07 Abril 2010
A partir da ideia da sociedade do risco, a professora Arlete de Arruda elaborou a sua tese intitulada Análise dos processos decisórios em face dos riscos tecnológicos: a percepção de riscos, as consequências dos acidentes e os gestores públicos na cidade de Canoas. Assim, ela estudou os riscos que a cidade de Canoas (RS) vive em função da relação com questões urbanas que podem trazer grandes problemas para os cidadãos. “Canoas tem uma refinaria, que recebe a nafta, e tem unidades termoelétricas que vem da Bolívia e indústrias de onde saem os dutos que vão para o Pólo Petroquímico e para outras empresas. De lá, sai também a ferrovia que vai transportando todos os produtos derivados de petróleo e também gasolina para os estados da região sul”, explica Arlete.
Na entrevista que concedeu à IHU On-Line por telefone, Arlete explicou a teoria da sociedade do risco, a constituição dos processos decisórios, as possíveis consequências e a convivência com as indústrias. “A área da saúde é frágil em Canoas, porque, em nenhum momento, a Secretaria de Saúde e os representantes dos hospitais estiveram na Comissão de Defesa Civil, discutindo as ameaças químicas locais. Entendemos que o setor da saúde está preocupado com situações epidêmicas que surgem, mas essa situação de risco, onde o setor não é tão presente, é uma ameaça.”, contou.
Arlete Aparecida Hildebrando de Arruda é socióloga formada pela Universidade do Planalto Catarinense, com especialização em Administração para o Desenvolvimento pela Universidad Nacional Autónoma de México. É mestre em Antropologia, Política e Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutora em Ciências Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Você pode nos explicar porque Canoas está inserida dentro da ideia de sociedade do risco?
Arlete de Arruda – Para Giddens [1], dentro do sistema capitalista, algumas cidades são “cidades-estação”. Em minha tese, Canoas se situa dentro deste modelo. Ela é uma das cidades que interliga o sistema químico, petroquímico e todos os derivados de petróleo e gás por equipamentos que são os dutos. E Canoas, nesse sentido, é uma das estações com dutos de gás, por exemplo. O sistema capitalista se move com vários tipos de energia, mas esse sistema é um grande consumidor de produtos químicos e derivados de petróleo. Por isso, Canoas é uma cidade-estação, uma sede (ou sub-sede) de toda essa movimentação do próprio sistema capitalista, em relação à questão dos produtos petroquímicos.
Canoas tem uma refinaria, que recebe a nafta, e tem unidades termoelétricas que vêm da Bolívia, e indústrias de onde saem os dutos que vão para o Pólo Petroquímico e para outras empresas. De lá, sai também a ferrovia que vai transportando todos os produtos derivados de petróleo e também gasolina para os estados da região sul.
IHU On-Line – Como a construção de processos decisórios na cidade influenciam, dentro do contexto da sociedade do risco, a atuação da sociedade?
Arlete de Arruda – Este é um processo complexo. Os produtos perigosos são diferentes de outros tipos de produtos. Sabe-se que são perigosos, mas eles têm uma invisibilidade. No caso dos produtos derivados do petróleo, vê-se o equipamento e as empresas grandiosas. Mas, as suas “veias”, “pulsações”, chamadas de estações, válvulas, postos, rede de dutos, têm uma visibilidade que precisa ser decodificada, traduzida, e aí sim, ser desvendado o tipo de risco.
Por isso, a sociedade fica sem saber o tipo de ameaça e o que pode acontecer caso esses equipamentos não funcionem bem, pois é difícil conhecer a linguagem técnica e especializada desse complexo industrial. Por um lado, existe a ideia da confiança, de que tudo está sendo feito corretamente. Por outro, há um distanciamento social. Mesmo as associações ou pessoas que querem questionar a respeito não acham o canal. Mas isso não quer dizer que não haja temor ou mitos em relação aos equipamentos sócio-técnicos existentes.
Mitos e temores
Um dos mitos é que Canoas está em cima de um barril de pólvora. O meu estudo mostra que a sociedade está preocupada com isso, mas resolvem da forma fatalista, paternalista ou por delegação à prefeitura ou à Petrobras o cuidado com “esses” equipamentos. Eles moram lá, pensam que tudo pode ir pelos ares a qualquer momento, mas não acham os caminhos para desmanchar esse mito.
A forma que encontramos foi através da Comissão de Defesa Civil do município. Durante dez anos, os representantes e a direção da mesma realizaram um processo de desconstrução do mito e, ao mesmo tempo, acharam processos que levassem a uma garantia de confiança, não só passiva, mas ativa. Isso precisa nascer, sobretudo, em cidades com esse tipo de produtos perigosos, onde as garantias, o tempo de validade e a manutenção dos equipamentos precisam ser apontados. Na Comissão de Defesa Civil, iniciou-se um processo de conhecimento, primeiro, dos programas, que procuram desvendar o mundo industrial.
Na indústria química, ocorreram muitos acidentes de grande repercussão no mundo, como Chernobil [2], Seveso, e outros onde aconteceram vazamentos e explosões que trouxeram muitas mortes e enfermidades. A partir disso, surgiram três programas: Um se chama Programa de Alerta e Preparação às Populações para Emergências Químicas (Apell). Outro programa que surgiu foi o Atuação Responsável, que é da indústria química, deve desenvolver-se através de tipos de código de conduta em relação ao meio ambiente e à comunidade.
Há um terceiro programa que se chama Plano de Auxílio Mútuo (Pam). Este é muito importante, pois, trata-se de um pacto assinado entre as empresas de mesma área, ou com produtos semelhantes, acrescido do corpo de bombeiros, da Comissão de Defesa Civil e com as várias secretarias do município, onde se propõe quando houver um acidente ampliado, que saiu de dentro da empresa para fora, agirem em conjunto. Quando é interno, a empresa até consegue dar conta, mas, quando extrapola, precisa-se de um volume muito grande de espuma, de areia e de formas de contenção desse tipo de acidente. Junto a isso, há o Plano de Evacuação, planejado com a Comissão de Defesa Civil, e as várias secretarias e o corpo de bombeiros da região. Em caso de um grande acidente, pode se saber como se comportar para não haver mais tumulto no entorno, comoção coletiva e pânico na população local.
Esses procedimentos já existiam nas indústrias e foram levados, discutidos e executados pela Coordenadoria Municipal de Defesa Civil. Chegou-se à conclusão de que a cidade não vive esse tipo de perigo em sua totalidade. Então, foi feito um mapeamento dos dutos e a localização de áreas críticas. Nestas áreas, se fez uma pesquisa acerca da densidade demográfica, do trânsito de produtos perigosos e da localização de empresas. A partir daí, o mito se recompõe. Há áreas com ameaças químicas, mas são identificáveis e preveníveis.
A coordenação da defesa civil levou o mapeamento a 36 escolas destas áreas críticas. Há simulações e realiza-se um trabalho de reconhecimento, por tipo de risco por área crítica, e preparo para a emergência.
IHU On-Line – A população local tem noção desses riscos?
Arlete de Arruda – Nas áreas críticas, a população, de um lado, tem temor, e, de outro, uma certa delegação desses problemas para a Petrobras. As opiniões são divididas entre: as pessoas exageradamente temerosas ou as indiferentes como aqueles que fazem edificações e destroem as sinalizações na área de domínio dos dutos, mesmo com os avisos. Alguns colocam lixo na área. Ultimamente, as empresas responsáveis têm feito um trabalho de visitação e sondagem nestas áreas.
Esse cuidado também precisa ser adotado por parte das imobiliárias e construtoras. Tiramos várias fotos onde a sinalização com postes amarelos, na altura de um metro, estão sendo retirados por tratores para novos lançamentos imobiliários. Os acidentes em dutos, muitos deles em nível mundial, foram provocados por tratores ou retro-escavadeiras que os perfuraram. A Comissão de Defesa Civil, inclusive, fez um trabalho com os tratoristas da prefeitura para quando estiverem fazendo melhorias nas ruas terem cuidado e obedecerem à sinalização. Atualmente, a população sabe que existem riscos nestas áreas críticas devido ao trabalho educativo realizado nestas áreas, com os escolares, a direção e professores.
IHU On-Line – Quais são os principais riscos que Canoas corre?
Arlete de Arruda – Fiz um levantamento inicial dos tipos de ameaças que existiam no município. Isso foi há dez anos. Pesquisei no jornal local que tipos de risco mais aconteciam, usando o modelo internacional que divide riscos em epidemiológicos, naturais, sociais e tecnológicos. Neste material apareceu a questão das inundações, mas também as soluções que foram criadas naquela época, como a criação de casas-bombas e diques, para a contenção dos rios Jacuí e Guaíba. As áreas de maior tensão social são os bairros Guajuviras e Mathias Velho.
Acidentes
Hoje, eu teria de refazer esse mapeamento. Como é uma cidade que vive um processo muito rápido de urbanização, ela atraiu muitas empresas, tanto no setor de varejo como industrial. A escolha de analisar mais o risco tecnológico foi uma decisão da própria comissão para aquele momento. Havia ocorrido um acidente numa das empresas junto à margem do rio, que causou grande pânico, porque as explosões atingiam até sessenta metros de altura. Para aquele período, foi importante trabalhar a questão desse tipo de risco. Porém, penso que hoje Canoas teria que fazer uma conjugação entre as ameaças e as possibilidades urbanas.
Canoas é um município que tem muito pouco território rural. No único local, há boatos de construção de um presídio. É de se perguntar se a cidade irá ficar sem área verde. Sabe-se que todo município precisa de uma área de respiração. Essa é uma das questões para atualizarmos esses dados. Os demais também precisam ser reavaliados devido às rápidas mudanças industriais que ocorreram nas organizações.
IHU On-Line – Ao perceber os riscos que esta cidade corre, que indícios você apresenta para trazer, em sua tese, a ideia de consequência dos acidentes?
Arlete de Arruda – Analisei somente um acidente, o mais conhecido ocorreu em 1999. As consequências, do ponto de vista da empresa, podem ser resolvidas na medida em que tenha um seguro ou ajuste de conduta em relação à Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM). Porém, uma das consequências para a população é o trauma, o temor de algum momento você abandonar sua casa. Infelizmente, não há preparo para isso. Essas consequências são chamadas de psicossociais, e ocasionam a síndrome pós-traumática, com várias doenças psicossomáticas. Neste caso de 1999, não atingiu os operários, no entanto, uma outra empresa, a Nova Protecin, viveu um acidente onde houve uma explosão interna e seis trabalhadores morreram, em 2007, nem sempre o risco quer dizer morte, mas pode-se trazer ameaças ao meio ambiente. Esses são difíceis de serem calculados os efeitos.
Esse tipo de acidente não acontece todo dia, mas pode haver um derramamento de produtos na água ou uma explosão e o produto pode ficar no organismo das pessoas e aparecer ao longo do tempo, em forma de enfermidades e transtornos aos afetados.
IHU On-Line – No caso de Canoas, quais os impactos da indústria nos processos decisórios dos gestores públicos?
Arlete de Arruda – O que percebi é que a empresa, na medida em que traz empregos e royalties, deveria ser questionada sobre as inseguranças que serão fabricadas nesse espaço. A legislação brasileira diz que deve haver uma audiência pública, mas geralmente nestas ocasiões não vão as pessoas que estão interessadas. Também dá a impressão que o poder público cumpre apenas uma formalidade, e não cobra as respostas das perguntas feitas por associações de moradores, conselhos de engenharia e ou de biologia e sindicatos.
Participei de uma audiência onde esses representantes estavam presentes e levaram perguntas muito pertinentes sobre a localização da construção e a preocupação com o meio ambiente, mas nenhuma dessas questões foi considerada. Geralmente, o impacto tem seu lado positivo, como gerar emprego e vantagens para a cidade, mas este impacto poderia ser gerado com zelo para com a natureza e pela comunidade do entorno, através de processos de alerta, de planos de evacuação e de atendimento às emergências, para haver uma segurança química local. As decisões sobre onde são instaladas essas empresas, geralmente, já foram estabelecidas no nível superior de governos federais ou outros. No caso do Gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol), foi decidido entre os ministérios de Minas e Energia e das Relações Exteriores, entre a Bolívia e o governo brasileiro. O traçado já estava estabelecido, passando por vários estados e finaliza em Canoas, que calibra e distribui para parte sul do Brasil.
Observamos que pela forma em que são tomadas as decisões, o município fica com pouca potência para discutir. Mas, havendo acidente, será no local, onde o sofrimento será da comunidade e os órgãos públicos ficam com a incumbência de atendê-los. Aí, um município se preparando, sabendo que deve exigir esses programas, fortalecendo seu órgão de defesa civil e seu corpo de bombeiros consegue dialogar com essas grandes empresas, exigindo um maior cuidado para com a comunidade. Esses impactos que são positivos, por um lado, sempre devem ser acompanhados com zelo. Também deveriam aparelhar os órgãos que são nossos olhos e ouvidos, o corpo de bombeiros, a FEPAM, a Comissão de Defesa Civil e o Ministério do Trabalho. Nós, a comunidade, devemos nos questionar e exigir, do aparato do Estado, formas com que se cumpra aquilo que a legislação diz, para que aumente nossa segurança através desses “nervos” do governo.
IHU On-Line – Como a senhora entende, principalmente no que diz respeito à saúde, a inserção das novas tecnologias no espaço metropolitano?
Arlete de Arruda – Percebemos, todos os dias, as mudanças tecnológicas. Os estudos da Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz) mostram que, seguidamente, há transformações tecnológicas dentro das indústrias, sobretudo nas de produtos perigosos. Porém, essas indústrias não fazem a modificação em toda sua extensão, então os trabalhadores têm de se adaptar à mudança tecnológica e, ao mesmo tempo, permanecer dentro de determinados equipamentos antigos. Este ajuste produz o que se chama de ajuste frágil. Essas novas tecnologias, para os estudos da FioCruz, produzem uma tensão no trabalhador, já que ele tem que entendê-las. Produz, também, vazamentos que afetam a saúde do trabalhador e, sobretudo, a ameaça de risco.
O Ministério do Trabalho, no Rio Grande do Sul, fiscaliza para proteger os trabalhadores. Porém, nem sempre o que o Ministério do Trabalho faz de intervenção nas empresas é cumprido pelas mesmas. Elas recorrem e voltam a atuar com os mesmos problemas. Não há uma interligação entre os órgãos de poder para a defesa da saúde coletiva. Aquela empresa onde houve uma explosão, e que matou trabalhadores, recebeu uma visita do Ministério do Trabalho na semana anterior, onde foi avisado sobre os riscos que eles corriam. Mas a empresa recorreu ao judiciário e voltou a funcionar.
Diria que a área da saúde é frágil em Canoas, porque, em nenhum momento, a Secretaria de Saúde e os representantes dos hospitais estiveram na Comissão de Defesa Civil, discutindo as ameaças químicas locais. Entendemos que o setor da saúde está preocupado com situações epidêmicas que surgem, mas essa situação de risco, onde o setor não é tão presente, é uma ameaça.
As novas tecnologias são muito exigentes. Deveríamos estar atentos a isso porque há uma mudança gerencial dentro das indústrias. Desde que surgiu a ideia de re-engenharia, os setores de manutenção de equipamentos e de segurança, por exemplo, passaram por uma mudança: a terceirização do serviço. Levantei em minha pesquisa o perigo da terceirização através da bibliografia e da entrevista com os sindicatos. Se existe um equipamento novo, nem todos os trabalhadores recebem treinamento, e se o serviço de segurança interna for terceirizado, haverá mais risco. Então a empresa terceirizada não irá fazer um grande investimento de cursos nestes funcionários porque não se sabe se aquela grande empresa irá renovar o contrato com eles. Há um improviso entre esses novos funcionários. Isso provavelmente aumenta o risco, porque eles não são funcionários de carreira. Como a terceirizada, em muitos casos, não dá conta de fazer todo o serviço, há uma subcontratação, a chamada, quarteirização. Houve até um estudo que vimos, feito na Unisinos, por um aluno das Ciências Sociais. Ele trabalhava em uma indústria distribuidora de gás Gás liqüefeito de petróleo (GLP), gás de cozinha, e falou sobre os perigos dos acidentes que aconteciam com os trabalhadores quarteirizados devido ao despreparo e ao improviso para as situações de emergência com produtos perigosos. Isso tudo se deve a uma mudança no mundo tecnológico acompanhada de uma mudança no sistema gerencial. Além disso, as Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAS) deveriam ter uma mudança na sua composição. Pois são elas que deveriam cuidar da saúde dos trabalhadores dentro das empresas, tendo relações de um lado com o sindicato e de outro com a comunidade do entorno. Assim haveria um preparo efetivo para a emergência vinda do risco tecnológico.
IHU On-Line – Canoas tem um trabalho de gerenciamento de riscos químicos. Como você avalia esse trabalho?
Arlete de Arruda – A comissão tem um plano que trouxe mais confiabilidade ao município. Essa confiança à cidade foi trazida por essa construção da representação na Comissão de Defesa Civil, dos representantes de secretarias municipais, de empresas e com os técnicos. Claro que também isso pode ter alguma limitação. Por exemplo, o pessoal que participa da comissão de gestão de risco de Canoas é de nível técnico e das engenharias, não chegando ao comando das indústrias. As decisões que interferem na cidade vêm de fora da localidade. Porém, isso já é um avanço, na medida em que faz um pacto entre os setores da indústria e da comunidade, representada pelas associações, e o poder público local.
