Depois da entrevista publicada na revista francesa Famille Chrétienne e da minha resposta, houve uma troca epistolar com o padre abade Jean Pateau. Hoje o abade do mosteiro de Notre-Dame de Fontgombault enviou-me esta resposta detalhada, que publico de bom grado e que responderei com calma. Agradeço-lhe pelo diálogo e espero que possa ser útil para compreender a condição eclesial na qual chegamos 14 anos depois da aplicação do Motu Proprio Summorum Pontificum.
O texto do abade Jean Pateau é publicado no blog do teólogo italiano Andrea Grillo, Come se Non, 02-08-2021. A tradução do francês é de André Langer.
Caro professor,
Agradeço pela atenção concedida à entrevista na Famille Chrétienne e por responder a ela com um texto intitulado: Vamos construir pontes entre as pessoas, não entre os ritos.
Com efeito, a liturgia é o lugar por excelência para construir pontes: ponte com Cristo para encontrar Nele todos os membros do Povo de Deus.
Você assinala, com razão, a dificuldade de construir pontes entre os fiéis que participam das diferentes formas do rito romano e que seria mais fácil construir pontes entre as pessoas que usassem a mesma forma comum do rito romano. Concordo com você.
João Paulo II promulgou, logo após as ordenações episcopais de Ecône, o Motu Proprio Ecclesia Dei, em 02 de julho de 1988. Apenas as duas primeiras palavras do documento foram mantidas como título, uma pena! A terceira palavra é adflicta. A Comissão de mesmo nome não nasceu no esplendor de uma Igreja triunfante, mas antes na cruz de uma divisão entre irmãos, divisão que perdura até hoje. É preciso observar que os dois primeiros números deste texto mencionam a tristeza: tristeza da Igreja que vê alguns dos seus filhos se afastando da plena comunhão, tristeza “particularmente sentida pelo sucessor de Pedro, que é o principal responsável por garantir a unidade da Igreja”.
Encontramos esta tristeza em Francisco, que ele expressa através do Motu Proprio Traditionis Custodes.
Sim, você compreendeu: cansaço e tristeza são o meu pão de cada dia em torno da questão litúrgica. Minha intenção nestas linhas é de reconciliação e de paz... também de verdade. E nisto nos encontramos. Como você disse, tentei pacificar os cristãos de todos os matizes “para encontrar o tom mais apropriado para dar ao novo texto uma visão que não seja fonte de divisão, intolerante e de oposição frontal”.
É preciso reconhecer que muitos recebem o Traditionis Custodes como um sinal de ruptura e não entendem. Alguns não se reconhecem nos fiéis descritos e se sentem agredidos. O que dizer a estes padres, a estes fiéis, que durante anos trabalharam muitas vezes de forma oculta e pouco reconhecida para curar feridas, para trazer de volta ao rebanho. Eles estão desencorajados e são falsamente acusados de recusar o Vaticano II, de recusar a Missa 69, de falar da “Verdadeira Missa”, da “Verdadeira Igreja”.
O Traditionis Custodes gera situações muito diferentes por uma mesma norma, amalgama sem parecer reconhecer as grandes diferenças dos fiéis que assistem ao VO [Vetus ordo], sobretudo ignora a existência de fiéis ou de comunidades que não se opõem a um caminho de reflexão sobre a liturgia e que às vezes até antecipavam isso.
Como abade, São Bento me pede que cuide de guardar todas as ovelhas que me foram confiadas, que ande acompanhando seus passos... as que correm e as que também mancam. É também a preocupação que Francisco compartilha em relação a todo o rebanho, que pede ao pastor que esteja ao mesmo tempo na frente, no meio e na retaguarda do rebanho.
Sim, concordamos em trabalhar em torno de duas exigências centrais: construir pontes entre os fiéis e acabar com as batalhas litúrgicas.
Seguem alguns elementos que compartilho com você:
Você censura Bento XVI por usar os termos “forma extraordinária” do rito romano como “algo que foi inventado em 2007, que não tem nenhum fundamento no passado eclesial”, uma “astúcia”, um “truque sistemático”... algo que trouxe a “batalha”, não a “paz”, criando ilusões, distorções de perspectivas, miragens e pesadelos… Uma espécie de “loucura coletiva”.
