21 Agosto 2019
"A preponderância das evidências sustenta a ideia de que uma maior religiosidade está associada a uma melhor saúde mental. Mas pode ser que os adolescentes com uma melhor saúde mental frequentem a igreja regularmente e tenham um ambiente doméstico mais estável", escreve escreve Jane Cooley Fruehwirth, em artigo publicado por America, 19-08-2019. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Jane Cooley Fruehwirth é professora associada no Departamento de Economia da Universidade da Carolina. Junto com Sriya Iyer e Anwen Zhang, escreveu o artigo “Religion and Depression in Adolescence” (Religião e depressão na adolescência), publicado na Journal of Political Economy (jun./2019).
Em 2016, quase 45 mil pessoas nos EUA tiraram a própria vida, marcando um aumento de 25% no número de suicídios desde 1999. Praticamente no primeiro período, os gastos com saúde mental nos EUA mais que duplicaram. Numa tendência particularmente alarmante, a incidência de pelo menos um grande episódio depressivo anual entre adolescentes aumentou quase dois terços ao longo da última década alcançando 13,3%. Porque muitos que vivenciam dificuldades na saúde mental quando adultos mostram, primeiramente, sintomas durante este período desenvolvimental, a Organização Mundial da Saúde lista a saúde mental na adolescência como a principal prioridade global na área.
Vi estas tendências em minha própria vida como professora. Como cientista social, quero entender o porquê. Como cristã, pergunto-me se a religião pode ajudar a proteger os adolescentes das enfermidades mentais.
Esta questão é contenciosa no campo da psiquiatria. Sigmund Freud é conhecido pela sua visão negativa da fé: “Quando se tenta atribuir à religião seu lugar na evolução do homem, ela parece ser menos uma aquisição duradoura do que um paralelo à neurose pela qual o indivíduo civilizado tem de passar, no caminho da infância à maturidade”. Mas Carl Jung e outros psicólogos têm uma opinião mais positiva do papel da espiritualidade.
O que estas estatísticas nos dizem? A preponderância das evidências sustenta a ideia de que uma maior religiosidade está associada a uma melhor saúde mental. (Mede-se a religiosidade através de sondagens sobre a frequência com que um indivíduo vai a serviços religiosos ou reza, bem como através da importância que ele atribui à religião.) Mas pode ser que os adolescentes com uma melhor saúde mental frequentem a igreja regularmente e tenham um ambiente doméstico mais estável. Como sabemos se é a frequência à igreja ou o ambiente doméstico estável que os está beneficiando? Esta distinção é importante: num caso, a ênfase para melhorar a saúde mental deveria se voltar sobre o envolvimento religioso e, no outro, deveria se voltar sobre o ambiente doméstico.
Como poderíamos mostrar que a religiosidade possui um efeito causal na depressão? Se pudéssemos realizar um experimento para responder a esta pergunta, poderíamos aleatoriamente nomear alguns adolescentes para frequentar serviços religiosos ou rezar, e outros para evitar esta atividade; depois de um certo período, poderíamos avaliá-los com indicadores de depressão. Mas há problemas éticos óbvios na questão da frequência religiosa e em convencer as pessoas a consentir com o experimento. Diferentemente, podemos realizar aquilo que se chama de um quase experimento.
Em colaboração com Sriya Iyer, especialista em economia da religião e professora da Universidade de Cambridge, e Anwen Zhang, economista da Universidade de Glasgow, investiguei um conjunto singular de dados, o National Longitudinal Survey of Adolescent to Adult Health, que inclui ricas questões sobre religiosidade e depressão, e focamos nos anos em que os alunos cursavam o ensino médio.
Sabemos que colegas e amigos têm fortes efeitos na adolescência dentro de uma variedade de comportamentos, desde o uso de drogas e álcool até a performance acadêmica. Isto vale para a religiosidade também. Quando olhamos as grades curriculares de uma mesma escola, por acaso certos alunos são expostos a colegas mais religiosos do que outros de outras grades curriculares. Isto cria uma espécie de experimento. Os alunos que, por acaso, são expostos a colegas religiosos se tornam mais religiosos. Podemos isolar o efeito da religiosidade individual sobre a depressão usando a variação na religiosidade individual que vem unicamente desta variação aleatória na religiosidade dos colegas de escola/grade curricular. Em outras palavras, se certos adolescentes se tornam mais religiosos como resultado da exposição a colegas religiosos, podemos investigar se estes mesmos adolescentes subsequentemente demonstram saúde mental melhorada.
Ao focarmos o nosso quase experimento nas mudanças da religiosidade individual advindas unicamente da exposição aleatória a colegas, fomos capazes se eliminar a questão de que os nossos efeitos estimados da religiosidade são motivados pelas características histórico-culturais individuais, como o ambiente familiar e a formação parental. Porque comparamos alunos que participam de diferentes grades curriculares de uma mesma escola, pudemos eliminar o fato de que as características da escola estariam motivando os nossos efeitos estimados da religiosidade.
Então, o que encontramos? Efeitos robustos da religiosidade na depressão. Por exemplo, entre os alunos no nosso quase experimento, um aumento de desvio padrão 1,0 na religiosidade diminuía a probabilidade de correr o risco de depressão moderada a severa em 11%. (Esta mudança de desvio padrão em religiosidade é bastante grande; equivale à diferença de não frequentar a igreja ou atividades religiosas para jovens a frequentá-las pelo menos uma vez por semana.) Talvez o mais surpreendente foi que estes efeitos foram os mais fortes, quase dois terços maiores para os indivíduos que apresentavam os sintomas mais severos de depressão, que muitas vezes são os mais difíceis de tratar. Este achado oferece um contraste surpreendente sobre a efetividade da terapia de base cognitiva, uma das formas mais recomendadas de tratamento, que geralmente é menos eficaz para os indivíduos deprimidos, ao menos no curto prazo.
Fundamentalmente, descobrimos que os benefícios da religiosidade sobre a depressão não são motivados apenas pela exposição a colegas mais religiosos na grade curricular escolar, mas também pelo comportamento estudantil individual. Isso não quer dizer que um ambiente escolar mais religioso não seja útil para a saúde mental de todos (e este seria um grande assunto para pesquisas futuras). Mas todas as nossas comparações foram feitas com grupos de alunos dentro de escolas para isolar o efeito da religiosidade individual. E encontramos que a religiosidade ajuda a amenizar alguns estressores, como uma pior saúde física ou o suicídio de alguém próximo. Além disso, a nossa pesquisa sugere que adolescentes que têm menos estruturas de apoio em casa e na escola tiram mais benefícios da religiosidade.
Curiosamente, vemos benefícios semelhantes da religiosidade independentemente de os adolescentes serem ativos ou não em outras atividades escolares ou esportivas. Isto sugere que estas outras atividades de jovens, onde os adolescentes podem encontrar uma sensação de sentido e pertença social, não parecem, todavia, substituir os benefícios da religiosidade sobre a saúde mental.
Visto que os antidepressivos mostram um sucesso clínico na redução da depressão em apenas aproximadamente um quinto dos casos, a nossa pesquisa sugere também que todos os profissionais que lidam com crianças equivocar-se-iam ao ignorar o efeito benéfico potencial da religiosidade no tratamento. Com o crescente corpo de evidências apoiando uma associação positiva entre religião e saúde mental em muitos casos, as pesquisas sobre religião têm ganhado uma maior aceitação no campo da psiquiatria, hoje, juntamente com uma variedade de outros campos, como a economia. Isto é uma boa notícia, na medida em que resta descobrirmos como a saúde mental e outros elementos importantes se relacionam com a fé e com o espírito interior.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A ciência diz: A fé pode ser eficaz contra a depressão na adolescência - Instituto Humanitas Unisinos - IHU