08 Março 2012
Para o oceanólogo, rodovias, ferrovias, dutos, torres de energia, entre outros, são fundamentais para o crescimento econômico de qualquer país.
Confira a entrevista.
“As estradas geram um impacto sobre a grande maioria das espécies, seja por atropelamento ou por efeitos marginais que podem chegar a mais de 2000 metros”. Essa é a constatação do oceanólogo Alex Bager, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. Bager afirma que a perda de biodiversidade por efeitos de empreendimentos lineares é o maior impacto antrópico, gerando perda de biodiversidade no Brasil, “e esse impacto irá se ampliar nos próximos anos”.
De acordo com o pesquisador, devemos lembrar que são raros os casos de rodovias abandonadas. “Ao contrário, normalmente elas aumentam em pistas, fluxo de veículos… e com isso aumentam os impactos, sejam eles diretos (como atropelamento) ou indiretos (como afugentamento da fauna impedindo trocas gênicas). A lista de impactos é enorme, alguns deles são: poluição química, poluição sonora, atropelamento, introdução de espécies exóticas, caça, afugentamento, gerando mudança na estrutura de populações e comunidades, entre outros”.
Alex Bager (foto) é professor no Programa de Pós-Graduação em Ecologia Aplicada (setor de ecologia) da Universidade Federal de Lavras – UFLA, em Minas Gerais. É coordenador do Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas. Oceanólogo formado pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG, tem mestrado e doutorado em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Suas linhas de pesquisa são: ecologia de estradas, manejo populacional e ecologia de vertebrados.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como define a área de estudos ecologia de estradas e como ela se relaciona com os aspectos social, econômico e ambiental?
Alex Bager – A ecologia de estradas é um segmento da ecologia aplicada que estudas as relações da implantação e manutenção de empreendimentos lineares na biodiversidade, tendo uma forte relação com a ecologia de paisagem e ecologia de populações e comunidades. Possivelmente a ecologia de estradas seja um dos segmentos da ecologia com maior inserção no contexto social e econômico, sem precisar a óbvia relação com a questão ambiental. No que se refere aos aspectos sociais e econômicos, rodovias, ferrovias, dutos, torres de energia, entre outros, são fundamentais para o crescimento econômico de qualquer país. Rodovias permitem a ocupação humana, transporte de bens, atividades de turismo, entre outras tantas, mas esses mesmos benefícios vêm associados a problemas tais como: fragmentação e destruição de hábitats, caça, atropelamento, etc. A ecologia de estradas busca estudar essas relações e identificar formas de minimizar tais impactos.
IHU On-Line – Quais os principais impactos para a biodiversidade local provocados pelos empreendimentos lineares (rodovias e ferrovias)?
Alex Bager – Os impactos podem ser agudos ou crônicos. Os agudos se referem à destruição imediata de hábitat quando da construção destes empreendimentos, e os crônicos são os problemas de longo prazo. Devemos lembrar que são raros os casos de rodovias abandonadas. Ao contrário, normalmente elas aumentam em pistas, fluxo de veículos… e com isso aumentam os impactos, sejam eles diretos (como atropelamento) ou indiretos (como afugentamento da fauna, impedindo trocas gênicas). A lista de impactos é enorme, alguns deles são: poluição química, poluição sonora, atropelamento, introdução de espécies exóticas, caça, afugentamento, gerando mudança na estrutura de populações e comunidades, entre outros.
IHU On-Line – Em que medida o crescimento econômico brasileiro interfere na questão da ecologia de estradas?
Alex Bager – Como dito acima, quanto maior a densidade de rodovias maior o impacto à biodiversidade. Dessa forma, o crescimento econômico, que implica no aumento da malha viária, é um fator presente em todos os debates de ecologia de estradas.
IHU On-Line – Qual a especificidade da ecologia de estradas no Brasil em relação a Portugal e Argentina?
Alex Bager – Nosso crescimento e estabilidade econômica. Esses outros dois países, apesar de origens distintas, estão em condições econômicas piores do que o Brasil. Por outro lado, hoje podemos dizer que somos forte quanto à ampliação das ações em ecologia de estradas. Uma demonstração disso é a criação do Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas, com um formato inexistente em qualquer outro local do mundo. Outro ponto importante é a grande importância dada pelos órgãos governamentais, estaduais e federais, aos trabalhos que estamos desenvolvendo.
IHU On-Line – O que mais impressiona nos estudos de caso trazidos no livro?
Alex Bager – Pode-se dizer que o principal fato é a constatação de que desconhecemos o real impacto das rodovias na biodiversidade brasileira. Devemos lembrar que outros impactos antrópicos são seletivos como, por exemplo, a caça, onde se busca uma ou poucas espécies, sempre no intuito de captura de animais mais velhos. As estradas geram um impacto sobre a grande maioria das espécies, seja por atropelamento ou por efeitos marginais que podem chegar a mais de 2 mil metros. Dessa forma, posso afirmar que a perda de biodiversidade por efeitos de empreendimentos lineares é o maior impacto antrópico, gerando perda de biodiversidade no Brasil, e esse impacto irá se ampliar nos próximos anos.
IHU On-Line – Que dados você pode trazer sobre a mortalidade de vertebrados em rodovias no Brasil?
Alex Bager – Estamos trabalhando em uma análise nacional; esperamos ter resultados palpáveis ainda este ano, mas existem regiões relativamente bem estudadas, como a Estação Ecológica do Taim e o Pantanal, que demonstram que a perda de animais por ano é de milhões de exemplares.
IHU On-Line – Como a construção de estradas impacta na vegetação, na paisagem, e como é feita a recuperação de áreas degradadas?
Alex Bager – O mesmo processo de fragmentação que impacta a fauna impede a recomposição da vegetação, altera condições climáticas como temperatura, vento, umidade, o que altera a comunidade da vegetação próxima às rodovias.
IHU On-Line – O que caracteriza as grandes estradas amazônicas em relação aos impactos à biodiversidade local?
Alex Bager – Como apresentado pelo Dr. Philip, a presença de rodovias na Amazônia é questionável já pela sua concepção. O governo afirma que elas visam reduzir custos de transporte, mas os dados apresentados no capítulo não os confirmam. Outro ponto é que qualquer planejamento de rodovias implica em rodovias secundárias, iniciando o processo de ocupação desordenada.
IHU On-Line – Qual a especificidade da ecologia de estradas no pampa brasileiro, principalmente em relação à perda de répteis por atropelamentos?
Alex Bager – A questão de répteis e anfíbios é muito sensível. Vários trabalhos em outros países têm demonstrado que esses grupos são os mais impactados por rodovias e, no Brasil, os delineamentos amostrais não consideram esses grupos. Isso faz com que pareça que a mortalidade é baixa e não preocupante. Outro ponto é que tais grupos não geram um apelo da comunidade em geral, porque a maioria das pessoas não gosta de cobras, lagartos e sapos. Nós do Centro estamos tentando incentivar ao máximo os trabalhos realizados com os grupos e obter um cenário mais realista daquilo que está acontecendo no Brasil.
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Ecologia de Estradas: alternativa para diminuição de impactos ambientais. Entrevista especial com Alex Bager - Instituto Humanitas Unisinos - IHU