A observação me parece realmente excessiva, porque em muitos lugares, um verdadeiro caminho de reconciliação aconteceu. Os bispos franceses sublinharam isso em uma síntese polêmica dos resultados da investigação da Congregação para a Doutrina da Fé sobre a implementação do Summorum Pontificum: “Na maioria das dioceses, a situação parece apaziguada”. Pela ação perseverante e não sem mérito dos bispos e sacerdotes, foram gradualmente se estabelecendo verdadeiros lugares de paz litúrgica e de enriquecimento mútuo. Demorou e exige muita humildade de todos... mas é assim que a Igreja cresce.
Então, de onde vem o termo “forma”, empregado no contexto litúrgico? É o resultado da pressa?
A fórmula aparece em uma carta enviada pelo cardeal Lustiger ao cardeal Ratzinger no outono de 2000. Diante de um pedido pessoal paroquial bastante agressivo, o arcebispo de Paris lembrou ao grupo requerente – com cópia ao cardeal Ratzinger – as iniciativas benevolentes que ele havia tomado para que pudessem coexistir em plena comunhão de fé e caridade os fiéis apegados a “uma ou outra forma do único rito romano”.
A palavra só poderia ressoar no coração de quem já compreendeu o caminho da Igreja segundo uma hermenêutica de continuidade. Diante daqueles que consideravam a “nova Missa” fruto de uma ruptura, assumida por uns ou sofrida por outros, a afirmação de duas formas num mesmo rito substituiu a questão no grande rio litúrgico que atravessou séculos. Bento XVI pode, assim, escrever aos bispos:
“Não existe qualquer contradição entre uma edição e outra do Missale Romanum. Na história da Liturgia, há crescimento e progresso, mas nenhuma ruptura. Aquilo que para as gerações anteriores era sagrado, permanece sagrado e grande também para nós, e não pode ser de improviso totalmente proibido ou mesmo prejudicial. Faz-nos bem a todos conservar as riquezas que foram crescendo na fé e na oração da Igreja, dando-lhes o justo lugar.”
Os cardeais Lustiger e Ratzinger, ao utilizar e assumir a ideia de duas formas em um único rito romano, não inovaram, mas reconheceram a proximidade objetiva dos dois ritos (o que não é o caso, por exemplo, dos ritos orientais ou mesmo dos rito romano com o rito ambrosiano…). Há uma filiação e, portanto, pedras salientes para uma aproximação pacificada da questão litúrgica que poderia ser entendida à luz da caminhada de tantos adolescentes que rapidamente se emanciparam e que um dia voltam para o pai para reconhecer o que eles talvez rapidamente esqueceram (Cf. Homilia de Francisco para o domingo dos avós, 25 de julho de 2021).
Bento XVI, como um cooperador da verdade, e como sempre fez, manifestou seu gênio ao reconciliar situações materialmente contraditórias sob uma luz mais elevada. Falar de um único rito romano convidava ao conhecimento, ao reconhecimento mútuo.
Embora muitos tenham se beneficiado materialmente do Summorum Pontificum ou o tenham criticado amargamente, poucos parecem ter realmente trabalhado para implementar até o fim o espírito do texto.
Segue o que Bento XVI escreveu no final da sua carta aos bispos:
“As duas formas do uso do Rito Romano podem enriquecer-se mutuamente: no Missal antigo poderão e deverão ser inseridos novos santos e alguns dos novos Prefácios. Na celebração da Missa segundo o Missal de Paulo VI, poder-se-á manifestar, de maneira mais intensa do que frequentemente tem acontecido até agora, aquela sacralidade que atrai muitos para o rito antigo.”
“Obviamente, para viver a plena comunhão, também os sacerdotes das comunidades que aderem ao uso antigo não podem, em linha de princípio, excluir a celebração segundo os novos livros. De fato, não seria coerente com o reconhecimento do valor e da santidade do novo rito a exclusão total do mesmo.”
Essas linhas, numa perspectiva retrospectiva, são acusadoras.
Quando no ano passado a Ecclesia Dei autorizou o uso de novos Prefácios e novos santos, eu disse a mim mesmo: “Finalmente!” Tivemos que esperar 13 anos! Quatro dias antes de sua petição, assinada por renomados liturgistas franceses e cujos trabalhos eu apreciei, me entristeceu profundamente.
Também na vida concreta das dioceses e paróquias, os contatos nem sempre aconteceram... Alguns se salvaram por pouco e o passo a dar de um lado e de outro pode ser difícil.
O cardeal Ratzinger havia de fato designado um objetivo exigente em sua carta ao Professor Barth de 23 de junho de 2003:
“Acredito que no futuro a Igreja Romana terá que ter novamente um único rito: a existência de dois ritos oficiais é na prática difícil de “administrar” por parte dos bispos e padres. O rito romano do futuro deve ser um rito único, celebrado em latim ou na língua vernácula, mas inteiramente baseado na tradição do rito antigo; ele poderia incorporar alguns novos elementos, que já provaram seu valor, como as novas festas, alguns novos Prefácios na missa, um Lecionário ampliado – uma escolha maior do que antes, mas não muito – uma Oratio fidelium, isto é, uma ladainha de orações de intercessão após o Oremus do Ofertório, onde outrora teve seu lugar”.
Basicamente, o Summorum Pontificum foi a resposta humilde de Bento XVI à observação de que a situação dos fiéis vindos do movimento do arcebispo Lefebvre permanecia precária na Igreja, mas também a acolhida do fato de que fiéis e padres, vindos de outros horizontes, estavam obtendo um verdadeiro benefício espiritual na assistência da missa de acordo com o VO ou em sua celebração.
Pode haver concorrência quando é o mesmo Cristo que é compartilhado? Não pode haver concorrência nesta área da liturgia, mas apenas serviço, serviço de Deus, serviço do Povo de Deus.
Esta “concorrência desleal” existe em muitos lugares da Igreja: entre dioceses, dentro das dioceses entre paróquias, entre dioceses e algumas comunidades de leigos ou religiosos... O vínculo com a paróquia para muitos está rompido. Os cristãos escolhem o seu local de prática, a sua celebração... Este é um fato que não se aplica apenas à questão do VO. A questão então é como lidar com isso? Isso deve ser visto como riqueza ou pobreza para a Igreja?
O que não é admissível é colar a apelação de “Verdadeira Missa” na forma extraordinária. Mas, como você bem sabe, isso é sobretudo obra dos fiéis vindos da Fraternidade São Pio X.
Por outro lado, a Igreja parece-me ter de tomar nota do fato de que o VO vai ao encontro das expectativas dos fiéis e dos sacerdotes e também atrai não cristãos principalmente pela sua sacralidade. Ele é aceito, e as pesquisas confirmam que, se fosse mais difundido, mais fiéis o praticariam.
Durante um colóquio dedicado ao Summorum Pontificum, permiti-me fazer a observação um pouco provocadora de que se o NO [Novus Ordo] nasceu do trabalho de padres que celebram o VO, é porque esses padres tinham consciência de uma carência em relação à vida da Igreja e de sua própria fé. Por outro lado, hoje, é impressionante ver, cinquenta anos após o estabelecimento da reforma litúrgica, os padres voltando-se para o VO como se faltasse algo no NO... Pelo seu trabalho de liturgista você tem o dever de analisar isso. Antes de falar do reconhecimento mútuo dos dois ritos, devemos falar do conhecimento mútuo dos dois ritos. A Igreja não pode simplesmente deixar de lado um tesouro autêntico porque o esqueceu, porque o ignora ou porque alguns o caricaturizaram; este tesouro, que permanece para os sacerdotes, para os fiéis, para os não cristãos também o meio de um autêntico caminho para Cristo e, por vezes, simplesmente de retorno a Cristo.
Em relação a esta situação de concorrência, está também claro que a Igreja tem o dever de assegurar que é realmente Cristo e a Igreja Católica que os fiéis vão encontrar quando se deslocarem a este ou aquele lugar.
Duvido muito que a luta contra a concorrência desleal chegue ao fim com a abolição total da celebração segundo o VO.
Eliminar o concorrente parece, para muitos, a escolha do Traditionis Custodes em sua interpretação rígida. É simples e radical no papel. Você concordará que é difícil, no momento, avaliar as consequências que tal aplicação do texto terá, mesmo a curto prazo. Como os fiéis vão reagir? Eles vão voltar para a sua paróquia? Eles escolherão assistir a missas virtuais, a missas clandestinas? Eles entrarão na Fraternidade São Pio X?
Em vez de opor o Traditionis Custodes ao Summorum Pontificum, teria sido melhor colocá-los em uma continuidade. Essa perspectiva também seria um meio de consolar os fiéis desorientados, que interpretam o Traditionis Custodes como um ato duro e severo frontalmente contrário ao que Bento queria.
O Summorum Pontificum seria um ato por algum tempo.
O Traditionis Custodes seria semelhante ao apito do mestre-escola que põe fim ao recreio, um apelo firme de Francisco para que a liturgia não seja mais um canto de batalha, um apelo a trabalhar para uma unidade litúrgica que responda às legítimas expectativas de todos os fiéis que a Igreja não pode ignorar.
Associado a um documento que abre o NO ao enriquecimento do VO, o Traditionis Custodes promoveria esse conhecimento mútuo, esse caminho conjunto em direção a uma unidade litúrgica que só pode ser alcançada na paz e na confiança.
Além disso, me alegro quando você escreve: o desafio de promover a paz passa das “pontes entre duas formas rituais” para pontes “entre fiéis que usam a única forma comum”. Muitas das coisas que você designa como “inalienáveis” no VO devem ser descobertas, introduzidas ou reconhecidas no Ordo desejado pelo Concílio Vaticano II.
Você menciona a história da abadia e uma certa hostilidade para com o Vaticano II. Esta observação me surpreende… O padre abade Jean, meu predecessor não imediatamente anterior a mim, que viveu o período do Concílio, gostava de salientar que a situação de crise que a Igreja atravessou e está atravessando não ocorreu “por causa do Concílio, mas por ocasião do Concílio”.
Você expressa o desejo de que a abadia “se entregasse gradativamente à descoberta dos tesouros litúrgicos do NO e os colocasse em comum, na experiência monástica e na experiência eclesial. E ajudasse toda a Igreja a viver a continuidade do essencial do depositum fidei (= depósito da fé) na nova formulação de sua apresentação”.
Este trabalho começou há muito tempo... no decurso de uma história litúrgica agitada... com belos momentos, como o da minha bênção de abade presidida por dom Armand Maillard, onde sacerdotes diocesanos e religiosos concelebraram de forma extraordinária e saíram profundamente gratos...
Dom Jean Roy, abade de Notre-Dame de Fontgombault de 1962 a 1977, acolheu de bom grado o pequeno conjunto de reformas do Ordo Missæ em 1965. Não sem algumas apreensões, ele seguiu a fermentação que levaria em 1969 à promulgação do novo Ordo Missæ, do qual percebeu tanto as qualidades como os limites. O NO foi adotado no final de 1974 na abadia, quando passou a ser obrigatório com a aprovação da tradução para o francês.
O padre abade recomendou aos padres da abadia que conservassem na celebração dos santos mistérios as disposições de piedade, respeito e sentido do sagrado que haviam adquirido na escola do missal tridentino.
Como prolongamento da carta circular Quattuor abhinc annos, de 3 de outubro de 1984, a partir da Festa da Anunciação de 1985, os padres do mosteiro, sob a condição de fazerem um pedido pessoal ao ordinário do lugar, receberam a permissão para dizer a metade das missas da semana segundo o missal tridentino.
Finalmente, dom Antoine Forgeot, sucessor do padre abade Jean Roy, obteve da Comissão Ecclesia Dei o rescrito de 22 de fevereiro de 1989 autorizando a retomada de maneira habitual do Missal de 1962. O mosteiro foi fortemente encorajado pela Comissão a adotar tudo o que pudesse esboçar uma aproximação com o NO. A abadia conservou o novo calendário para o santoral, adotou alguns novos Prefácios, uma oração universal aos domingos e dias de festa, o Per Ipsum cantado, o Pater cantado pelos monges... A missa é concelebrada nas grandes solenidades ou em ocasiões especiais... Esses usos acabariam por estar de acordo com o pensamento do cardeal Ratzinger. Ele testemunhou isso durante as Jornadas Litúrgicas de Fontgombault em 2001. De modo mais pessoal, em 2011, logo após minha bênção de abade, durante uma visita a Roma na presença do padre abade Antoine, o Papa Bento XVI me convidou a “permanecer fiel à herança do querido padre abade”. Que bela confirmação para o trabalho do padre abade Antoine!
Com prazer, convido-o a vir e ficar em Fontgombault para descobrir como se vive a liturgia e se dá o enriquecimento mútuo dos dois missais.
Tudo isso me leva a afirmar que foi a aplicação parcial ou partidária do Summorum Pontificum de ambos os lados que levou à situação atual... e havia a possibilidade de ser diferente.
Você menciona meu passado e, de fato, esse conhecimento mútuo e pacífico dos dois ordo vem de longe, e devo isso aos meus pais. Aos 14 anos, tive a oportunidade de descobrir o VO, mas não de maneira exclusiva. Até a minha entrada no mosteiro, como organista, servi a liturgia durante as missas celebradas segundo os dois ordo. Em parte, vem dali uma liberdade que não é comum na Igreja. Essa liberdade me parece essencial para conhecer e acolher o outro segundo o que ele é, com suas belezas, mas também com sua pobreza e sua lentidão.
Agora, devo também confessar-lhe que o Cristo morto, ressuscitado, partilhado, encontrado no coração da liturgia, vem a mim pela celebração do missal de 62 e que a minha celebração no 65, 69 está impregnada disso. Muitos jovens sacerdotes que aprendem sobre a celebração da Missa de 62 na abadia, quando normalmente não a celebram em sua paróquia, fazem a mesma experiência.
Para ser claro, e eu assumo isso, creio que seja utópico no campo litúrgico querer construir pontes afirmando: “Nada em ti é bom. Venha para minha casa para que possamos nos dar bem”.
O que fazer então? Voltar a um único rito comum e ordinário? Este também foi o pensamento do Papa Bento XVI.
O cardeal Ratzinger mencionou ao Professor Barth um rito “na tradição do rito antigo”. Partir do VO me parece difícil. Há especialmente o obstáculo do latim, o trabalho feito também no lecionário. Por outro lado, a introdução de elementos do VO no NO atenderia a muitas expectativas de muitos, fornecendo elementos para uma possível ressacralização de uma forma mais perceptível, respeitando a sóbria celebração que convém aos outros.
Se Francisco fosse nessa direção, muitas reconciliações poderiam acontecer na única forma comum, que teria um modo de celebração ordinário ou solene. Penso especialmente na capacidade de usar o ofertório do VO, no acréscimo de gestos que recentram tanto o celebrante como os fiéis para o que está acontecendo. Por que não possibilitar o grande silêncio do cânone que é como a iconóstase do rito romano?
Você fala de afeto e de normas em seu texto... Para mim, a liturgia nunca foi o lugar da norma, mas antes de tudo o lugar do afeto.
Se a Igreja promulga uma norma litúrgica, essa norma provém da “afeição” da Igreja por seus filhos. Nesse sentido, a liturgia responde às necessidades do povo cristão. O pastor não escolhe suas ovelhas nem seus padres... ele os recebe. A esse respeito, penso nas palavras de Francisco no início das audiências dedicadas aos dez mandamentos... não dos mandamentos, mas das palavras no sentido hebraico do termo, das palavras de amor.
“A questão não pode ser resolvida nem por 'decretos de cima' nem pelo 'populismo de baixo'”. É verdade. Francisco falou muito do poliedro... A primeira ponte a ser construída é no coração onde tem que se fazer uma ponte com o outro, uma ponte com o que vive, com o que há de bom e de belo nele... É o que fazemos nesses intercâmbios.
Francisco recorda também que o tempo é maior que o espaço... Ele tem repetidamente convidado os religiosos à continuidade e à criatividade na recepção e na vivência do carisma de seus institutos. Esta orientação também se aplica ao campo da liturgia: Nova et vetera… Nela, ele retoma a ideia cara ao Papa Bento XVI de uma renovação na continuidade que, no fundo, baseia-se na rocha que é Cristo, cabeça do corpo que é a Igreja. Não se trata de convidar a Igreja a romper com o seu passado, mas de aproveitar tudo para uma renovação missionária.
Receba estas palavras no espírito com que são escritas, um espírito de paz, um espírito de serviço humilde da Igreja, de toda a Igreja, e que Deus o abençoe.