25 Janeiro 2020
“Para quem crê, a Boa Notícia não é uma informação, mas é o Senhor. A notícia não é um conteúdo informativo, mas sim uma ‘pessoa’. São Francisco de Sales nos ajuda a entender isso, e a sua mensagem é de extraordinária atualidade para o jornalismo moderno.”
A opinião é do padre jesuíta italiano Antonio Spadaro, diretor da revista La Civiltà Cattolica, em artigo publicado em sua página pessoal no Medium, 24-01-2020. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eu me interrogo sobre o que é uma “boa notícia”. Muitas vezes, nós imaginamos que as “boas notícias” são as notícias de otimismo, os happy ends. E, em certo sentido, são. Mas isso não basta. A vida humana é feita de eventos felizes e eventos mais difíceis de se viver.
Se a imprensa, frequentemente, nos faz meditar mais sobre as más notícias, a solução não é simplesmente a de fazer meditar sobre as boas notícias, sobre o bem. É importante, importantíssimo. Mas isso não basta. Pelo contrário, às vezes, as muitas “boas” notícias da vida cotidiana – todos sabemos disto por experiência – emergem a partir de uma complexidade de difícil discernimento.
Para quem crê, a Boa Notícia não é uma informação, mas é o Senhor. A notícia não é um conteúdo informativo, mas sim uma “pessoa”. A fé deve habilitar o cristão que é jornalista a considerar essa visão revolucionária do modo de entender comum. Para o cristão, a “notícia” não é principalmente um conteúdo, mas sim a pessoa que a encarna. O Evangelho, isto é, a Boa Notícia, para quem crê, não é somente um livreto, mas é o próprio Cristo que salva a minha vida.
Dito isso, na realidade, compreendemos como é atual essa visão hoje. No momento das redes sociais, não há informação que não seja compartilhamento ou que não esteja aberta ao compartilhamento. O tempo do broadcasting, na minha opinião, ou seja, o da transmissão pura e simples de uma mensagem, está acabando definitivamente. A notícia passa se for compartilhada entre pessoas (Facebook, Twitter...). Pensemos na “primavera árabe” ou no mundo em que os jovens hoje adquirem (para o bem ou para o mal) as informações. Se a informação passa pelo compartilhamento, então ela também passa trazendo dentro e atrás de si uma parte daqueles que a compartilham, a sua experiência, a sua vivência.
Em suma: hoje, a dinâmica da informação nos faz entender que o jornalismo absolutamente não está em crise, mas – de formas ainda difíceis de compreender e de avaliar bem – está se tornando uma dimensão antropológica, um elemento da vida de todos. Ao lado do jornalismo como arte e como ofício, está se desenvolvendo o jornalismo como parte da nossa humanidade, uma dimensão existencial. A notícia não pode mais ser informação, mas é e deve ser comunicação, não apenas conteúdo, mas também “testemunho”.
São Francisco de Sales nos ajuda a entender isso, e a sua mensagem é de extraordinária atualidade para o jornalismo moderno. Por que, em 1923, ele foi proclamado pelo Papa Pio XI padroeiro da imprensa católica, dos jornalistas, dos escritores, além dos surdos-mudos? E sublinho de passagem esse vínculo entre os jornalistas e os surdos-mudos, que não deve ser subestimado.
Substancialmente, porque ele se deu conta de que as pessoas evitavam as suas pregações e, portanto, para se opor à heresia calvinista, decidiu refutar os erros deles com panfletos, escritos por ele entre uma pregação e outra, e disseminados em muitas cópias, que, passando de mão em mão, deviam acabar chegando também aos calvinistas. Francisco de Sales não “dava notícias”, mas comunicava a si mesmo, a sua fé, as coisas nas quais acreditava.
Mas, ao lado dessa panfletagem, deve-se considerar a capacidade de escrever cartas, ao que parece 30.000, das quais restaram apenas 2.000. E a carta é precisamente uma comunicação que envolve plenamente quem escreve. Bento XVI, na sua mensagem para o 45º Dia Mundial das Comunicações, havia escrito que
“Quando as pessoas trocam informações, já estão compartilhando a si mesmas, a sua visão do mundo, as suas esperanças, os seus ideais.”
E hoje as tecnologias da informação, contribuindo para criar uma rede de conexões, levam os homens e as mulheres a se tornarem “testemunhas” dos valores sobre os quais fundamental a própria existência.
O modelo que temos diante dos nossos olhos, o de Francisco de Sales, portanto, é o de um jornalismo que comunica paixão e tem uma intenção de envolvimento, participação, formação. A própria atenção à “verdade” não é uma simples e fria atenção à “objetividade” ou à “neutralidade”, mas sim à compreensão do valor das coisas.
O jornalismo, portanto, é uma forma de testemunho capaz de interrogar quem escreve e quem lê, quem transmite e quem recebe, sobre a visão das coisas e sobre os significados, sobre os valores...
A revista La Civiltà Cattolica busca viver essa vocação jornalística desde 1850: o compartilhamento de uma experiência intelectual iluminada pela fé cristã e profundamente enxertada na vida cultural, social, econômica, política dos nossos dias.
La Civiltà Cattolica é uma revista singular: a sua redação é uma comunidade de pessoas que pensam, mas que também vivem juntas. E é a revista mais antiga da Itália, tendo já 170 anos de vida. Não é uma revista que “se mantém viva”, mas sim uma revista que “expressa uma vida” intelectual. Ela permanecerá viva enquanto expressar uma vida. É esse o significado do jornalismo: dar forma de notícia à vida agitada do mundo.
Particularmente, desde o editorial do primeiro fascículo de 1850, a nossa revista interpretou assim a sua própria “catolicidade”:
“Uma Civilização católica não seria católica, isto é, universal, se não pudesse se compor com qualquer forma de coisa pública.”
Portanto, desejo o mesmo a todos os jornalistas que são católicos: que a catolicidade de vocês se expresse também como desejo de universalidade, como desejo de se compor com qualquer forma de coisa pública.
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São Francisco de Sales não dava notícias. Artigo de Antonio Spadaro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU