22 Julho 2014
Capa do relatório anual 2011 da Conferência dos Bispos Católicos dos EUA sobre a implementação da Carta para a Proteção das Crianças e Jovens.
A reportagem é de Kevin Clarke, publicada pela revista America, 18-07-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Nos últimos anos a Arquidiocese de St. Paul e Minneapolis vem passando por auditorias como parte de um protocolo da Carta de Dallas, documento da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos – USCCB (sigla em inglês) que busca prevenir o abuso sexual infantil. A mesma auditoria acontece com praticamente todas as demais dioceses no país. Por parte dos autores profissionais comissionados pela USCCB, a arquidiocese foi considerada, tal como a maioria das demais dioceses, como estando me plena conformidade com os artigos da Carta relativos à resposta dada aos relatos de abuso e aos esforços realizados em vista da prevenção de abusos. Na verdade, a última vez que a diocese mereceu ser chamada atenção por estar fora de alguns dos artigos da Carta já faz anos.
Mas um testemunho recentemente divulgado de um depoimento juramentado em St. Paul oferece “motivos para se preocupar” quanto à eficácia dos procedimentos de auditoria dos bispos, reconheceu o presidente de um dos comitês nacionais dos bispos americanos, Francesco Cesareo, também reitor da Assumption College em Worcester, no estado de Massachusetts. “Se o que está sendo descrito no depoimento juramentado estiver correto e, no entanto, a diocese for avaliada como estando em conformidade com os artigos, então há motivos para preocupação”, disse em entrevista à revista America.
O testemunho de Francesco Cesareo a que se faz referência foi dado em 14 de julho por Jennifer M. Haselberger, ex-chanceler da arquidiocese e canonista que por cinco anos foi assessora e arquivista da própria arquidiocese. Uma ação movida em nome de um homem que diz ter sido abusado sexualmente quando criança por um padre diocesano na década de 1970 alega que a Arquidiocese de St. Paul e Minneapolis bem como a Diocese de Winona criaram transtornos públicos ao manter em segredo informações sobre padres abusadores. Grande parte do testemunho presente no depoimento de Jennifer Haselberger pareceria dar sustentação a esta conclusão. Em seu longo testemunho, que forneceu um raro olhar interno nas tomadas de decisão envolvendo acusações de abuso, Haselberger acusou altos líderes eclesiais de terem uma “atitude cavalheiresca” para com a segurança das crianças e contradisse aspectos de um testemunho juramentado de ex-representantes da Igreja, Peter Laird e Kevin McDenough, além do advogado da arquidiocese Andrew Eisenzimmer. Jennifer Haselberger também alegou que, durante o tempo em que trabalhou na arquidiocese, aos auditores contratados pela USCCB “não eram sequer permitido acesso aos nossos registros sobre os padres para determinar se as informações combinavam com o que relatávamos”.
Ela acrescenta: “Caso tivessem acesso a estes documentos, teriam descoberto que as informações não correspondiam. No dia em que me desliguei, em abril de 2013, sete anos após a adoção da Carta, a arquidiocese ainda não tinha assegurado os ‘três aspectos essenciais (verificação dos antecedentes, formação para segurança no trabalho [visando prevenir ou identificar abuso infantil] e assinatura do Código de Conduta) para todos os seus padres diocesanos”.
Segundo Francesco Cesareo, o processo de auditoria iniciado após a promulgação da Carta de Dallas 2002 está sob a constante revisão de um comitê permanente, e está planejada uma reavaliação, do início ao fim, quanto à sua eficácia. Nas avaliações mais recentes da Arquidiocese de St. Paul-Minneapolis “nada que surgiu na auditoria indicou que a diocese não seguia os protocolos”, disse Cesareo.
Caso ficar provado que as acusações incluídas no depoimento de Haselberger tiverem méritos, disse, haverá a preocupação de que outras dioceses poderão, do mesmo modo, ter questões que não estejam sendo descobertas através do atual processo de auditoria. As auditorias anuais baseiam-se em relatos e registros das próprias dioceses. Segundo Cesareo, a abrangência e os procedimentos relativos a estes registros variam de diocese para diocese.
Cesareo disse que nos próximos meses o comitê de auditoria irá se perguntar se em sua forma atual o instrumento de auditoria está sendo é efetivo. “Talvez precisemos dar uma olhada neste instrumento. Será que precisamos mudá-lo para fazê-lo um instrumento mais útil?”
Francesco Cesareo acrescentou que o comitê de auditoria certamente irá se perguntar se “há algum modo para que as auditorias sejam melhoradas de forma que se possam obter as informações que [atualmente] não estamos conseguindo ter (...) e para que, desse modo, não tenhamos situações como esta”.
Problemas profundos dentro da Arquidiocese de St. Paul e Minneapolis tornaram-se evidentes em maio de 2013 quando o seu contador se declarou culpado de um roubo envolvendo mais de 670 mil dólares dos fundos da igreja local. Segundo seu testemunho, após frequentemente lutar contra autoridades arquidiocesanas sobre a forma como lidavam com padres problemáticos, Jennifer Haselberger renunciou em abril de 2013 e foi a público apresentar suas inquietações.
Entre as acusações presentes em seu depoimento, diz ter descoberto em 2008 que a arquidiocese não tinha verificado os antecedentes da maioria dos padres desde o começo de 1990 e que “cerca de 20” de 48 padres sob restrições por causa de má conduta sexual com adultos e crianças ainda estavam no ministério. Ela também diz que práticas questionáveis, incluindo a recusa em relatar possíveis atos criminosos por padres diocesanos, continuaram até 2013.
Um porta-voz da arquidiocese se recusou a responder a questões relacionadas às acusações presentes no depoimento. Em nota publicada em seu site, a arquidiocese disse que “as lembranças de Haselberger nem sempre são partilhadas por outros de dentro da arquidiocese”, mas que a “experiência dela sublinha a importância de um diálogo e de uma reforma construtivos que almejam garantir a segurança das crianças”.
Desde a renúncia de Haselberger, “demos início à implementação das Recomendações da Força-Tarefa para Normas Ministeriais e Segurança Ambiental que abordam algumas das preocupações que ela levantou”, disse a arquidiocese, acrescentando logo em seguida: “Continuamos dando passos concretos em direção a uma maior transparência e responsabilização quanto à proteção das crianças ao mesmo tempo em que continuamos oferecendo esperança e cura às vítimas”.
Esta força-tarefa voluntária arquidiocesana se encontrou na esteira das revelações de Haselberger, na época de sua renúncia. O seu relatório final, publicado no final de março de 2014, “revelou graves deficiências na implementação da Carta de Dallas por parte da arquidiocese”. A força-tarefa descobriu que demasiada autoridade se concentrava em tão poucas mãos, que a comunicação da diocese “com os fiéis, com o público, com os meios de comunicação, e com as vítimas de padres abusadores a respeito do abuso sexual de menores” era inadequada e que “os registros mantidos pela arquidiocese quanto ao desempenho e à condução de seu clero não é abrangente nem é feito de forma coordenada, baseando-se em sistemas desatualizados”.
A força-tarefa também concluiu que a arquidiocese “não tem um programa comprometido de auditoria e monitoramento para avaliar, testar e monitorar suas conformidades com políticas e procedimentos projetados para prevenir e detectar abusos sexuais de menores”. A força-tarefa apresentou uma série de recomendações no sentido de reformar e simplificar os procedimentos de relatar, comunicar e documentar os compromissos da arquidiocese.
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Até que ponto é efetiva a auditoria anual da Conferência dos Bispos americanos sobre a crise dos abusos sexuais? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU