09 Dezembro 2016
Governo tenta garantir tramitação da PEC 287 sem debate; mas trabalhadores já se organizam contra a proposta encaminhada à Câmara na terça (6).
A reportagem é de Glauco Faria e publicada por Outras Palavras, 08-12-2016.
Enquanto muitos ainda buscavam entender as mudanças contidas na proposta de reforma da Previdência enviada nesta terça (6) à Câmara dos Deputados, o deputado ruralista Alceu Moreira (PMDB-RS) já anunciava, no início da tarde desta quarta, que daria o parecer pela admissibilidade da PEC. O anúncio se deu apenas poucas horas depois de ter sido confirmado como relator na matéria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. “Sou The Flash”, justificou de forma jocosa o parlamentar, referindo-se a um super-herói cuja principal característica é a velocidade.
Se Moreira acha o assunto engraçado e digno de galhofas, entidades começavam a esboçar estratégias para enfrentar a volúpia governista em retirar direitos do trabalhador por meio da aprovação da reforma. Adilson Araújo, presidente da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), conta que a Frente Brasil Popular deve realizar uma plenária nesta quinta (8) para traçar uma agenda, o mesmo acontecendo com as centrais sindicais, que devem se reunir até o fim desta semana. O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) também deve realizar um encontro com entidades nos próximos dias.
Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), sinaliza que mobilizações devem ser feitas para tentar barrar a reforma. “Não vamos aceitar isso [reforma da Previdência] de maneira nenhuma, vamos organizar greves, manifestações, pressionar os deputados e senadores dizendo que quem votar nessa proposta é traidor da classe trabalhadora”, garante, em entrevista.
Não é de hoje que entidades e movimentos estão preocupados com a questão da reforma da Previdência. Desde a época em que o governo Dilma começou a ensaiar a proposição de mudanças, organizações como a Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais (Contag) passaram a se dedicar com mais afinco ao tema. A diferença em relação ao atual governo é a absoluta falta de diálogo com a sociedade. O secretário de Políticas Sociais da Contag, José Wilson Gonçalves, lembra que foi criada na gestão da então presidenta um fórum das centrais sindicais no qual sua entidade também estava incluída.
Segundo Gonçalves, foram feitas diversas discussões internas na base da organização e uma das preocupações foi explicar as ameaças ao trabalhador rural que estavam sendo discutidas no governo Temer. Além disso, a interlocução com parlamentares foi reforçada. Agora, o anúncio das medidas vai gerar debates sobre a construção de um novo calendário de ações. “A gente vai estudar internamente uma agenda mais urgente nesse final de ano. Além de usar nosso principal instrumento político, que é a mobilização – no momento certo –, vamos acompanhar e ver se a PEC vai tramitar para além da Comissão Especial ainda em 2016. Se isso acontecer, vamos trazer nossas lideranças para visitar os gabinetes dos deputados e trabalhar para salvar as nossas conquistas”, afirma.
Os próximos dias serão decisivos também para saber se as centrais sindicais conseguirão marchar unidas contra a proposta e que outros atores sociais poderão se juntar à causa, já que as mudanças afetam a grande maioria das pessoas que está hoje no mercado de trabalho. “As centrais devem ter um papel importante, mesmo com divergências. Algumas vão contestar o conjunto, outras podem apoiar as mudanças no que diz respeito aos servidores públicos. A CUT, por exemplo, tem uma base importante de servidores e vai contestar tudo. Outras podem eventualmente aceitar retirada do servidor da integralidade, da paridade, por ser um tratamento diferenciado do setor privado – ainda que sem compreender as razões dessa diferenciação”, explica Antônio Augusto de Queiroz, analista político e diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). “Com certeza será unânime a resistência em relação às regras de transição. É uma reforma muito dura e sem fazer antes o dever de casa, eliminar desonerações, cobrar dívida dos sonegadores, sem incluir militares, políticos e outros setores”, avalia.
Enquanto a discussão sobre uma agenda conjunta segue, algumas categorias já saem às ruas para protestar. É o caso dos policiais civis do Piauí, que fizeram atos na manhã desta quarta-feira nas cidades de Teresina, Picos e Parnaíba. Também pela manhã, um grupo de agentes da Polícia Civil interditou parcialmente uma via de tráfego importante em Vitória (ES). Isso no dia seguinte ao início da tramitação da PEC 287 na Câmara. Tudo indica que o governo não terá vida fácil.
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Assim começa a resistência contra a reforma - Instituto Humanitas Unisinos - IHU