22 Fevereiro 2022
Reflexionar sobre os desafios e perspectivas da Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe foi o propósito da Aula inaugural do Instituto São Paulo de Estudos Superiores (ITESP), que está completando 50 anos de caminhada. O palestrante foi Dom Vicente de Paula Ferreira, bispo auxiliar de Belo Horizonte.
A reportagem é de Luis Miguel Modino.
O bispo partiu do contexto da Assembleia Eclesial, convocada pelo Papa Francisco em 24 de janeiro de 2021, com o tema “Somos todos discípulos missionários em saída”, inspirada na eclesiologia do Concílio Vaticano II e na Conferência de Aparecida.
Dom Vicente de Paula Ferreira, à direita (Foto: Reprodução do Facebook de Dom Vicente de Paula Ferreira)
A assembleia aconteceu em formato híbrido, virtual e presencial, com um pequeno grupo na sede da Conferência Episcopal Mexicana, de 21 a 28 de novembro de 2021, com uma presença aproximada de mil pessoas, a maioria homens, membros da hierarquia. Dom Vicente vê a Assembleia Eclesial como uma oportunidade para “escutar a polissemia do Povo de Deus em nosso Continente, em suas alegrias e preocupações”, que antecedeu o Sínodo sobre a Sinodalidade que acontecerá em 2023.
O tema nos leva a refletir sobre o número 383 do Documento de Aparecida, que afirma que “a Igreja necessita de forte comoção que a impeça de se instalar na comodidade, no estancamento e na indiferença, à margem do sofrimento dos pobres do Continente”. Daí que o bispo auxiliar de Belo Horizonte considere a Assembleia Eclesial como “o desejo de transbordar a caminhada já feita, avançando em pontos importantes”.
Após apresentar a metodologia da Assembleia, com palestras, testemunhos, celebrações e reuniões em grupos, e os 12 desafios ou perspectivas surgidos da Assembleia, o bispo refletiu sobre questões emergentes para a Evangelização em nosso continente, uma abordagem feita desde duas perspectivas, a conjuntura socioambiental e eclesial.
Dom Vicente de Paula Ferreira durante a conferência (Foto: Reprodução do Facebook de Dom Vicente de Paula Ferreira)
Na análise socioambiental, Dom Vicente de Paula Ferreira refletiu sobre aquilo que considera uma clara expressão do capitalismo neoliberal: 1% da população domina a terra, até o ponto que uma dezena de pessoas controlam riquezas equivalentes ao que possuem outros 50%. O modo de dominar é pela violência em relação aos povos e territórios, “um cenário reforçado por emergências de grupos radicais de extrema direita que estão a serviço desse discurso autoritário capitalista”, segundo o bispo.
Diante dessa realidade, o continente Latino-americano e Caribenho busca, segundo o bispo auxiliar de Belo Horizonte, “sua sobrevivência na grande tensão: ou continuar subserviente ao Norte mundial ou assumir caminhos de soberania”. Diante da destruição dos direitos humanos e ambientais no Brasil, o bispo advertiu diante do perigo da barbárie fascista. Frente a isso disse sonhar com uma contra hegemonia, nascida dos movimentos sociais e de reações democráticas.
Em relação à Igreja, Dom Vicente de Paula falou das três conversões profetizadas pelo Papa Francisco: Eclesiológica (Evangelii Gaudium), Ecológica (Laudato Sì') e Cultural (Fratelli Tutti), afirmando existir pessoas, grupos, redes que se empenham nessa direção, citando exemplos disso. Mas também relatava a existência de grupos fechados, centrados no culto, alienados da vida, com uma fé sem a dimensão política, uma espiritualidade da prosperidade, reprodutora do sistema de consumo, o que tem como resultado um cristianismo de consumo.
Dom Vicente de Paula Ferreira, à esquerda (Foto: Reprodução do Facebook de Dom Vicente de Paula Ferreira)
O bispo chegou a falar de uma perseguição aos que buscam uma Espiritualidade socioambiental-transformadora, imagem do Reino de Deus. Isso se manifesta em um “cisma latente entre nós”. Existem, segundo Dom Vicente de Paula, “tribunais da fé representados por grupos ou influencers do ‘verdadeiro sagrado’, que se julgam legítimos defensores de Deus, da Pátria e da família”.
Finalmente apontou o que ele considera algumas questões cruciais para a eclesiologia do futuro. Dentre outros, colocou o protagonismo de todo batizado como ruptura do clericalismo; o fortalecimento de uma Igreja com rosto Latino Americano e Caribenho decolonial, que ele definiu como indígena, preta e feminina; uma Comunicação Popular Libertadora, com cidadania eclesial de todos, como confronto à manipulação das narrativas espiritualistas de muitos meios de comunicação, verdadeiros promotores de influencers digitais sagrados; investimento nas comunidades eclesiais de base como superação do cristianismo de massa.
Junto com isso, uma Teologia da Libertação Renovada como promoção de uma Igreja socioambiental transformadora, com a ecologia integral como elemento transversal; a ministerialidade das mulheres como urgente superação do machismo; a inclusão das reivindicações LGBTQIA+ como forma de superação da homofobia eclesial; a recepção da Amoris Laetitia, que leve a refletir sobre a segunda união matrimonial e a ordenação de homens casados.
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Dom Vicente de Paula Ferreira: Assembleia Eclesial, oportunidade para “escutar a polissemia do Povo de Deus” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU