13 Junho 2019
"Mas dela fica principalmente o diário, notas de uma adolescente que encontrou na escrita uma maneira de escapar de um alojamento lotado demais, onde estava trancada com a família e alguns amigos para escapar da perseguição dos nazistas", escreve o jornalista e escritor italiano Corrado Augias, ex-deputado do Parlamento Europeu, em artigo publicado no jornal La Repubblica, 12-06-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Annelies Marie Frank, carinhosamente conhecida como Anne, morreu de tifo e desnutrição no campo de extermínio de Bergen Belsen no início de 1945 - ela tinha 15 anos de idade. Se ela tivesse conseguido sobreviver, já teria completado 90. Ela nasceu em Frankfurt em uma família judia laica e liberal. Seu pai era acionista e diretor de uma empresa química. Ficaram algumas fotos dela, a mais famosa retrata-a na atitude de uma colegial, sorriso forçado no rosto infantil. Mas dela fica principalmente o diário, notas de uma adolescente que encontrou na escrita uma maneira de escapar de um alojamento lotado demais, onde estava trancada com a família e alguns amigos para escapar da perseguição dos nazistas. Vinte e cinco meses durou a prisão nesses 60 metros quadrados, cuja entrada era dissimulada por uma prateleira giratória. Na manhã de 4 de agosto de 1944, informados por um delator não identificado, uma equipe de SS invadiu o local sob o comando do Sargento Karl Silberbauer. Sobrou, páginas espalhadas no chão, o diário, o mais famoso documento pessoal ligado ao Holocausto, um dos livros mais lidos de todos os tempos, traduzido em sessenta idiomas, famoso e controverso.
Durante os primeiros meses, Anne limitou-se a contar sobre a vida no abrigo com uma vivacidade quase desproporcional em comparação à pobreza da rotina diária. As brigas com a mãe, o apego ao pai Otto, homem generoso e compreensivo, as transformações que aconteciam em seu corpo de adolescente que estava se tornando uma jovem; depois os incertos sentimentos amorosos, os primeiros indícios de sensualidade em relação a um jovem companheiro de prisão, filho de uma família amiga onde os Frank se haviam hospedado.
Em março de 1944, após vinte e um meses de reclusão, Anne escutou na Rádio Londres a voz do ministro holandês da Educação no exílio que exortava os seus compatriotas a registrar o que estavam sofrendo sob os nazistas. Ela decidiu reescrever suas anotações para uma publicação depois da guerra. Como repete várias vezes, queria se tornar uma jornalista, uma escritora. Suas anotações abandonadas no chão, no caos geral de uma busca brutal, foram recuperadas na tarde e guardadas.
Dos oito judeus que a SS havia capturado, somente o pai de Anne conseguiu retornar. Os amigos o informaram que sua esposa e duas filhas (Anne e Margot), bem como os hóspedes que tinham compartilhado o abrigo, tinham sido todos mortos.
Entregaram-lhe as páginas do diário, Otto começou a transcrevê-las e reorganizá-las, pois de algumas partes havia versões diferentes.
Em junho de 1947, uma pequena editora holandesa publicou uma edição limitada de 1.500 exemplares. Muitos editores haviam recusado a publicação, mas em 1952, foi publicada na primeira página do York Times Book Review uma resenha de Meyer Levin, que mudou o rumo das coisas. O caso de Anne Frank estourou.
Três anos depois, apareceu a versão teatral montada por Frances Goodrich e Albert Hackett, que em 1956 também foi encenada na Itália sob a direção de Giorgio De Lullo e Anna Maria Guarnieri no papel de Anne. Mais três anos e, em 1959, foi a vez de um filme que ganhou três Oscars. A partir daquele momento, a história de Anne e de seu diário não pôde mais ser ignorada. A enorme popularidade, contudo, atraiu também muitas polêmicas.
Os neonazistas e alguns historiadores negacionistas começaram a defender a falsidade do texto. O historiador negacionista francês Robert Faurisson declarou: "O diário de Anne Frank é falso. Esta é a conclusão dos meus estudos e da minha pesquisa e este é o título do livro que publicarei”. De acordo com outras fontes de inspiração antijudaica, difundidas principalmente na Internet, "este diário de uma adolescente judia parece um exemplo clássico de literatura totalmente inventada para inculcar verdades difundidas pelos círculos judaicos no imediato período pós-Segunda Guerra Mundial".
A principal razão para as calúnias foi a imperícia com que Otto havia redigido a primeira edição de 1947. Pouco antes de morrer, o pai de Anne confiou os papéis a uma perita forense que garantiu sua autenticidade. Em 1986, foi publicada uma edição crítica dissipando todas as dúvidas. Porém, também houve polêmicas de diferentes tipos. Hannah Arendt já em 1962 havia observado que se concentrar demais em Anne era uma forma de sentimentalismo à custa de uma enorme catástrofe. A tragédia do Holocausto atingiu milhões de pessoas, idosos, mulheres e crianças. No entanto, não se deve esquecer que as vítimas individuais se encontravam em um design monstruoso que pretendia eliminar todo um povo e a sua cultura.
Elie Wiesel, ensaísta e o Prêmio Nobel, da mesma idade de Anne, conseguiu escrever o que para ela não havia sido possível, o horror da chegada no campo: "Nunca vou esquecer aquela noite, a primeira noite no campo. Nunca esquecerei aquela fumaça, os rostinhos das crianças cujos corpos eu vi se transformarem em espirais de fumaça sob um céu silencioso. Nunca esquecerei as chamas que queimaram para sempre a minha Fé... Nunca esquecerei aqueles momentos que mataram o meu Deus e a minha alma, e os meus sonhos, que assumiram a face do deserto. Nunca esquecerei tudo isso, mesmo se fosse condenado a viver tanto quanto o próprio Deus. Nunca."
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Uma menina chamada Anne Frank - Instituto Humanitas Unisinos - IHU