17 Setembro 2016
Alguns gestos do Papa Francisco, como por exemplo o convite ao juiz Daniel Rafecas para um ato que ocorrerá em novembro, no Estado Vaticano – pouco depois de se ter solicitado sua remoção por um amplo espectro de personalidades da intelectualidade, jornalistas, artistas e representantes de diferentes confissões –, estão modificando a alegria que houve quando o papa argentino foi eleito, especialmente no interior da classe média.
A reportagem é de Pedro Siwak, jornalista especializado em temas religiosos, publicada por Religión Digital, 15-09-2016. A tradução é do Cepat.
Isso é bem conhecido pelas autoridades episcopais. No entanto, há um silêncio generalizado que em alguns setores é interpretado como uma falta de reação diante de um fato que não deixa de ser preocupante.
E mais, chama a atenção a falta de comunicação por parte das autoridades episcopais, a tal ponto que os meios de opinião costumam consultar o diretor da prestigiosa revista católica Criterio, José María Poirier, o primeiro leigo que exerce esse cargo, após ter ficado sob a responsabilidade de destacados sacerdotes, em décadas passadas.
A primeira pergunta que surge é se os bispos costumam ser obedientes ao papa ou submissos. Em geral, não é comum que façam questionamentos ao chefe da Igreja. Mas, em razão de seu último documento, que suaviza a extrema rigidez que imperava em conferir a comunhão aos divorciados, treze cardeais gritaram ao céu, ainda que um deles já recuou.
E no México alguns bispos também se manifestaram após o sério questionamento que o Papa Francisco fez aos dignitários eclesiásticos, por conta da rigidez de suas posturas. No entanto, fora destes casos é muito raro que se questione a autoridade papal.
José María Poirier, diretor de uma revista católica muito prestigiosa, que já completou 88 anos, disse sobre Francisco: “É um homem muito inteligente e muito sagaz, e penso que deve contar com elementos que o motivem a ter estes gestos.
“Aqui, acredito que as águas estão muito divididas. Não acredito que lhe escape, nem lhe preocupe. Mas, é o que está ocorrendo. Mesmo que se reconheça que a autoridade moral que conquistou nestes três anos de pontificado no mundo é enorme. Há duas figuras do Papa: a nacional e a internacional e são muito distantes”.
Nos âmbitos hierárquicos eclesiais não há um pensamento crítico, mas, sim, em um setor da opinião pública. Enquanto os fiéis católicos continuam sem entender estes gestos papais, na cúpula eclesial preferem evitar o assunto. Que também alcança aqueles que não militam na Igreja e que receberam o papa argentino com entusiasmo e, agora, começam a manifestar certos questionamentos.
É preciso destacar que este fenômeno se dá especialmente na classe média. Toto de Vedia, padre vileiro, disse: “O furor que a escolha do Papa Francisco provocou foi mais forte na classe média, mas nos setores populares houve uma continuidade. Estavam alegres quando como cardeal vinha às vilas, quando o escolheram e agora continua vigente e não houve esses vaivéns”.
O padre Jorge Oesterheld destaca que “aos bispos e à Igreja em geral lhes custa muito assumir que o papa seja argentino e não sabem como atuar. Em alguns casos, trata-se de submissão, em outros de silêncio e em outros de uma papolatria, que também não é bom. Mas, por trás de tudo isso, há um desconhecimento e não sabem como atuar com um papa argentino, e além do mais com um papa como este”.
Acrescenta Oesterheld, atualmente diretor da revista católica Vida Nueva e que atuou com muita eficácia, durante doze anos, como titular do escritório de imprensa do Episcopado: “E a isso se soma a falta de uma política de comunicação e uma presença nos meios de comunicação, e como o papa ocupa todo o espaço midiático, os bispos se apertam em repetir o que Francisco expressa e desaparecem de cena. E isso não é o que o Papa está pedindo, não deseja que repitam suas frases, mas que assumam as situações que lhes cabem enfrentar. E está convidando a nós, bispos, padres e fiéis, para que tornemos responsáveis pela situação e que deixemos de olhar para Roma”.
Para Oesterheld, “diante desta situação, ao não ter uma opinião oficial da Igreja que se refere a estes temas, os meios de comunicação buscam em outros âmbitos e, então, buscam os leigos, que são aqueles que no momento assumem esse papel, mas sem representar a Igreja oficial. Acredito que aquilo que o Papa está pedindo é que nós, argentinos, façamos o que ele faz, não que repitamos suas frases”.
A situação vivida na Igreja argentina é inédita. Um setor dos fiéis começa a questionar o Papa por sua interferência nos temas nacionais, ao passo que os pastores se mostram desconcertados.
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A encruzilhada dos bispos argentinos: como atuar com um papa compatriota? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU