O mito do alto custo das energias renováveis. Artigo de Henrique Cortez

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04 Dezembro 2025

Enquanto a indústria fóssil alega que fontes limpas encarecem a conta de luz, dados mostram exatamente o oposto.

O artigo é de Henrique Cortez, jornalista, ambientalista e editor do EcoDebate, publicado por EcoDebate, 04-12-2025.

Eis o artigo.

A produção de eletricidade, no fim das contas, obedece a princípios econômicos bastante simples. Para o consumidor que recebe sua conta de luz no final do mês, pouco importa se a energia que alimenta sua casa veio de uma hidrelétrica, de painéis solares ou de uma usina a carvão. O que realmente pesa no bolso é o valor da fatura.

É precisamente neste ponto que reside uma das narrativas mais persistentes — e enganosas — do debate energético contemporâneo. A indústria de combustíveis fósseis vem repetindo há anos que a transição para energias renováveis inevitavelmente resultaria em contas mais caras para o consumidor final. Trata-se de uma afirmação que não resiste aos dados, mas que, através da repetição insistente, consegue influenciar a opinião pública e enfraquecer o apoio político às políticas de descarbonização.

A realidade dos números

A verdade inconveniente, para os defensores do modelo energético do século passado, é que as energias renováveis tornaram-se não apenas competitivas, mas frequentemente mais baratas que suas contrapartes fósseis. Segundo dados recentes da Agência Internacional de Energia, o custo da energia solar fotovoltaica caiu cerca de 90% na última década, enquanto a eólica terrestre registrou quedas superiores a 70% no mesmo período.

Essa dramática redução de custos não é um fenômeno temporário ou localizado. Trata-se de uma tendência global e estrutural, impulsionada por avanços tecnológicos, economias de escala e crescente eficiência na fabricação e instalação desses sistemas. Em contraste, os custos de extração e processamento de combustíveis fósseis mantêm-se relativamente estáveis ou em elevação, sujeitos ainda à volatilidade geopolítica e à crescente escassez de reservas de fácil acesso.

Muito além do preço imediato

A comparação honesta entre fontes fósseis e renováveis precisa considerar não apenas o custo direto de geração, mas também as chamadas externalidades — impactos que não aparecem diretamente na conta de luz, mas que a sociedade paga de outras formas.

Poluição atmosférica, mudanças climáticas, custos com saúde pública, relacionados à qualidade do ar e degradação ambiental, são apenas alguns dos “custos ocultos” da energia fóssil que, se contabilizados, tornam as renováveis ainda mais vantajosas economicamente. Um estudo recente do Fundo Monetário Internacional estimou que os subsídios globais aos combustíveis fósseis, incluindo essas externalidades não contabilizadas, ultrapassam 7 trilhões de dólares anuais.

A máquina da desinformação

Diante dessa realidade econômica desfavorável, setores ligados aos combustíveis fósseis investem pesadamente em campanhas de comunicação que distorcem os fatos. A estratégia é familiar: semear dúvidas, exagerar desafios técnicos solucionáveis e, principalmente, repetir a mensagem de que renováveis são caras até que ela se torne uma “verdade” aceita.

Essa repetição incessante funciona. Mesmo quando confrontadas com evidências contraditórias, narrativas repetidas com frequência suficiente tendem a ser aceitas como verdadeiras — um fenômeno psicológico bem documentado conhecido como “efeito da mera exposição” ou “ilusão da verdade”.

O resultado prático dessa desinformação sistemática é devastador para os esforços de transição energética. Políticos hesitam em apoiar políticas de descarbonização por medo de serem acusados de aumentar custos para a população. Investimentos em infraestrutura renovável são adiados. Subsídios a combustíveis fósseis permanecem intocados, sob o argumento falacioso de “proteger o consumidor”.

Transparência e informação como resposta

Combater essa narrativa exige mais do que simplesmente apresentar dados corretos — embora isso seja fundamental. É necessário um esforço coordenado de comunicação clara e acessível sobre a economia da energia, capaz de alcançar o cidadão comum e desmistificar a questão.

Organizações de defesa do consumidor, meios de comunicação comprometidos com a precisão factual e instituições acadêmicas têm papel crucial nesse processo. Quando a população compreende que as energias renováveis não apenas protegem o meio ambiente, mas também oferecem eletricidade mais barata e estável a longo prazo, o apoio à transição energética se fortalece naturalmente.

O caminho à frente

A transição para uma matriz energética descarbonizada é uma necessidade ambiental urgente e uma oportunidade econômica cada vez mais evidente. Países e regiões que investem decididamente em renováveis colhem os benefícios de contas de energia mais previsíveis e acessíveis, além de maior segurança energética.

Permitir que a desinformação continue a atrasar esse processo não prejudica apenas o clima global, mas também o bolso do consumidor que, ironicamente, a indústria fóssil alega defender. A verdade sobre os custos da energia precisa ser contada com clareza, repetida com insistência e defendida com dados.

Afinal, se há uma lição que o debate energético nos ensina, é que a repetição molda percepções. Está na hora de repetirmos a verdade com a mesma persistência com que a desinformação tem sido disseminada: energias renováveis são mais baratas, mais limpas e representam o futuro inevitável e desejável da produção de eletricidade.

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