05 Abril 2017
Pelo menos 58 pessoas foram mortas e dezenas ficaram feridas no que teria sido um ataque químico em uma cidade no noroeste da Síria, dominada por rebeldes.
O Observatório Sírio de Direitos Humanos, um grupo de monitoramento do conflito, afirmou que ataques aéreos do governo sírio ou de aviões russos na cidade de Khan Sheikhoun asfixiaram muitas pessoas.
A reportagem é publicada por BBC Brasil, 04-04-2017.
Momentos depois, aviões dispararam foguetes contra clínicas locais que cuidavam dos sobreviventes, segundo médicos e ativistas.
Uma fonte militar síria negou que o governo tenha usado armas químicas. O Ministério de Defesa da Rússia também afirmou não ter realizado nenhum ataque aéreo na região.
Em comunicado, a Casa Branca disse "ter certeza" de que o governo de Bashar al-Assad está por trás do ataque. Reino Unido e França também condenaram a ação e pediram uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU.
Se confirmado, este seria um dos ataques químicos mais mortais na guerra civil síria. Entenda, em seis pontos, o que se sabe até agora:
1. O que aconteceu?
Os aviões teriam atacado Khan Sheikhoun, que fica cerca de 50 km ao sul da cidade de Idlib, no início da manhã desta terça-feira.
Hussein Kayal, um fotógrafo do grupo de jornalistas pró-oposição Edlib Media Center (EMC), disse à agência de notícias Associated Press que ele foi acordado pelo som de uma explosão às 6h30 no horário local.
Quando ele chegou ao local do ataque, disse não ter sentido cheiro de nada, mas viu pessoas no chão, sem conseguirem se mover e com as pupilas contraídas.
Mohammed Rasoul, o chefe de um serviço caritativo de ambulâncias em Idlib, disse à BBC que os médicos que ele transportava encontraram pessoas, muitas delas crianças, sufocando nas ruas.
O grupo Observatório Sírio também citou relatos de médicos dizendo que estavam tratando pessoas com sintomas que incluíam desmaios, vômito e espuma na boca.
Um jornalista da agência de notícias AFP afirmou ter visto uma garota, uma mulher e dois idosos mortos em um hospital, todos com espuma ainda visível ao redor da boca.
O jornalista também afirmou que o hospital foi atingido por um foguete na tarde de terça, e que médicos que cuidavam dos doentes foram atingidos por pedras e destroços.
A procedência dos foguetes não está clara, mas o EMC e os Comitês de Coordenação Local, da oposição ao governo, dizem que aviões alvejaram diversas clínicas.
Jornalistas pró-governo citaram fontes militares dizendo que houve uma explosão em uma fábrica de armas químicas em Khan Sheikhoun - que teria sido causada por um ataque aéreo ou por acidente.
2. Quantas vítimas o ataque deixou?
Por enquanto, os dados são díspares.
O Observatório Sírio de Direitos Humanos afirma que são 58 mortos, incluindo 11 crianças, mas Mohammed Rasoul fala em 67 mortos e 300 feridos. Por sua vez, a agência de notícias Step, pró-oposição, disse que cem haviam morrido.
Uma agência de ajuda humanitária, a Union of Medical Care and Relief Organisations (UOSSM), afirmou que o número de mortos já passa de cem e deve aumentar.
O EMC disse que parou de contar as vítimas porque havia muitas.
O grupo publicou fotos que mostravam o que pareciam ser ao menos sete crianças mortas nos fundos de uma camionete. Não havia ferimentos traumáticos visíveis em seus corpos.
3. Que substância foi usada?
O Observatório Sírio de Direitos Humanos diz que não foi possível determinar que tipo de substância teria sido usada no ataque.
O EMC e os Comitês de Coordenação Local afirmam que pode ter sido o gás sarin, que é altamente tóxico e considerado 20 vezes mais letal do que o cianureto.
O sarin inibe a ação de uma enzima que desativa os sinais que as células nervosas humanas transmitem aos músculos para relaxá-los. Isso faz com que o coração e outros músculos - incluindo os envolvidos na respiração - tenham espasmos.
A exposição ao gás pode causar desmaios, convulsões e levar à morte por asfixia em minutos.
O especialista em armas químicas Dan Kaszeta disse à BBC que é difícil determinar se o sarin foi usado no ataque apenas examinando vídeos, como os compartilhados nas redes sociais por sobreviventes e jornalistas.
Ele afirmou que o ataque pode ter sido resultado de uma série de agentes químicos que "tendem a ter efeitos semelhantes no corpo humano".
O sarin é quase impossível de detectar - é um líquido claro, sem cor e sem gosto que, em sua forma mais pura, também não tem odor.
4. O sarin já foi usado antes na Síria?
O governo sírio foi acusado pelas potências ocidentais de atirar foguetes cheios de sarin em uma série de subúrbios da capital, Damasco, que eram controlados pelos rebeldes em agosto de 2013, matando centenas de pessoas.
O presidente Bashar al-Assad negou as acusações, culpando combatentes rebeldes, mas, em seguida, concordou em destruir o arsenal químico da Síria.
Apesar disso, a Organização pela Proibição de Armas Químicas continua a documentar o uso de químicos tóxicos em ataques na Síria.
Em janeiro de 2016, o órgão disse que amostras de sangue das vítimas de um ataque não especificado no país mostrou que elas foram expostas ao sarin ou substância semelhante.
5. O que se sabe sobre o uso de outros agentes químicos?
Uma investigação conjunta da Organização pela Proibição de Armas Químicas com a ONU concluiu, no último mês de outubro, que as forças do governo usaram gás cloro, que também provoca asfixia, como arma ao menos três vezes entre 2014 e 2015.
Os investigadores também concluíram que militantes do grupo autodenominado Estado Islâmico, que atua no país, usaram gás mostarda - que pode provocar cegueira, ferimentos na pele e morte.
A ONG de direitos humanos Human Rights Watch acusou recentemente helicópteros do governo de soltarem bombas contendo gás cloro em áreas controladas por rebeldes em Aleppo em ao menos oito ocasiões entre os dias 17 de novembro e 13 de dezembro de 2016, durante os estágios finais da batalha pela cidade.
E na semana passada, dois ataques supostamente químicos foram registrados na província de Hama, uma área controlada pelos rebeldes próxima a Khan Sheikhoun.
6. Qual foi a reação ao ataque desta terça?
A província de Idlib, onde os ataques ocorreram, é quase completamente controlada por uma aliança rebelde e pelo grupo jihadista Hayat Tahrir Al-Sham, ligado à al-Qaeda.
A região, onde vivem 900 mil pessoas, é frequentemente alvejada pelo governo e pela Rússia, sua aliada, assim como pela coalizão contra o EI, liderada pelos Estados Unidos.
Não houve comentário oficial imediato após o ataque desta terça-feira, mas uma fonte militar disse à agência de notícias Reuters que o governo "não usa e não usou" armas químicas contra a população.
O enviado dos grupos de oposição sírios na ONU, Staffan de Mistura, disse que o ataque foi "horrível" e que deve haver uma "identificação clara de responsabilidades e prestação de contas" pelo ataque na cidade.
Em um comunicado, o presidente francês François Hollande acusou o governo sírio de cometer um "massacre".
O ministro das Relações Exteriores britânico, Boris Johnson, disse que Assad seria considerado culpado de um crime de guerra caso seu governo seja responsável.
O Reino Unido e a França pediram uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU.
Em comunicado, o presidente americano Donald Trump também responsabilizou o governo Assad e condenou o que chamou de "ações abomináveis" do regime.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
'Ataque químico' mata dezenas na Síria: o que se sabe até agora - Instituto Humanitas Unisinos - IHU