. Agora, porém, ele encontra consolo aqui, e você é atormentado. Além disso, há um grande abismo entre nós: por mais que alguém desejasse, nunca poderia passar daqui para junto de vocês, nem os daí poderiam atravessar até nós’.
O rico insistiu: "Pai, eu te suplico, manda Lázaro à casa de meu pai, porque eu tenho cinco irmãos. Manda preveni-los, para que não acabem também eles vindo para este lugar de tormento’.
Mas Abraão respondeu: "Eles têm Moisés e os profetas: que os escutem!’
O rico insistiu: "Não, pai Abraão! Se um dos mortos for até eles, eles vão se converter’. Mas Abraão lhe disse: "Se eles não escutam a Moisés e aos profetas, mesmo que um dos mortos ressuscite, eles não ficarão convencidos’.»
(Correspondente ao 26º Domingo do Tempo Comum, ciclo C do Ano Litúrgico).
O comentário é elaborado por Ana Casarotti e Cristina Giani, Missionárias de Cristo Ressuscitado.
O evangelho deste domingo descreve nas suas primeiras linhas a realidade de nossa sociedade atual. Na qual a desigualdade social e a insensibilidade diante do sofrimento de nossas irmãs/ãos estão marcadamente presentes. Lembremos a atitude e as palavras do Papa Francisco em Lampedusa.
Palavras do Papa na missa em Lampedusa: "Peçamos ao Senhor a graça de chorar sobre a nossa indiferença, sobre a cruelidade que há no mundo, em nós, também naqueles que no anonimato tomam decisões socioeconômicas que abrem a estrada para dramas como este".
A parábola de hoje é um comentário do "ai de vós os ricos" do sermão da Montanha (Lc 6,24), que ressoa profeticamente até nós.
O homem rico e o pobre Lázaro convivem em nosso país, nosso bairro, nossa comunidade. Podemos colocar-lhes diferentes rostos e nomes...
Que rápido esquecemos de que todos somos filhos de um mesmo Deus e de uma mesma Mãe terra, dos quais saímos e aos quais todos sem exceção voltaremos. "Nu saí do ventre da minha mãe, e nu para ela voltarei" (Jó 1,21).
O vírus do acúmulo tem infectado o coração da humanidade fazendo com que nossa passagem pela terra se converta num possuir cada vez mais riquezas materiais, intelectuais e até afetivas só para nós mesmos! Pareceria que as palavras que partilham, solidariedade, serviço, foram excluídas do "vocabulário" moderno.
Situados neste contexto prestemos atenção ao que acontece com o homem rico e com o pobre Lázaro quando são visitados pela "irmã morte", como a chamava São Francisco.
A situação se inverte. O pobre participa do banquete eterno e o rico sofre os tormentos que ele mesmo se causou levando uma vida individualista e egoísta. Um abismo volta a separá-los, e agora quem estende a mão mendigando salvação é o homem rico!
Através desta parábola Lucas nos mostra como o ser humano "constrói" sua própria eternidade. O jeito de vivermos nesta terra é o pré-anuncio do céu que viveremos.
E aqui está, tal vez, uma das grandes mensagens desta parábola: a capacidade humana de optar e decidir por si própria.
Nós acreditamos num Deus que é Amor, que por amor cria e também por amor sustenta sua criação. Mas não é um Deus que manipula as leis da natureza e muito menos nossa própria vida. Por que nos ama nos deixa livres, só assim poderemos corresponder ao amor!
Fica conosco, no nosso mundo, na nossa história, na nossa própria vida, como diz o salmista sua graça nos circunda (Sl 139), mas Ele é respeitoso de nossa liberdade, espera pacientemente que O acolhamos.
O texto de hoje mostra claramente que acolher a Deus passa pela compaixão e solidariedade com os que sofrem, com os pobres. São João o dirá fortemente na sua carta: "Se alguém diz: «Eu amo a Deus», e no entanto odeia o seu irmão, esse tal é mentiroso; pois quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê" (1Jo 4, 20).
E por isso que o homem rico não vai para junto do Pai Abraão, a dureza de seu coração o fechou sobre si próprio, o isolou das pessoas e por isso ao morrer só encontra solidão, ninguém o recebe.
Mas parece que seu coração continua latindo e se lembra de seus familiares, de seus irmãos. Quer adverti-los para que mudem de vida, para que se convertam enquanto há tempo.
A resposta que dá o evangelho derruba por terra toda visão de um Deus milagreiro ou de manifestações especiais. Basta a criação, a vida, as escrituras que nos revelam do próprio Deus. Basta a presença do Ressuscitado atuante no meio de nós.
Em outras palavras o problema não está em Deus, Ele não está ausente... é o eterno presente.
Somos nós que temos que perceber sua presença nas mais variadas formas de vida e acolhê-lo, fazendo-nos servidores de todos/as. Colocando nossos bens (nossa vida é nosso bem maior) para a construção de um mundo de filhos e filhas de Deus Pai e Mãe de toda a criação.
Hoje vi um pouco do céu
quando o pobre Lázaro chegou.
Dos braços de Jesus
no seio do Pai renasceu,
o cobriram de beijos e
ungiram sua cabeça e pés.
E aquele que tanto sofreu nesta vida
a alegria não podia conter!
Onde está morte tua vitória?
Onde está morte teu aguilhão?
Aqui é só vida em abundância
triunfo e eternidade do Amor!
Referências
KONINGS, Johan. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindis, 1981.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Compaixão ou indiferença? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU