10 Setembro 2022
"O livro O cerco de Jerico: análise de Josué 2 e 6 apresenta uma análise séria e fundamentada de dois relatos bíblicos interligados, oferecendo uma oportunidade para acolhermos o livro de Josué em nossas vidas e em nossa fé. Quem lê os episódios de Josué 2 6 é convidado a focar no interesse teológico e catequético do narrador", escreve Eliseu Wisniewski, Presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos) Província do Sul e mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), ao comentar o livro "O cerco de Jerico: análise de Josué 2 e 6" (Santuário, 2022, 240 p.), de Leonardo Agostini Fernandes e Elizangela Chaves Dias.
A abordagem de Js 2 e 6 expressa a força narrativa e a intencionalidade teológica do livro de Josué. Nestes dois capítulos se evidencia, de modo veemente, o verdadeiro protagonista da conquista da terra, a qual não foi fruto da força humana, nem de estratégias militares, tampouco do poder dos armamentos bélicos, mas do puro dom do Senhor, que promete e cumpre, como está antecipado na fala de Raab: “Sei que o Senhor lhes deu a terra.” Tanto em Js 2 como em Js 6, a narrativa convida seu ouvinte-leitor a travessar o rio Jordão, isto é, a passar da promessa da terra de Canaã à sua conquista e tomada de posse.
O cerco de Jerico: análise de Josué 2 e 6
Foto: Divulgação
Neste sentido, o estudo proposto em O cerco de Jerico: análise de Josué 2 e 6 (Paulinas, 2022, 136 p.), de autoria de Elizangela Chaves Dias e Leonardo Agostini Fernandes, ambos doutores em Teologia Bíblica – quer auxiliar o ouvinte-leitor em sua leitura de Josué 2 e 6. Os referidos autores na Apresentação desta obra (p. 15-17) registram que o estudo dos dois textos exigem ser lidos e estudados conjuntamente, pois Js 6 é a lógica continuação de Js 2. Assim sendo, o estudo de Js 2 foi abordado, de modo particular e com a devida profundidade, fazendo-se uso da análise narrativa, concentrada nos seus elementos específicos: exposição, momento estimulante, complicação, clímax, ponto de virada, desfecho e conclusão. Por sua vez, Js 6 também seguiu a abordagem sincrônica, pela análise narrativa, concentrando-se na proposta de subdivisão, seguindo as sete partes identificadas em Js 6. Os organizadores observam ainda que a proposta de apresentação dos dois estudos seguiu o mesmo esquema. Assim, além de oferecer um percurso exegético consistente, houve a preocupação de evidenciar, o máximo possível, a intertextualidade e a continuidade narrativa que existe entre Js 2 e 6.
Em primeiro lugar os autores apresentam elementos introdutórios do livro de Josué, tais como: a nomenclatura (p. 20-21), o personagem Josué (p. 22-24), a estrutura e o conteúdo do livro (p. 24-28), valores da narrativa do ponto de vista histórico-literário (p. 28-31), aspectos religiosos que se destacam no livro (p. 31-32). Advertem que o livro de Josué não foi escrito para oferecer um relato detalhado de como se deu a conquista da terra de Canaã. O principal objetivo do livro é transmitir uma mensagem religiosa, ao evidenciar certos episódios em torno da conquista, a fim de demonstrar, acima de tudo, o protagonismo do Senhor, Deus de Israel, como o autêntico conquistador de Canaã. Ele é o Senhor dos Exércitos, que agiu através de Josué, um líder obediente, capaz de manter as tribos unidas, como se fossem “um só homem”. A união e a coesão nos propósitos atestam que o fio condutor de toda a narrativa tem a ver com a realização das promessas e com a aliança entre o Senhor e o povo que escolheu como sua pessoal propriedade (p. 32-34).
No segundo capítulo, “Josué 2: a prostituta Raab e os espiões de Jericó” (p. 35-68), Elizangela Chaves Dias seguindo a abordagem sincrônica, estrutura sua exposição em quatro etapas: 1) o contexto literário, a fim de situar a narrativa no tocante a sua delimitação (p. 36-42); 2) a tradução do texto a partir do hebraico, permitindo colher com mais profundidade os detalhes da narrativa (p. 43-45); 3) a estrutura e o gênero literário, verificando a organização interna do texto e seus aspectos formais (p. 46-48); 4) comentário exegético-teológico, a partir da opção proposta na estruturação (p. 48-65). Em suma, a autora ressalta que a narrativa de Js 2, 1-24 revela a ação providente do Senhor Deus na história humana e a sua capacidade de transformar um comportamento meramente humano, movido por interesse, em ação salvífica. Raab não é uma mulher comum: abre a porta de sua casa para dois estranhos, como sempre fez, porém, quando descobre que são espiões israelitas, lembra-se do que ouviu sobre o povo de Israel e as ações de seu Deus e os esconde do perigo mortal. Habituada a distinguir pessoas e situações, sente que chegou a hora de discernir e escolher. Por isso, preferiu ficar do lado de quem representava o Senhor. Mulher empreendedora e prática, com decisões rápidas e hábeis, diante da ameaça, Raab converteu uma situação de risco em uma oportunidade de salvação para si e para seus familiares (p. 65-68).
No terceiro capítulo, “A conquista de Jericó pelos filhos de Israel” (p. 69-112), Leonardo Agostini Fernandes destaca inicialmente que Js 6 é, sem dúvida, uma das páginas mais complexas da sagrada Escritura, sendo por isso não se fixar em um ou outro aspecto textual, mas buscar a visão integral da narrativa e integral da narrativa e integrar J6 com Js 2 (p. 69). Para a exegese e hermenêutica de Js 6, Fernandes segue de modo particular a abordagem sincrônica, observando que a abordagem sincrônica de Js 2 e 6 possibilita aprofundar a inter-relação de duas cenas bem intrigantes do livro de Josué, no que diz respeito a sua perspectiva teológica e literária, bem como permite retirar uma névoa negativa que paira sobre a forma como a cidade de Jericó foi conquistada pelos filhos de Israel, sob a liderança de Josué (p. 70). Seguindo este percurso - contexto literário (p. 70-74), a tradução do texto a partir do hebraico (p. 75-77), a estrutura e o gênero literário (p. 78-80), comentário exegético-teológico (p. 80-109) - o autor mostra que a conquista de Jericó, ampliada pelas informações de suas muralhas e ferrolhos de seus portões, adquire grande valor simbólico, enriquecido pelas estratégias de um cerco em chave litúrgica e pela total destruição pelo anátema. Assim, a aniquilação do inimigo torna-se sinônimo da eliminação de toda forma de culto prejudicial à exigência da obediência ao Senhor, único Deus (p. 110). Portanto, do início ao fim do livro de Josué, o foco sobre o livro da Torá demonstra que a entrada, a conquista e a repartição da terra da Canaã dependem não das habilidades bélicas do povo sob a liderança de Josué, mas da sua singular observância e obediência ao Senhor e á sua vontade contida nesse livro (p. 111).
Este pequeno livro apresenta uma análise séria e fundamentada de dois relatos bíblicos interligados, oferecendo uma oportunidade para acolhermos o livro de Josué em nossas vidas e em nossa fé. Quem lê os episódios de Josué 2 6 é convidado a focar no interesse teológico e catequético do narrador. No Posfácio (p. 113-117), Cássio Murilo Dias da Silva ressalta que o valor desta publicação que “possibilita uma leitura atraente e exposição acessível, direcionada a quem não se contenta com uma leitura ingênua e imatura do texto bíblico” (p. 116).
Este livro sob o título: O cerco de Jericó: análise de Josué 2 e 6 cumpre também uma função pastoral. Matthias Grenzer, ao prefaciar esta obra (p. 11-13), observa que nas últimas décadas, entre os católicos, tornou-se bastante popular um tipo de celebração conhecida como “Cerco de Jericó”- e, frente a isso, “com as duas narrativas bíblicas de Js 2 e Js 6, as quais guardam muitas conexões entre si, os dois autores acolhem tradições que originaram a celebração popular do cerco de Jericó. De certo, a grandiosidade dos textos sagrados quase automaticamente instiga o ser humano a querer encenar o que é narrado. Isso me parece bom, por mais que se corra o risco da materialização de imagens literárias provocarem estreitamentos, capazes de empobrecer as dimensões teológicas que, de forma mais ampla, pertencem à narrativa poética contida na Bíblia. Todavia, o presente livro caminha na contramão deste perigo. Com o estudo proposto, cada leitor e cada leitora poderão revisitar as narrativas bíblicas em questão e descobrir, novamente e /ou de forma mais ampla, a mensagem rica que lhes é própria” (p. 12).
Desta forma “conhecer mais e melhor os episódios narrados no livro de Josué deve levar a uma nova prática religiosa, para que a semana do Cerco de Jericó não seja apenas um novo impulso para aqueles que se veem enfrentando forças adversárias (espirituais ou demoníacas). Ao contrário, que se tornem um momento de renovar o vigor pessoal e comunitário para lutar contra a injustiça, a desigualdade, o preconceito, a exclusão, a intolerância, a truculência e o revanchismo que caracterizam a cidade pagã. Como Josué 2, trata-se de escolher se nossas opções e nossos esforços serão para manter e perpetuar a sociedade idolátrica da violência e da morte ou para construir e defender o Reino da verdade, da vida e da paz” (p. 116-117).
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O cerco de Jericó: análise de Josué 2 e 6. Artigo de Eliseu Wisniewski - Instituto Humanitas Unisinos - IHU