IHU On-Line – A senhora pode trazer um paralelo entre Canoas e outras cidades que vivem de forma parecida no mundo?
Arlete de Arruda – Um lugar que serve de modelo é a Refinaria de Duque de Caxias (Reduc), no Rio de Janeiro. No site da refinaria, há todo um mapa com saídas de emergência para acidentes. Lá, há pactos locais, que incluem o Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (COPPE) da UFRJ, a FioCruz e a Coordenadoria Municipal de Defesa Civil, onde já existem vários tipos de alternativas de como evacuar o local, como se comportar em acidentes de vários tipos. Simulados com os tipos de acidentes que podem ocorrer. Nesta refinaria também há o pacto de apoio mútuo entre as empresas. Há orientação nas escolas. Diríamos que, das cidades que são semelhantes a Canoas e têm o mesmo perfil, no Brasil, esta foi a que achei mais importante. No exterior, a cidade de Seveso, na Itália, na província de Ferrara, após um grande acidente, muitas negociações ocorreram para minimizar os riscos das comunidades do entorno, mas sem fechar as indústrias. É outro bom exemplo de negociação complexa com vistas ao bem-estar coletivo em cidades de risco.
Pelo mundo, existem mais conflitos em cidades semelhantes a Canoas. Na Nigéria, há uma cidade que, pela descrição geográfica, é muito parecida com Canoas, com mais de dois rios, com uma unidade militar, com refinarias, só que com grupos de tensão, e há o terrorismo, usando a destruição e explosão dos equipamentos com produtos perigosos para obter acordos políticos para as etnias. No México, as cidades são semelhantes geograficamente a Canoas, também há essa complicação causada pela tensão política. Felizmente, não temos essa variável em nossa sociedade.
A prevenção deve ser cobrada dos nossos gestores públicos. Os riscos existem, mas o que favorece o desastre e a catástrofe é o despreparo. As ações de minimização, as mudanças nas estruturas governamentais, a educação para a prevenção, levam ao preparo para o desastre. Os equipamentos sócio-técnicos estão se expandindo. E cidades como Porto Alegre recebem vários tipos de dutos, sobretudo agora que está chegando o gás veicular, o natural. Raramente se encontra uma sinalização nos pontos em que passam esses dutos. Penso que, o cidadão de Porto Alegre, por exemplo, deveria se questionar se estão preparados para um rompimento desses dutos. A todo o momento se abrem buracos nas ruas em Porto Alegre, seja pelas telecomunicações ou por causa da água ou por construções, e essa sinalização não é existente. Moro na cidade de Porto Alegre, e nunca soube de uma reunião com moradores sobre o assunto, mesmo nas reuniões de orçamento participativo. Nunca foram tratadas publicamente quais são as áreas de evacuação para aquelas pessoas que moram perto de dutos. As cidades, não só Canoas, mas todas onde estão chegando essas novas tecnologias deveriam ter o preparo para as emergências. No mínimo, a Comissão de Defesa Civil ou as instituições da sociedade civil deveriam orientar seus associados. Todas as cidades devem perguntar: quais são seus riscos e como se preparar para eles. E todos os cidadãos eleitores devem cobrar dos candidatos nas próximas eleições, quais são os projetos de seus partidos para enfrentar as calamidades, os desastres naturais e tecnológicos.
Notas:
[1] Anthony Giddens é um sociólogo britânico, renomado por sua Teoria da estruturação. Considerado por muitos como o mais importante filósofo social inglês contemporâneo, figura de proa do novo trabalhismo britânico e teórico pioneiro da Terceira via.
[2] Chernobyl é uma cidade ao norte da Ucrânia, perto da fronteira com a Bielorrússia. Em meados da década de 70, foi construída, pela União Soviética, uma central nuclear a vinte quilômetros da cidade de Chernobyl. Em 26 de Abril de 1986, ocorreu um acidente nuclear quando explodiu um reator da central de Chernobyl que libertou uma imensa nuvem radioativa contaminando pessoas, animais e o meio ambiente de uma vasta extensão da Europa.
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Canoas. Uma cidade-estação. Entrevista especial com Arlete de Arruda. - Instituto Humanitas Unisinos - IHU